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terça-feira, 31 de dezembro de 2013

Votos para 2014 paz e felicidade sempre

Um Feliz 2014... Que o engenho e a arte nos acompanhem. 

Funchal a cidade da poncha em tempos de festa

 A cidade do Funchal está cheia. Não falta animação para todos os gostos. Não faltam barracas por todo lado, todas requintadamente a vender uma variedade enorme de coisas, poncha e mais poncha de todos os sabores. Lá nisto foram criativos. Poncha, poncha, e mais poncha para baixo e para cima. A Praça do mar tem uma suposta feira das Casas do Povo com um monte de barracas para vender produtos tradicionais da Madeira. Todas as barracas vendem poncha. Outra criatividade impressionante. Pareceu-me ver apenas uma barraca a vender souvenirs da Madeira, nada de anormal.
Acho que estou enganado sobre a utilidade desta feira. Será que serve para embriagar os poncheiros «Patas rapadas» para os fazer militantes do partido mais democrata do mundo? – O tempo dirá sobre a consistência desta iniciativa e sobre a nossa suspeita.  
Mas podemos continuar a caminhada e encontramos mais ingredientes pela cidade. A Avenida Arriaga também tem barracas. Todas com enorme criatividade. Vendem poncha. Uma ou outra vende flores importadas.
Mas o melhor estava para vir sobre este banho de criatividade que delicia turistas e o pessoal aqui do burgo madeirense.
O Jardim Municipal tem apresentado nestes dias da festa, uma animação muito interessante a condizer com a época e com os tempos da crise. Ontem, por exemplo, assisti à animação do despique e ao espetáculo da «Aldora e Silvestre». Todos se fartam de gozar com a crise e com o famoso buraco da Madeira. Tomara que os buracos fossem só de caruncho, mas pela cantiga parece que a Madeira está esburacada por caruncho graúdo… Fico deveras impressionado como se consegue juntar ali a maior plêiade de «povo superior» e uma fatia considerável de «patas rapadas» a manifestar a sua criatividade de forma destemida a gozar com os governantes previdenciais que fizeram a «Madeira Nova» e responsáveis pelo caruncho da Madeira Nova. Ninguém sai dali sem que lhe cheguem a roupa ao pêlo. Muita orelha desta terra deve ferver nestas noites da festa e não é só por causa da poncha. Toma que a Madeira quando lhe chega a mostarda ao nariz levas de cima pra baixo.
A Aldora enfiou uma série de piadas sobre o buraco da Madeira que impressiona as árvores e até os turistas se riem com a bravura da mulher. Nem sei o que pensar destes «patas rapadas» que descem à cidade para gozarem com isto tudo e manifestarem a sua bravura ingrata diante do nariz de quem tudo deu a favor da Madeira Nova. São os mesmos que antes andavam de pata rapada e descalça sobre a terra batida e calçada fria, os que lavavam o rabiosque nas poças da ribeira uma vez à semana, os que não sabiam o que eram uma casa de banho e aliviavam-se nas retretes no meio dos poios ou debaixo das paredes por essas encostas da Madeira velha. A memória é curta neste povo ingrato.
Agora, depois de terem estradas alcatroadas, água canalizada e energia elétrica e todos os bens providenciais da Madeira Nova, saem da casca e sob a capa da música manifestam a ingratidão desenfreada contra os buracos, as obras escaqueiradas pelos temporais que tanto serviram a meia dúzia de privilegiados do regime chamado Madeira Nova, os empreiteiros falidos, desgarradas e despiques sobre a crise, os desempregados, a gente manhosa e um Fum fum fum de cantaroladas que fazem tremer as pedras.
Uma ingratidão impressionante. Não fora estes ingratos terem descido à cidade, os nossos passeios pelas artérias do Funchal ficavam mais tristes e só sabiam a poncha e a encontros de gente perdida de bêbeda. Se os turistas se reduzem a esta Sodoma poncheira dos tempos modernos não sei o que levam da Madeira. Só espero que comprem uns Cd’s da «Aldora e Silvestre», pelo menos levam além-fronteiras umas piadas foleiras sobre a crise. Que as enfiem isso sim bem fundo nas orelhas dos safados dos troiquistas que andam a tramar o nosso povo, mais os nossos «queridos» providenciais desgovernantes. Um bom ano para todos e sejam felizes.

segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Dia Mundial da Paz 1 Janeiro de 2014

Mensagem do papa Francisco para o Dia Mundial da Paz (1/01/14)
Estamos às portas do Dia Mundial da Paz, 1 de Janeiro de 2014. O Papa Francisco escolheu como tema «A Fraternidade» para a mensagem que escreveu para este dia. Um texto extraordinário que devia ser lido por todas as autoridades deste mundo, especialmente, os governantes que têm o dever de promoverem a fraternidade entre as populações que estão à sua responsabilidade. Alguns acharão que é um tema útil e pertinente. Outros que é um tema retrógrado ou despropositado. Outros ainda acharão que é um bom tema para ser pregado, falado mas sem consistência prática nenhuma. E quem sabe se alguns acharão também que o tema está fora de contexto e não ajuda nada falar-se agora sobre um tema que não serve em nada perante a austeridade e diante do descalabro da desigualdade em que está o nosso mundo mergulhado. Haverá de tudo a considerar ou a desconsiderar o tema.
A nós cabe-nos salientar a importância do tema. O que ele tem de importante e quanto é pertinente para este tempo onde as pessoas se violentam umas às outras. Mais ainda se considerarmos como está globalizada a indiferença em relação aos conflitos regionais, à emigração em massa de povos vindos de África e as populações jovens das nações até há pouco tempo consideradas ricas, mas que foram sugadas até ao tutano pela sacrossanta austeridade. E outro elemento considerado prejudicial para a paz prende-se com a fome que ainda existe no mundo. Neste âmbito considera o Papa Francisco: «a persistente vergonha da fome no mundo», mais fica dito sobre este assunto, porque é a pior vergonha da humanidade, que ao invés de ser fraterna, afinal, a maioria das vezes se manifesta claramente fratricida. Diz assim o Papa: «De facto, é um dever impelente que se utilizem de tal modo os recursos da terra, que todos se vejam livres da fome. As iniciativas e as soluções possíveis são muitas, e não se limitam ao aumento da produção. É mais que sabido que a produção atual é suficiente, e todavia há milhões de pessoas que sofrem e morrem de fome, o que constitui um verdadeiro escândalo» (nº9). Oiçam, por favor, senhores do tempo...
Assim sendo, a melhor via da paz é a fraternidade. Em boa hora o Papa Francisco ressuscita este tema e apresenta uma magnífica mensagem para o Dia Mundial da Paz. Mensagem para o 47.º Dia Mundial da Paz: «Fraternidade, fundamento e caminho para a paz». A partir do texto, que pode ser lido integralmente aqui (http://www.vatican.va/holy_father/francesco/messages/peace/documents/papa-francesco_20131208_messaggio-xlvii-giornata-mondiale-pace-2014_po.html), escolhemos 26 palavras a que atribuímos excertos do documento. Eis qual é a afinal o vocabulário para pensar a fraternidade e a paz...

