Publicidade

Convite a quem nos visita

sexta-feira, 1 de abril de 2011

Muita parra e pouca uva

O jornalista Mário Gouveia no programa da RTP-Madeira, Dossier de Imprensa, do dia 31 de Março de 2011, fez eco do que se pensa e diz sem fundamento acerca dos padres. Dizia o seguinte ilustre pensador, são todos ricos e não se sabe o que eles fazem ao dinheiro: «será para comprar batinas…; eles não fazem igrejas…; basta ir às missas para ver o que eles recebem de dinheiro…».
Este pensar é revelador de imensas coisas, vamos listar algumas.
Primeiro, alguma culpa destas «bocas» de mau gosto radica na falta de transparência da Igreja em geral, que entende não prestar contas a quem faz as ofertas, os seus fiéis. Diz que o faz «a quem de direito». Ora tendo em conta que muito poucos são os que sabem desse «a quem de direito», o povo desconfia, pensa sobre o que vê de forma errónea, injusta sobre todos, generaliza e coloca tudo no mesmo saco.
Segundo, a um fazedor de opinião exige-se mais fundamentos, para que as suas opiniões não sejam eco simplório daquilo que é dito na rua.
Terceiro, confunde-se bens que são de todos (Igreja) com bens pessoais.
Quarto, os dinheiros dos ofertórios das missas são na maioria esmolas em trocos, que em tempos de crise financeira, são de valor cada vez mais baixo.
Quinto, são esmolas que quase não chegam para a manutenção dos templos que temos em mãos. Todos sabem que manter e conservar um edifício é muito difícil e se são construções antigas ainda se revestem de maior dificuldade. Por isso, não admiro um padre por ter feito um templo com dinheiros estatais, admiro sim aquele que vem a seguir que terá a responsabilidade de conservar o que foi feito com pompa e circunstância.
Há a ideia generalizada que os padres são todos ricos e que cada igreja é um manancial de riqueza fabulosa. Não desculpo alguma hierarquia e alguns padres em particular, porque deram e dão razões para que se pense desta forma. Muito bem.
Porém, será importante destacar que o trabalho social que a Igreja realiza, muitas vezes sob muitos sacrifícios, levaria a sociedade ao caos se não fosse feito. Não será em vão, com imensas falhas é certo, a atenção que a Igreja denota a famílias carenciadas, a filhos rejeitados, a idosos abandonados, a jovens alienados com o desporto, com as drogas, com a falta de oportunidades… Outro aspecto é o da educação escolar. É imenso o trabalho social que a Igreja realiza em prol da sociedade. Trabalho que o Estado devia assegurar, mas que se demite frequentemente e quando o realiza, é feito com a maior das insensibilidades humanas e espirituais.
Noutro domínio esquece-se o trabalho espiritual e a importância para o equilíbrio das populações. Como seriam os povos sem palavras de esperança em relação ao futuro, de conforto na doença e na morte?; Quem faz os diversos serviços para congregar as pessoas – a catequese e as festas; o serviço do voluntariado em prol dos outros que as comunidades religiosas organizam e etc, etc… O Santo Cura D’Ars dizia: «Deixai uma paróquia vinte anos sem padre: ali se adorarão os animais". Neste sentido a sociedade ainda seria muito mais violenta, mais desequilibrada e quem sabe caótica se este aspecto espiritual e social não fosse realizado pelas Igrejas.
Quanto aos dinheiros. A minha experiência diz que quanto mais transparência melhor. É o que faço frequentemente nas paróquias onde sou pároco. Neste sentido, tomo como exemplo uma das paróquias. As ofertas mensais rondam os mil euros. Desta oferta cerca de metade some-se com gastos comuns (luz, água, telefone e outros) e o restante que sobra vai para pagamento de alguns serviços realizados por pessoas que se dedicam ao cuidado e asseio dos templos. Penso que quem tem a responsabilidade de gerir a sua casa e que se preocupa com tudo o que ela necessita para estar asseada e conservada compreende perfeitamente do que falo.
Perguntamos, como vivem afinal os padres? – Do salário fictício que as Dioceses criaram para que nós pagássemos IRS nalguma base. No meu caso, quando me perguntam digo que vivo de esmolas, o que é perfeitamente verdade. As ofertas das intenções das missas que andam pelos 10 euros, ofertas de alguns sacramentos (casamentos e baptismos) que embora estejam taxados pela Diocese não recorro a essas taxas, fica ao critério de cada pessoa. Cada um dá consoante a sua possibilidade e generosidade, caso não reúna essas condições, não dá nada, mas não fica sem receber o sacramento que pediu.
Mas, há padres que aparentam serem ricos? – É verdade. Alguns terão bens de família e naturalmente que haverá paróquias melhores de que outras neste aspecto do dinheiro. Pena que os bens não sejam canalizados para um fundo comum, de onde todos receberiam de forma mais justa. Mas, não funciona assim, cada um que se desenrasque, daí os desníveis e os sinais desiguais que transparecem, porque também dentro da Igreja a solidariedade entre os seus membros anda pela rua da amargura. Muita pregação para fora, pouca prática no seu interior. Salva-nos o seguinte, os padres no geral são pessoas sóbrias, com vidas regradas e não têm família de sangue para alimentar.
Como se vê muita parra e pouca uva. Porém, salvaguarde-se a importância da Igreja e papel crucial que os padres exercem em prol da fixação das populações e no acompanhamento espiritual das mesmas. Trabalho essencial, cada vez mais reconhecido e valorizado pelas entidades ligadas à saúde física, psicológica e social.
JLR

