Publicidade

Convite a quem nos visita

segunda-feira, 9 de julho de 2012

Paixão, afetividade e amizade


Diferentemente dos grandes homens da Idade Média, hoje, nós, pessoas das coisas de Deus, já não sabemos compreender e abordar as paixões, esquecemos a «gaia ciência».
Os monges poetas possuíam uma verdadeira teologia da paixão amorosa, ao passo que nós nos contentamos com uma ética dos afetos, com uma série de prescrições. É urgente que a Igreja torne, de novo, a tratar os temas vitais do homem, como a grande dádiva do eros, uma espiritualidade que fale ao coração, o lugar do corpo, o além, a relação com a natureza e com o cosmo, elaborando deles uma teologia, reconhecendo-os como lugar teológico, e não reduzindo-os apenas a uma moral.
A vida não é estática, mas extática, rumo a algo que está para além de si. O ser é êxtase, é devir, movimento, difusão de si, atração. A vida avança por paixões, não por injunções. E a paixão nasce de uma beleza.
Adquirir fé é adquirir beleza do viver: é belo amar, desposar-se, gerar, fruir a luz e os amplexos, saborear o humilde prazer de existir; é belo ser de Deus e, conjuntamente, do mundo; é belo esperar e estar com o amigo, porque tudo se encaminha para um sentido luminoso e positivo, na finitude e no infinito.
A vida não é ética, mas estética. No seu sentido literal, estético significa sensível; o seu contrário não é o feio, mas - à letra - o anestético, o insensível, o imóvel.
Todo o vivente tem uma vida afetiva, parte alta e forte da sua identidade, necessária para ser feliz. Podemos negá-la, mas não eliminá-la. A dimensão dos afetos, fundamental para o equilíbrio da pessoa, necessária para viver (se não amamos, não vivemos; cf. IJo 3,14), e para viver com alegria, é um autêntico lugar teológico: a amizade revela algo de Deus.
Todo o vivente nasce como pessoa apaixonada, e o mal interpretado espírito religioso que nos leva a negar as nossas paixões seca as fontes da vida e faz de muitos cristãos pregadores de coisas mortas.
O importante não é sufocar, mas converter as paixões; não resfriar, mas libertar os desejos para desejar Deus. Só quem ama a vida é sensível ao apelo de Evangelho: «Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância» (Jo 10,10).
«- Amas a vida? 
- Sim, amo a vida. 
- Então já fizeste metade do caminho.» (Dostoievski, Os irmãos Karamazov).
A santidade não consiste numa paixão esgotada, mas numa paixão convertida.
Deus não está presente onde o coração está ausente.
E não nos interessa um divino que não faça florir o humano.
Ermes Ronchi, in Os beijos não dados, ed. Paulinas

1 comentário:

P. P. disse...

Concordo plenamente.
Abraço