Ambição
«As justas ambições duma pessoa, sobretudo se jovem, não devem ser frustradas nem lesadas; não se lhe deve roubar a esperança de podê-las realizar. A ambição, porém, não deve ser confundida com prevaricação; pelo contrário, é necessário competir na mútua estima (cf. Rm 12, 10).» (8)
Amor
«“Dou-vos um novo mandamento: que vos ameis uns aos outros; que vos ameis uns aos outros assim como Eu vos amei. Por isto é que todos conhecerão que sois meus discípulos: se vos amardes uns aos outros” (Jo 13, 34-35). Esta é a boa nova que requer, de cada um, um passo mais, um exercício perene de empatia, de escuta do sofrimento e da esperança do outro, mesmo do que está mais distante de mim, encaminhando-se pela estrada exigente daquele amor que sabe doar-se e gastar-se gratuitamente pelo bem de cada irmão e irmã.» (10)
Armas
«Enquanto houver em circulação uma quantidade tão grande como a atual de armamentos, poder-se-á sempre encontrar novos pretextos para iniciar as hostilidades. Por isso, faço meu o apelo lançado pelos meus Predecessores a favor da não-proliferação das armas e do desarmamento por parte de todos, a começar pelo desarmamento nuclear e químico.» (7)
Crime
«[As] muitas formas de corrupção» e as «organizações [criminosas] ofendem gravemente a Deus, prejudicam os irmãos e lesam a criação, revestindo-se duma gravidade ainda maior se têm conotações religiosas.
Penso no drama dilacerante da droga com a qual se lucra desafiando leis morais e civis, na devastação dos recursos naturais e na poluição em curso, na tragédia da exploração do trabalho (…); penso na prostituição que diariamente ceifa vítimas inocentes, sobretudo entre os mais jovens, roubando-lhes o futuro; penso na abominação do tráfico de seres humanos, nos crimes e abusos contra menores, na escravidão que ainda espalha o seu horror em muitas partes do mundo, na tragédia frequentemente ignorada dos emigrantes sobre quem se especula indignamente na ilegalidade.» (8)
Cristo
«Em Cristo, o outro é acolhido e amado como filho ou filha de Deus, como irmão ou irmã, e não como um estranho, menos ainda como um antagonista ou até um inimigo. Na família de Deus, onde todos são filhos dum mesmo Pai e, porque enxertados em Cristo, filhos no Filho, não há «vidas descartáveis». Todos gozam de igual e inviolável dignidade; todos são amados por Deus, todos foram resgatados pelo sangue de Cristo, que morreu na cruz e ressuscitou por cada um. Esta é a razão pela qual não se pode ficar indiferente perante a sorte dos irmãos.» (3)
Cruz
«A cruz é o «lugar» definitivo de fundação da fraternidade que os homens, por si sós, não são capazes de gerar. Jesus Cristo, que assumiu a natureza humana para a redimir, amando o Pai até à morte e morte de cruz (cf. Fl 2, 8), por meio da sua ressurreição constitui-nos como humanidade nova, em plena comunhão com a vontade de Deus, com o seu projeto, que inclui a realização plena da vocação à fraternidade.» (3)
Desigualdade
«Se por um lado se verifica uma redução da pobreza absoluta, por outro não podemos deixar de reconhecer um grave aumento da pobreza relativa, isto é, de desigualdades entre pessoas e grupos que convivem numa região específica ou num determinado contexto histórico-cultural. Neste sentido, servem políticas eficazes que promovam o princípio da fraternidade, garantindo às pessoas – iguais na sua dignidade e nos seus direitos fundamentais – acesso aos «capitais», aos serviços, aos recursos educativos, sanitários e tecnológicos, para que cada uma delas tenha oportunidade de exprimir e realizar o seu projeto de vida e possa desenvolver-se plenamente como pessoa. Reconhece-se haver necessidade também de políticas que sirvam para atenuar a excessiva desigualdade de rendimento.» (5)
«É necessário encontrar o modo para que todos possam beneficiar dos frutos da terra, não só para evitar que se alargue o fosso entre aqueles que têm mais e os que devem contentar-se com as migalhas, mas também e sobretudo por uma exigência de justiça e equidade e de respeito por cada ser humano.» (9)
Deus
«O necessário realismo da política e da economia não pode reduzir-se a um tecnicismo sem ideal, que ignora a dimensão transcendente do homem. Quando falta esta abertura a Deus, toda a atividade humana se torna mais pobre, e as pessoas são reduzidas a objeto passível de exploração. Somente se a política e a economia aceitarem mover-se no amplo espaço assegurado por esta abertura Àquele que ama todo o homem e mulher, é que conseguirão estruturar-se com base num verdadeiro espírito de caridade fraterna e poderão ser instrumento eficaz de desenvolvimento humano integral e de paz.» (10)
Economia
«As sucessivas crises económicas devem levar a repensar adequadamente os modelos de desenvolvimento económico e a mudar os estilos de vida. A crise atual, com pesadas consequências na vida das pessoas, pode ser também uma ocasião propícia para recuperar as virtudes da prudência, temperança, justiça e fortaleza. Elas podem ajudar-nos a superar os momentos difíceis e a redescobrir os laços fraternos que nos unem uns aos outros, com a confiança profunda de que o homem tem necessidade e é capaz de algo mais do que a maximização do próprio lucro individual.» (6)
Especulação
«Penso nos tráficos ilícitos de dinheiro como também na especulação financeira que, muitas vezes, assume carateres predadores e nocivos para inteiros sistemas económicos e sociais, lançando na pobreza milhões de homens e mulheres.» (8)
Ética