6 comentários:

Donato Macedo disse...

Belo ponto de ordem...
Há sempre muita gente e pseudo-comentador que tem a verdade ma ponta da língua. Mas isso resvala para a questão de fundo: a transparência diocesana...

José Luís Rodrigues disse...

Tens razão amigo Donato. E era esse ponto que deveria ser debatido por toda a gente. Mas... Medos, penso!

Cambará Cultura disse...

No Brasil dizem que uma boa forma de aparecer é "dependurar uma melancia no pescoço!" Se este senhor quer "falar" verdades poderia, por ex, pesquizar o Sanatório do Trapiche e iria constatar que a República portuguesa expulsou os padres das igrejas, as freiras e os frades dos conventos, fechou o Seminário...mas não expulsou os irmãos de S. João de Deus da casa dos "loucos" porque talvez um dia precisassem deles pois os seculares não teriam paciência de aturá-los!...Meu caro sr Mário, se quiser aparecer diga verdades (fundamentadas) sobre tantos problemas gritantes de nossa sociedade inclusive de novas igrejas que "sugam" o dízimo suado de seus "fiéis!"

M Teresa Góis disse...

Concordo com o Donato: belo ponto de ordem.
Todos sabemos que há Sacerdotes que são honestos no uso do que lhes é entregue e cumprem com as suas obrigações paroquiais/diocesanas. Mas também temos "aqueles" cujos sinais exteriores de riqueza nos levam a pensar e até murmurar.É impossível não o fazer....
Creio que o seu ponto de vista está correcto e, estando a consciência tranquila e os fiéis satisfeitos, nada mais há a acrescentar.

Espaço do João disse...

Por aqui se vê a razão dde muita comunicação social.
Se não têm nada para dizer, publicam asneirada da grossa.
Quantas das vezes me pergunto o que seria do papel se não fossem os jornalistas de meia tigela ou das "revistas cor de rosa"? Confundem a liberdade com a libertinagem. A maioria são uma cambada de cretinos que inclusivamente nem escribas são.
No entanto não deixo de frizar que a igreja, nem sempre é transparente, veja-se as fortunas do Santuário de Fátima, mas, não devemos tomar o Sol por Juno.
Um abraço. João

José Luís Rodrigues disse...

Amigo João, obrigado pelo contributo. Apenas uma salvaguarda. O Santuário de Fátima, surpreendentemente, é das únicas realidades ligadas à Igreja que publica contas. É um exemplo para as Dioceses, que vivem quanto a esse aspecto no maior dos segredos, só alguns pretensos iluminados é que sabem. Esses fizeram das Dioceses os seus feudos. Isso é anti-evangélico e contra producente a meu ver. Abraço