«As próprias éticas contemporâneas mostram-se incapazes de produzir autênticos vínculos de fraternidade, porque uma fraternidade privada da referência a um Pai comum como seu fundamento último não consegue subsistir. Uma verdadeira fraternidade entre os homens supõe e exige uma paternidade transcendente. (1)
Família
«Convém desde já lembrar que a fraternidade se começa a aprender habitualmente no seio da família, graças sobretudo às funções responsáveis e complementares de todos os seus membros, mormente do pai e da mãe. A família é a fonte de toda a fraternidade, sendo por isso mesmo também o fundamento e o caminho primário para a paz, já que, por vocação, deveria contagiar o mundo com o seu amor.» (1)
Fome
«A persistente vergonha da fome no mundo leva-me a partilhar convosco esta pergunta: De que modo usamos os recursos da terra? As sociedades atuais devem refletir sobre a hierarquia das prioridades no destino da produção. De facto, é um dever impelente que se utilizem de tal modo os recursos da terra, que todos se vejam livres da fome.» (9)
Igreja
«A Igreja faz muito em todas estas áreas, a maior parte das vezes sem rumor. Exorto e encorajo a fazer ainda mais, na esperança de que tais ações desencadeadas por tantos homens e mulheres corajosos possam cada vez mais ser sustentadas, leal e honestamente, também pelos poderes civis.» (8)
Indiferença
«Nos dinamismos da história – independentemente da diversidade das etnias, das sociedades e das culturas –, vemos semeada a vocação a formar uma comunidade feita de irmãos que se acolhem mutuamente e cuidam uns dos outros. Contudo, ainda hoje, esta vocação é muitas vezes contrastada e negada nos factos, num mundo caracterizado pela «globalização da indiferença» que lentamente nos faz «habituar» ao sofrimento alheio, fechando-nos em nós mesmos.» (1)
Irmãos
«No coração de cada homem e mulher, habita o anseio duma vida plena que contém uma aspiração irreprimível de fraternidade, impelindo à comunhão com os outros, em quem não encontramos inimigos ou concorrentes, mas irmãos que devemos acolher e abraçar. (…) A consciência viva desta dimensão relacional leva-nos a ver e tratar cada pessoa como uma verdadeira irmã e um verdadeiro irmão; sem tal consciência, torna-se impossível a construção duma sociedade justa, duma paz firme e duradoura.» (1)
Guerra
«Às guerras feitas de confrontos armados juntam-se guerras menos visíveis, mas não menos cruéis, que se combatem nos campos económico e financeiro com meios igualmente demolidores de vidas, de famílias, de empresas.» (1)
Natureza
«A natureza está à nossa disposição, mas somos chamados a administrá-la responsavelmente. Em vez disso, muitas vezes deixamo-nos guiar pela ganância, pela soberba de dominar, possuir, manipular, desfrutar; não guardamos a natureza, não a respeitamos, nem a consideramos como um dom gratuito de que devemos cuidar e colocar ao serviço dos irmãos, incluindo as gerações futuras.» (9)
Paternidade
«A raiz da fraternidade está contida na paternidade de Deus. Não se trata de uma paternidade genérica, indistinta e historicamente ineficaz, mas do amor pessoal, solícito e extraordinariamente concreto de Deus por cada um dos homens (cf. Mt 6, 25-30). Trata-se, por conseguinte, de uma paternidade eficazmente geradora de fraternidade, porque o amor de Deus, quando é acolhido, torna-se no mais admirável agente de transformação da vida e das relações com o outro, abrindo os seres humanos à solidariedade e à partilha ativa.» (3)
Política
«Os cidadãos devem sentir-se representados pelos poderes públicos, no respeito da sua liberdade. Em vez disso, muitas vezes, entre cidadão e instituições, interpõem-se interesses partidários que deformam essa relação, favorecendo a criação dum clima perene de conflito.» (8)
Prisões
«Penso também nas condições desumanas de muitos estabelecimentos prisionais, onde frequentemente o preso acaba reduzido a um estado sub-humano, violado na sua dignidade de homem e sufocado também em toda a vontade e expressão de resgate.» (8)
Reconciliação
«Desejo dirigir um forte apelo a quantos semeiam violência e morte, com as armas: naquele que hoje considerais apenas um inimigo a abater, redescobri o vosso irmão e detende a vossa mão! Renunciai à via das armas e ide ao encontro do outro com o diálogo, o perdão e a reconciliação para reconstruir a justiça, a confiança e esperança ao vosso redor!» (7)
Relação
«Em muitas sociedades, sentimos uma profunda pobreza relacional, devido à carência de sólidas relações familiares e comunitárias; assistimos, preocupados, ao crescimento de diferentes tipos de carências, marginalização, solidão e de várias formas de dependência patológica. Uma tal pobreza só pode ser superada através da redescoberta e valorização de relações fraternas no seio das famílias e das comunidades, através da partilha das alegrias e tristezas, das dificuldades e sucessos presentes na vida das pessoas.» (5)
Serviço
«Cada atividade deve ser caracterizada por uma atitude de serviço às pessoas, incluindo as mais distantes e desconhecidas. O serviço é a alma da fraternidade que edifica a paz.» (10)
Sobriedade
«Há uma forma de promover a fraternidade – e, assim, vencer a pobreza – que deve estar na base de todas as outras. É o desapego vivido por quem escolhe estilos de vida sóbrios e essenciais, por quem, partilhando as suas riquezas, consegue assim experimentar a comunhão fraterna com os outros. Isto é fundamental, para seguir Jesus Cristo e ser verdadeiramente cristão.» (5)
Solidariedade
«As inúmeras situações de desigualdade, pobreza e injustiça indicam não só uma profunda carência de fraternidade, mas também a ausência duma cultura de solidariedade.» (1)

sábado, 28 de dezembro de 2013

O incerto

Para o fim de semana sobre a «Sagrada Família». A de cada um de nós onde não faltou o pão nosso de cada dia do amor...
Nas serras que ladeiam a casa soberba da luz
No meu nascimento de cada dia podia contemplar
O verde até aos céus da montanha do Pico da Cruz.

Mas o mais sublime vinha do ribeiro
Onde sobrevoavam de um lado a outro os pássaros
Com nobre sinfonia chilreavam a solidão dos dias
Mas também prometiam o futuro que viria
Na música e nos voos da luz imensa
Da minha história que não queria apenas
Senão que fosse maior do que a paisagem
E ainda mais refinada do que aquele momento
Que vivo neste pensamento suave da lembrança.

Nesse tempo de gente sensível e pequena ainda
Sempre me diziam na oração o quanto seremos felizes
Se dentro de uma casa mesmo que pobre
couber todo o movimento do mundo.

                                                              José Luís Rodrigues

sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

A família em cada um de nós

Mesa da Palavra
Comentário para a Missa deste domingo
Domingo da Sagrada Família de Jesus, Maria e José, 29 Dezembro de 2013

Neste domingo da Sagrada Família de Nazaré somos convidados a pensar um pouco sobre a família de hoje, os seus contornos e desafios diante da vida actual.
A família continua a ser uma forma de crescimento humano e de educação fundamental para a pessoa humana. Todos reconhecemos que a família actual está a atravessar uma crise muito grave. É certo que assim seja, porque os problemas que advêm daí estão à vista de todos. Porém, requer-se uma acentuada intervenção na educação para que a família retome o seu lugar na sociedade.
Mais reconhecemos que a família em crise arrasta consigo toda a sociedade. Cada vez mais, reconhecemos que se todos os pais e todas mães fossem verdadeiramente responsáveis pelos seus filhos a nossa sociedade estaria melhor e os problemas não seriam tão graves no que diz respeito à convivência social.
A todos é pedido que se empenhem na educação para que a família continue a ser a principal escola de crescimento e de educação de todos os homens e mulheres, dentro dos parâmetros que a antropologia a definiu. Caso não exista esta consciência entraremos no caos e na perversão geral que tanto nos comove ou escandaliza.
Todos os problemas actuais de violência e de perversão sexual têm uma origem comum, a família ou a ausência dela. Na maioria dos casos a origem radica no mau ambiente familiar, isto é, são filhos de pais alcoólicos ou de mães irresponsáveis que pura e simplesmente abandonaram os seus filhos.
Reparem, ambientes familiares onde predomina a demissão frequente dos pais, a palavra ensurdecedora e a pancada como único método de resolução de problemas e como única forma de impor autoridade, só pode gerar gente insensível, violenta e perversa sexualmente.
Por isso, inspirados na Sagrada Família de Nazaré, concebemos que a família continua a ter um papel fundamental na vida de todos os seres humanos. Quando se fala em família, pode para alguns soar a um certo tradicionalismo ou até a um conservadorismo do conceito de família do passado, mas longe estamos de querer defender o autoritarismo de outros tempos, a falta de diálogo, a pancada dolorosa e os gritos ensurdecedores de pais que se achavam donos dos filhos como se eles fossem a força de trabalho e a garantia de um rendimento familiar mais gordo. Nada disso. Trata-se de defender a família como lugar da felicidade e berço onde crescem pessoas íntegras para vida, para o mundo, para a sociedade.
Quando fazemos uma valorização da família, queremos lembrar que aí se aprende, o que é pudor, respeito, o sentido das fronteiras entre o bem e o mal, o respeito pela vida dentro de determinados padrões e a sexualidade como um bem essencial para a partilha da vida e para o prazer. É aqui que queremos chegar. Se perante isto entrarmos pelos habituais preconceitos e pelas acusações reincidentes de epítetos de conservadorismo, todos perdemos e não chegaremos a um verdadeiro entendimento sobre o caminho a seguir quanto ao que é e o que pode ser a família em cada um de nós. 

terça-feira, 24 de dezembro de 2013

A paz sem vencedor e sem vencidos

Poema da grande Sophia de Mello Breyner Andresen que me trouxe uma mensagem de Natal de um amigo... Gostei muito, embora já o conhecesse. BOM NATAL PARA TODOS...
A paz sem vencedor e sem vencidos
Dai-nos, Senhor, a paz que vos pedimos
A paz sem vencedor e sem vencidos
Que o tempo que nos deste seja um novo
Recomeço de esperança e de justiça.
Dai-nos Senhor a paz que vos pedimos

A paz sem vencedor e sem vencidos

Erguei o nosso ser à transparência
Para podermos ler melhor a vida
Para entendermos vosso mandamento
Para que venha a nós o vosso reino
Dai-nos

A paz sem vencedor e sem vencidos

Fazei Senhor que a paz seja de todos
Dai-nos a paz que nasce da verdade
Dai-nos a paz que nasce da justiça
Dai-nos a paz chamada liberdade
Dai-nos Senhor a paz que vos pedimos

A paz sem vencedor e sem vencidos


Sophia de Mello Breyner Andresen

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

A festa tem aromas de alegria

Feliz Natal para todos...

Aquele dia apareceu cheio de frio. O que não impediu de forma nenhuma o salto da cama quando o sino tocou as badaladas meia hora antes da «missa do parto». Pelos caminhos acorriam várias pessoas empunhando castanholas, sininhos e os badalados das casas arrancados para esta ocasião. Outros retiraram dos caixotes as pandeiretas, os bilros, os bumbos e todos os instrumentos que pudessem animar ao máximo esta caminhada em direção à igreja. Todos se juntam nas encruzilhadas dos caminhos com as gargantas bem afinadas. Um gole de aguardente com mel a um e a outro para limpar o catarro da noite e afinar o timbre das cordas vocais. Um bailarico pegado, coisa que sem ele não lembra a festa, todos dizem com afincada convicção.
Após a missa, a manhã irrompe sobre o horizonte e trás à pele o arrepio ainda mais carregado, o frio parece ser maior. Nada que não impeça a festa e o convite a várias macias seguidas para vencer este encalhamento da natureza. Ninguém se faz rogado e rega o interior com doce e álcool.
O mais admirável é que os cheiros irrompem de todos os cantos para fazer sentir que na vida há riquezas maiores que todo o dinheiro do mundo. Por isso, reparem bem, as searinhas lá estão sobre a lapinha com aquela característica lágrima na pontinha de cada haste. Será que choram por nós? – Não, refrescam-se e choram de alegria pelo tempo novo que nos oferecem.
 Os peros vermelhos, os calhaus e os domingos brotam pujantes, com um brilho e um aroma finos que alegram as almas dos donos da casa e os visitantes. Esta lembrança comove as pedras e o tempo, o nosso tempo como se de uma verdadeira fortuna se tratasse. O Menino Deus de dedinho em punho ao centro da lapinha, sorri para nós salientando aquelas giras bochechinhas a para dizer-nos que somos chamados à alegria, à esperança e como que nos diz ainda, olha para o alto, para o céu, deixa o egoísmo, o individualismo cego e pensa que não és daqui, mas do alto, o lugar de Deus. Esta terna lembrança verte o sentido todo do contexto e do ambiente que dizemos ser Natal.
Não esqueço os bolos e o pão que as mãos das mulheres prepararam com sentido gozo sobre as manhãs para alegrar e adoçar o coração dos pequenos e graúdos. A festa tem cheiro. A festa tem vida nova. A festa faz renascer a natureza. A festa faz renascer as pessoas. A festa faz renascer a natureza. A festa faz retemperar a esperança. A festa faz sentir presente a ternura. A festa faz equilibrar os sentimentos. A festa faz tanta coisa que sem ela seriamos os mais pobres dos pobres. Que nos abençoe tão sentida presença, que nada nos perturbe para que já aqui e agora sejamos felizes. 

sábado, 21 de dezembro de 2013

Nascer e renascer

Oferta de Natal para todos os leitores deste blogue... Boas festas!
Maria - Salvador Dali
No crepúsculo canta o grilo
Embora seco vai parecendo hermético
Porque advinha a noite.

Vai mostrando o fim desta viagem
Onde tinha metido as mãos até ao fundo
Das coisas velhas e novas no saco da memória.

Então reclino um sono tranquilo no ombro
Da sabedoria dos magistrais antepassados
Que na fecunda harmonia dizem família.

Neste feliz repouso sentimos todos
A luz em outro dia na fertilidade da esperança
Que na manhã ressuscita no ciclo do despertar.

Eis então mais um assombro de ser gente
Que o sangue da mãe se multiplica noutro ser
Mesmo que seja amargo o sal das suas lágrimas.

Mais uma vez nasci para todos na simplicidade
Daquele colo terno e requintado pelo amor
Porque da água como húmus se criou o mundo e o fruto.

Pois agora sei deste segredo antigo da nossa fé
Ah faz-me a tranquilidade deste crepúsculo

Que se renovado me abençoa o sol que virá.
José Luís Rodrigues

É possível nascer de novo neste Natal

Comentário à Missa deste domingo IV Advento, 22 de Dezembro 2013
Apetece-me começar assim, Deus não clama por caridade, mas por justiça.
Nunca se viveu um tempo como o nosso onde se fale tanto em solidariedade, caridade, partilha, dádiva… Entre tantas outras palavras que apelam a uma prática que leva cada um a pensar nos outros, especialmente, os mais necessitados.
É urgente dar lugar à esperança nesta hora de sofrimentos vários, de dores desmedidas e de desesperos angustiantes. Não há tempo a perder-se, cada um trás em si o lugar de Deus. O lugar do Seu nascimento.
Mas que lugar tão pobre, dirão os mais exigentes! Sim, pobres todos os corações humanos, mas lugares eleitos para o nascimento de Deus, o Senhor da esperança e da salvação para todos. O Deus da vida partilhada não se deixa intimidar com a pobreza de cada um. É dos pobres que Deus gosta. É dos lugares pobres que se faz a eleição para Ele nascer, não como caridade, mas por elementar desejo que se faça justiça.
Este tempo, é especial. Este tempo do espectro da crise que a todos inquieta face ao futuro. Este tempo dos cortes salariais e do desemprego que condena várias famílias à fome e especialmente crianças a não saborearem algo especial no Natal e quem sabe pior do que isso, ter que irem para a escola sem se alimentarem convenientemente ou a estarem sujeitas à marginalização perante os coleguinhas, porque não têm vestidas as roupas que os mais novos estandardizaram para o momento. Não receberam brinquedos, coisa que os coloca fora do convívio normal com os amigos e colegas. O tempo onde nos surpreendemos ou não com mais pobreza e caímos na real de quanto é vulnerável a condição humana e tudo o que essa condição humana criou como definitivo e acabado. Tudo surpreendente para nós que nos habituamos à Internet, às viagens frequentes de avião, ao bem-estar social e económico... Tudo parecia assegurado e garantido, mas, afinal, facilmente desmoronaram sobre as nossas cabeças as torres de Babel, que, teimosamente erguemos até ao mais alto dos céus.
«...Ele nascer de novo...» - pensaremos - dê por onde der, Ele vai nascer de novo! Basta de solidão, basta de ódios, basta de sofrimentos em tantas almas que nunca souberam o que é a paz, a felicidade da existência e o gosto de viver com o necessário para ser verdadeira humanidade.
Este Deus que quer nascer de novo e que nos desafia a nascermos também em nome do amor infinito pelos homens e pelas mulheres, faz-se criança, símbolo da esperança e da confiança de que da miséria é sempre possível comunicar o sentido e a feliz notícia da Boa Nova do Reino. Bom Natal para todos.

quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

Entrevista ao Papa Francisco ao Jornal La Stampa


"O Natal para mim é esperança e ternura...". Francisco relata ao La Stampa o seu primeiro Natal como bispo de Roma.

Casa Santa Marta, terça-feira, 10 de dezembro, 12h50min.
O papa nos acolhe em uma sala ao lado do refeitório. O encontro duraria uma hora e meia. Por duas vezes, durante a conversa, desaparece do rosto de Francisco a serenidade que todo o mundo aprendeu a conhecer, quando ele se refere ao sofrimento inocente das crianças e fala da tragédia da fome no mundo.
Na entrevista, o papa também fala das relações com as outras confissões cristãs e do "ecumenismo de sangue" que as une na perseguição. Ele se refere às questões do casamento e da família que serão abordadas pelo próximo Sínodo, responde aos que o criticaram nos EUA definindo-o como "um marxista" e fala da relação entre Igreja e política.

A reportagem é de Andrea Tornielli, publicada no jornal La Stampa, 15-12-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Eis a entrevista. A não perder...

O que significa o Natal para o senhor?
É o encontro com Jesus. Deus sempre procurou o seu povo, conduziu-o, conservou-o, prometeu estar sempre perto dele. No livro do Deuteronômio, lemos que Deus caminha conosco, nos conduz pela mão como um pai faz com o filho. Isso é bonito. O Natal é o encontro de Deus com o seu povo. E é também uma consolação, um mistério de consolação. Muitas vezes, depois da missa da meia-noite, eu passei algumas horas sozinho, na capela, antes de celebrar a missa da aurora. Com esse sentimento de profunda consolação e paz. Lembro uma vez aqui em Roma, acho que era o Natal de 1974, uma noite de oração depois da missa na residência do Centro Astalli. Para mim, o Natal sempre foi isto: contemplar a visita de Deus ao seu povo.
O que o Natal diz ao homem de hoje?
Ele nos fala da ternura e da esperança. Deus, encontrando-nos, nos diz duas coisas. A primeira é: tenham esperança. Deus sempre abre as portas, nunca as fecha. Ele é o pai que abre as portas. Segundo: não tenham medo da ternura. Quando os cristãos se esquecem da esperança e da ternura, tornam-se uma Igreja fria, que não sabe para onde ir e se refreia nas ideologias, nas atitudes mundanas. Enquanto a simplicidade de Deus te diz: segue em frente, eu sou um Pai que te acaricia. Tenho medo quando os cristãos perdem a esperança e a capacidade de abraçar e acariciar. Talvez por isso, olhando para o futuro, eu falo muitas vezes das crianças e dos idosos, isto é, dos mais indefesos. Na minha vida de padre, indo à paróquia, eu sempre tentei transmitir essa ternura, especialmente às crianças e aos idosos. Me faz bem e me faz pensar na ternura que Deus tem por nós.
Como se pode acreditar que Deus, considerado pelas religiões como infinito e onipotente, se faz tão pequeno?
Os Padres gregos chamavam isso de synkatabasis, condescendência divina. Deus que desce e está conosco. É um dos mistérios de Deus. Em Belém, no ano 2000, João Paulo II disse que Deus se tornou uma criança totalmente dependente dos cuidados de um pai e de uma mãe. Por isso, o Natal nos dá tanta alegria. Não nos sentimos mais sozinhos, Deus desceu para estar conosco. Jesus se fez um de nós e sofreu por nós na cruz, o fim mais horrível, o de um criminoso.
O Natal é apresentado muitas vezes como uma fábula açucarada. Mas Deus nasce em um mundo onde há também muito sofrimento e miséria.
O que lemos nos Evangelhos é um anúncio de alegria. Os evangelistas descreveram uma alegria. Não se fazem considerações sobre o mundo injusto, sobre como Deus faz para nascer em um mundo assim. Tudo isso é fruto de uma contemplação nossa: os pobres, a criança que deve nascer na precariedade. O Natal não foi a denúncia da desigualdade social, da pobreza, mas sim um anúncio de alegria. Todo o resto são consequências que nós tiramos. Algumas certas, algumas menos certas, outras ainda ideologizadas. O Natal é alegria, alegria religiosa, alegria de Deus, interior, de luz e de paz. Quando não se tem a capacidade ou se está em uma situação humana que não permite compreender essa alegria, vive-se a festa com a alegria mundana. Mas, entre a alegria profunda e a alegria mundana, há diferença.
É o seu primeiro Natal [como papa], em um mundo onde não faltam conflitos e guerras...
Deus nunca dá um dom a quem não é capaz de recebê-lo. Se Ele nos oferece o dom do Natal é porque todos nós temos a capacidade de compreendê-lo e recebê-lo. Todos, desde o mais santo ao mais pecador, do mais limpo ao mais corrupto. O corrupto também tem essa capacidade: pobrezinho, talvez a tenha um pouco enferrujada, mas a tem. O Natal, neste tempo de conflitos, é um chamado de Deus, que nos dá esse dom. Queremos recebê-lo ou preferimos outros presentes? Este Natal, em um mundo conturbado pelas guerras, me faz pensar na paciência de Deus. A principal virtude de Deus explicitada na Bíblia é que Ele é amor. Ele nos espera, nunca se cansa de nos esperar. Ele dá o dom e depois nos espera. Isso também acontece na vida de cada um de nós. Há aqueles que o ignoram. Mas Deus é paciente, e a paz, a serenidade da noite de Natal é um reflexo da paciência de Deus conosco.
Em janeiro, serão 50 anos da histórica viagem de Paulo VI à Terra Santa. O senhor também irá?
O Natal sempre nos faz pensar em Belém, e Belém está um ponto preciso, na Terra Santa, onde Jesus viveu. Na noite de Natal, eu penso acima de tudo nos cristãos que vivem lá, naqueles que têm dificuldades, em muitos deles que tiveram de deixar aquela terra por vários problemas. Mas Belém continua sendo Belém. Deus veio em um ponto determinado, em uma terra determinada, lá apareceu a ternura de Deus, a graça de Deus. Não podemos pensar no Natal sem pensar na Terra Santa. Cinquenta anos atrás, Paulo VI teve a coragem de sair para ir lá, e assim começou a época das viagens papais. Eu também desejo ir até lá, para encontrar o meu irmão Bartolomeu, patriarca de Constantinopla, e com ele comemorar esse cinquentenário, renovando o abraço entre o Papa Montini e Atenágoras, ocorrido em Jerusalém em 1964. Estamos nos preparando para isso.
O senhor encontrou-se várias vezes com crianças gravemente doentes. O que se pode dizer diante desse sofrimento inocente?
Um mestre de vida para mim foi Dostoiévski, e aquela sua pergunta, explícita e implícita, sempre girou no meu coração: por que as crianças sofrem? Não há explicação. Vem-me esta imagem: em um certo ponto da sua vida, a criança se "desperta", não entende muitas coisas, se sente ameaçada, começa a fazer perguntas ao pai ou à mãe. É a idade dos "porquês". Mas, quando o filho pergunta, ele não ouve tudo o que você tem a dizer. Ele logo pressiona você com novos "porquês". O que ele busca, mais do que a explicação, é o olhar do pai que dá segurança. Diante de uma criança sofredora, a única oração que me vem é a oração do porquê. "Senhor, por quê?" Ele não me explica nada. Mas eu sinto que Ele me olha. E assim eu posso dizer: "Tu sabes o porquê, eu não sei, e Tu não me o dizes. Mas Tu me olhas, e eu confio em Ti, Senhor, confio no teu olhar".
Falando do sofrimento das crianças, não podemos esquecer a tragédia daqueles que passam fome.
Com a comida que sobra e jogamos fora, poderíamos dar de comer a muitos. Se conseguíssemos não desperdiçar, reciclar a comida, a fome no mundo diminuiria muito. Fiquei impressionado ao ler uma estatística que fala de 10 mil crianças mortas de fome a cada dia no mundo. Há muitas crianças que choram porque têm fome. Outro dia, na audiência da quarta-feira, atrás de uma barreira, havia uma jovem mãe com o seu bebê de poucos meses. Quando eu passei, a criança chorava muito. A mãe o acariciava. Eu lhe disse: "Senhora, acho que o pequeno tem fome". Ela respondeu: "Sim, já está na hora"... Eu respondi: "Mas dê-lhe de comer, por favor!" Ela tinha pudor, não queria amamentá-lo em público, enquanto o papa passava. Eis, eu gostaria de dizer o mesmo para a humanidade: deem de comer! Aquela mulher tinha leite para o seu bebê. No mundo, temos comida suficiente para saciar a todos. Se trabalharmos com as organizações humanitárias e conseguirmos estar todos de acordo em não desperdiçar comida, fazendo com que ela chegue a quem dela precisa, daremos uma grande contribuição para resolver a tragédia da fome no mundo. Gostaria de repetir à humanidade o que eu disse àquela mãe: deem de comer a quem tem fome! Que a esperança e a ternura do Natal do Senhor nos sacudam da indiferença.
Alguns trechos da Evangelii gaudium atraíram-lhe as acusações dos ultraconservadores norte-americanos. Qual é a sensação de um papa ao ouvir que é definido como "marxista"?
A ideologia marxista é equivocada. Mas, na minha vida, eu conheci muitos marxistas bons como pessoas, e por isso eu não me sinto ofendido.
As palavras que mais chamaram a atenção são aquelas sobre a economia que "mata"...
Na exortação, não há nada que não se encontre na Doutrina Social da Igreja. Eu não falei de um ponto de vista técnico. Eu tentei apresentar uma fotografia do que acontece. A única citação específica foi sobre as teorias da "recaída favorável", segundo as quais todo crescimento econômico, favorecido pelo livre mercado, consegue produzir por si só uma maior equidade e inclusão social no mundo. Havia a promessa de que, quando o copo estivesse cheio, ele transbordaria, e os pobres seriam beneficiados com isso. O que acontece, ao invés, é que, quando está cheio, o copo magicamente se engrandece, e assim nunca sai nada para os pobres. Essa foi a única referência a uma teoria específica. Repito, eu não falei como técnico, mas segundo a doutrina social da Igreja. E isso não significa ser marxista.
O senhor anunciou uma "conversão do papado". Os encontros com os patriarcas ortodoxos lhe sugeriram algum caminho concreto?
João Paulo II falara de modo ainda mais explícito de uma forma de exercício do primado que se abra a uma situação nova. Mas não só do ponto de vista das relações ecumênicas, mas também nas relações com a Cúria e com as Igrejas locais. Nesses primeiros nove meses, eu recebi a visita de muitos irmãos ortodoxos, Bartolomeu, Hilarion, o teólogo Zizioulas, o copta Tawadros: este último é um místico, entrava na capela, tirava os sapatos e ia rezar. Senti-me seu irmão. Eles têm a sucessão apostólica. Eu os recebi como irmãos bispos. É uma dor ainda não poder celebrar a Eucaristia juntos, mas a amizade existe. Acredito que o caminho é este: amizade, trabalho comum e rezar pela unidade. Abençoamo-nos uns aos outros, um irmão abençoa o outro, um irmão se chama Pedro, e o outro se chama André, Marcos, Tomás...
A unidade dos cristãos é uma prioridade para o senhor?
Sim, para mim o ecumenismo é prioritário. Hoje, existe o ecumenismo do sangue. Em alguns países, matam os cristãos porque carregam uma cruz ou têm uma Bíblia, e, antes de matá-los, não lhes perguntam se são anglicanos, luteranos, católicos ou ortodoxos. O sangue é misturado. Para aqueles que matam, somos cristãos. Unidos no sangue, embora entre nós ainda não consigamos dar os passos necessários rumo à unidade, e talvez o tempo ainda não chegou. A unidade é uma graça, que deve ser pedida. Eu conhecia um pároco em Hamburgo que acompanhava a causa de beatificação de um padre católico guilhotinado pelos nazistas porque ensinava o catecismo às crianças. Depois dele, nas filas dos condenados, havia um pastor luterano, morto pelo mesmo motivo. O sangue deles se misturou. Aquele pároco me contava que tinha ido ao encontro do bispo e lhe dissera: "Eu continuo acompanhando a causa, mas de todos os dois, e não só do católico". Esse é o ecumenismo do sangue. Ele também existe hoje, basta ler os jornais. Aqueles que matam os cristãos não pedem para você a carteira de identidade para saber em qual Igreja você foi batizado. Devemos levar em consideração essa realidade.
Na exortação, o senhor convidou a escolhas pastorais prudentes e audazes com relação aos sacramentos. A que o senhor se referia?
Quando eu falo de prudência, não penso em uma atitude paralisante, mas sim em uma virtude de quem governa. A prudência é uma virtude de governo. A audácia também é. Deve-se governar com audácia e com prudência. Eu falei do batismo e da comunhão como alimento espiritual para seguir em frente, a serem considerados como um remédio, e não como um prêmio. Alguns logo pensaram nos sacramentos para os divorciados em segunda união, mas eu não entrei em casos particulares: eu só queria indicar um princípio. Devemos buscar facilitar a fé das pessoas, mais do que controlá-la. No ano passado, na Argentina, eu havia denunciado a atitude de alguns padres que não batizavam os filhos das mães solteiras. É uma mentalidade doente.
A exclusão da comunhão para os divorciados que vivem uma segunda união não é uma sanção. É bom lembrar disso. Mas eu não falei disso na exortação.
O próximo Sínodo dos Bispos irá tratar disso?
A sinodalidade na Igreja é importante: falaremos sobre o matrimônio em seu conjunto nas reuniões do consistório em fevereiro. Depois, o tema será abordado no Sínodo Extraordinário de outubro de 2014 e, novamente, durante o Sínodo Ordinário do ano seguinte. Nesses âmbitos, muitas coisas serão aprofundadas e se esclarecerão.
Como procede o trabalho dos seus oito "conselheiros" para a reforma da Cúria?
O trabalho é longo. Quem queria fazer propostas ou enviar ideias o fez. O cardeal Bertello recolheu os pareceres de todos os dicastérios vaticanos. Recebemos sugestões dos bispos de todo o mundo. Na última reunião, os oito cardeais disseram que chegamos ao momento de fazer propostas concretas, e no próximo encontro, em fevereiro, eles me entregarão as suas primeiras sugestões. Eu sempre estou presente nos encontros, exceto na manhã da quarta-feira, por causa da audiência. Mas eu não falo, apenas ouço, e isso me faz bem. Um cardeal idoso, há alguns meses, me disse: "O senhor já começou a reforma da Cúria com a missa cotidiana em Santa Marta". Isso me fez pensar: a reforma começa sempre com iniciativas espirituais e pastorais, antes que com mudanças estruturais.
Qual é a relação certa entre a Igreja e a política?
A relação deve ser ao mesmo tempo paralela e convergente. Paralela, porque cada um tem o seu caminho e as suas diversas tarefas. Convergente, apenas em ajudar o povo. Quando as relações convergem primeiro, sem o povo, ou não se importando com o povo, começa aquele conúbio com o poder político que acaba apodrecendo a Igreja: os negócios, os compromissos... É preciso prosseguir paralelamente, cada um com o seu próprio método, as suas próprias tarefas, a sua própria vocação. Convergentes só no bem comum. A política é nobre, é uma das formas mais altas de caridade, como dizia Paulo VI. Nós a sujamos quando a usamos para os negócios. A relação entre a Igreja e o poder político também pode ser corrupta, se não converge no bem comum.
Posso perguntar-lhe se teremos mulheres cardeais?
É uma brincadeira que saiu não sei de onde. As mulheres na Igreja devem ser valorizadas, e não "clericalizadas". Quem pensa nas mulheres cardeais sofre um pouco de clericalismo.
Como está o trabalho de limpeza do IOR?
As comissões referentes estão trabalhando bem. O Moneyval nos deu um relatório bom, estamos no caminho certo. Sobre o futuro do IOR, veremos. Por exemplo, o "banco central" do Vaticano seria a APSA [Administração do Patrimônio da Sé Apostólica]. O IOR foi instituído para ajudar as obras de religião, missões, as Igrejas pobres. Depois se tornou como é agora.
Há um ano, o senhor podia imaginar que celebraria o Natal de 2013 em São Pedro?
Absolutamente não.
Esperava ser eleito?
Não esperava. Eu não perdi a paz enquanto os votos aumentavam. Permaneci tranquilo. E essa paz ainda existe agora, eu a considero um dom do Senhor. Terminado o último escrutínio, levaram-me ao centro da Capela Sistina e me perguntaram se eu aceitava. Eu respondi que sim, disse que me chamaria Francisco. Apenas então me afastei. Eles me levaram para a sala adjacente para trocar de hábito. Depois, pouco antes de me assomar, me ajoelhei para rezar por alguns minutos, juntamente com os cardeais Vallini e Hummes, na Capela Paulina.

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

dramático: crianças passam fome

Impossível não chorar perante este relato. Mais ainda se é dito que se passou na nossa cidade do Funchal, que vergonha meu Deus...
Esta “carta” que partilho convosco foi escrita por Valentina Ferreira e relata um momento por ela vivido no Funchal, mas infelizmente podia passar-se em qualquer cidade deste País onde um Povo apático, resignado, acobardado baixa a cabeça perante todos os atropelos que os feudais senhores lhes fazem. Um Povo que permite que as suas crianças passem fome é um Povo que perdeu a sua identidade, perdeu a sua estima, perdeu o respeito e se encaminha a passos largos para perder o direito de ser chamado Povo.
Ramalho Eanes há tempos disse, a propósito do aumento dos impostos, poder ainda ser mais carregado mas que lhe garantissem que essa carga serviria para que ninguém passasse fome em Portugal. Palavras vãs, essa carga, a dele e a nossa, serve para as negociatas continuarem a ser feitas, servem para as jogadas continuarem ao mesmo ritmo, servem para aumentar o lucro dos bancos mas não servem para alimentar quem tem fome.
Não vou fazer mais comentários, leiam a “carta” que aqui transcrevo na integra e tirem as vossas próprias conclusões. Tiradas que sejam as conclusões pensem se é isto que querem para o futuro do nosso País. Decidam se é este o que desejam para os vossos filhos, para os vossos netos.
Caros senhores do Governo: ontem, ao sair do autocarro, vi uma menina. Rosto de 15, corpo de 10. Sorri para ela, dois segundos e segui caminho. Veio ao meu encontro: mão estendida e olhos de vergonha no chão. Perguntou se não tinha moedas. Eu, que estou farta que me venham pedir nos estacionamentos dos supermercados e a cada esquina do Funchal, endureci a voz e questionei-a para quê queria o dinheiro.
- Tenho fome.
Fiquei eu envergonhada. Muito.
- O que queres comer?
- Tanto faz. Pode ser pão.
Disse-lhe para vir comigo. Ela veio, aos pulinhos, sem dizer nada. Levei-a ao Pingo Doce, fiz-lhe um prato decente e sentámo-nos. Mastigou sem saborear, sem respirar. Disse-lhe três ou quatro vezes que podia comer devagar, que aquilo era dela, para ela. Mas só nas últimas garfadas vi-a realmente desfrutar da comida: já estava com o buraco da fome tapado e podia, então, experimentar os sabores com calma. Deixei-a acabar para conversarmos. Disse-me ter nove anos.
Caros senhores do Governo: nove anos, às oito e pouco da noite, no Inverno, sozinha, na rua. Porque tinha fome.
- Onde estão os teus pais?
- A minha mãe está em casa. O meu pai está em “Jer” (presumo que seja Jersey).
- E estão difíceis as coisas em casa?
- Sim. A minha mãe costumava fazer limpezas mas agora já não há muitas casas para limpar e então ela só vai a uma. E o meu pai foi trabalhar para “Jer” mas não tem conseguido mandar dinheiro estes últimos tempos.
- E tens irmãos?
- Sim, cinco.
- Assim pequenos como tu?
- Tem um com dois, outro com quatro, outro com sete, outro com treze e outro com quinze.
Olhei melhor para ela. Era bonita; lindíssima se penteasse o cabelo. Tive medo. Caros senhores do Governo: nove anos, à noite, na rua. Uma menina com fome, acessível, necessitada. Tive muito medo.
- E eles também pedem dinheiro?
- Sim, cada um tem que cuidar de si, não é?
Não, não é. Não deveria de ser. Caros senhores do Governo: as crianças são para serem cuidadas.
- Costumo pedir a quem parece simpático – continuou. Sinais de alerta na minha cabeça.
- Sim, mas há pessoas que parecem simpáticas mas depois fazem coisas más. Por exemplo, há pessoas que só ajudam se lhes derem algo em troca. Já te aconteceu?
Ela pensou. E eu agoniava por dentro.
- Houve uma vez que uma vizinha pediu-me para levar muitos sacos ao lixo e deu-me dois euros.
Sorri-lhe.
- Eu sei que há homens que querem sexo e dão dinheiro – disse-me, com a voz mais baixa.
Senti uma pontada na cabeça.
- Como sabes?
- A minha mãe disse que podíamos roubar e pedir. Roubar só a quem tiver mais que nós. Mas nunca fazer sexo. Está sempre a dizer isso. É bastante chata porque eu já lhe disse que nem sequer sei fazer sexo.
Caros senhores do Governo: já imaginaram o que é uma mãe dizer aos filhos que roubar e pedir pode ser? Já imaginaram a angústia desta mãe, todas as noites, a pensar que os filhos, por precisarem, podem cair no vício da prostituição?
- Já sabes que as mães são assim porque se preocupam connosco.
- A tua também te diz para não fazeres sexo pelo dinheiro mesmo que tenhas muita fome?
Caros senhores do Governo: o que se responde a isto?
- Sim, diz….
- Então é chata como a minha – sorriu.
Nesse momento, começou a mexer-se na cadeira. Perguntei-lhe se queria ir embora. Disse-me que sim, antes que ficasse muito tarde. Pedi-lhe para vir comigo. Comprámos pão de forma, manteiga e leite. O saco quase que era maior que ela – mas não do que o sorriso e o brilho nos olhos.
- A minha mãe vai ficar contente! – e olhou-me demoradamente. – Gosto muito dos teus brincos.
- Ah, gostas?
- Sim – levou a mão à orelha. – Eu tinha uns dourados em pequena, que a minha madrinha deu-me, mas a minha mãe teve que vender. Fiquei menos vaidosa. A minha mãe diz que essas coisas agora não importam.
Tirei os brincos e coloquei-os nos buraquinhos quase fechados dela. Caros senhores do Governo: eu tinha diante de mim uma menina que deixara de ser menina para crescer à pressa nas curvas da crise, palavra que já me causa vómitos. Ela suspirou.
- Vou guardá-los – e tirou-os à pressa. – Para quando casar.
- Mas isso ainda falta muito tempo – admirei-me. – Já pensas nisso?
- Eu sei que falta algum tempo – disse algum e não muito. – Mas é menos uma coisa que tenho que comprar. Mas ele tem que ter dinheiro porque não quero que os meus filhos passem fome. Quero ter dois filhos – e espetou-me dois dedos diante dos olhos.
Caros senhores do Governo: uns brincos rafeiros, de plástico, vermelhos. Para o casamento de uma menina que já não era menina e que tinha o plano bem traçado de casar com um homem rico.
- Olha, tu queres que eu fale com umas pessoas para tu e os teus irmãos poderem ir para um sítio seguro enquanto a vossa situação está assim?
Vi o pânico na expressão.
- Não! A minha família é feliz. Não quero separar-me deles. Isto vai mudar. O meu pai prometeu – meteu a mão na cintura, muito ofendida. – O meu pai faz sempre o que diz.
Caros senhores do Governo: eu espero que vocês permitam que este pai cumpra o que prometeu à filha. É que vocês já lhe tiraram tudo: deixou de ser criança e de ter os pais juntos, obrigam-na a mendigar na rua e a passar fome. Não lhe tirem, também, o orgulho em ter um pai que cumpre o que promete.
Caros senhores do Governo: dizem as mulheres da minha família que a vida é uma rodinha. Que o que fazemos aos outros, seja de bom ou de mau, volta sempre – mas sempre mesmo. Portanto, algum dia, em qualquer circunstância, em alguma vida, os senhores vão receber aquilo que estão a dar: miséria, desconforto, sofrimento e a impossibilidade de serem quem querem ser.
Caros senhores do Governo: só vos desejo que a vida seja muito cruel convosco.
Cumprimentos,
Valentina Silva Ferreira, in Notícias online
Leram? Sentiram-se bem? Vão continuar a permitir que as nossas crianças sejam maltratadas?

Tão certo que o rosto é o reflexo da alma

Brilhante...
Será a imagem da vida real? Cada um que tira as suas conclusões. Estados de alma e posições sociais estampados no rosto.
O patrão                                 O adjunto
O estagiário                                    O contratado

  O chefe de projetos                O contabilista

A secretária

O marido da secretária

A "bomba" da contabilidade 

O segurança

A mulher da limpeza nº1

A mulher da limpeza nº2

Dois chefes em conflito 

A festa de fim de ano da empresa

Depois da festa

Fim de semana

A sesta em casa

Companheiros depois de uns copos
 

Em baixa prolongada
 

Reformado