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terça-feira, 14 de março de 2017

Deus e eu

Esta semana com Miguel L. Castro Fonseca Henriques...



Se falo de mim e de Deus, tenho de falar do outro que me revela Deus em mim. Deus e eu é uma relação que deriva da relação que tenho com o outro, onde vejo a presença ou a ausência de Deus. Se o inferno são os outros, o inverso também é verdade, Deus vê-se nos outros. Mas quer a presença, quer a ausência de Deus nos outros, pode derivar não dos outros, mas da ausência de Deus em mim, que não o faço presente na vida dos outros, e, sobretudo, me abstenho de tornar presente Deus na vida das outros quanto e quando mais pressinto que Deus está ausente da sua vida. Os outros são os que gravitam na periferia do eu, e, como cada eu tem a sua periferia, eu sou também os outros e os outros fazem parte de mim. Se nos retirarmos, Deus está ausente. Retiramo-nos quando ignoramos o outro nas suas necessidades corporais e espirituais: Deus está ausente se há fome, sede, frio, no corpo e na alma, falta de tecto ou de palavra, ignorância, horizonte, alegria, perdão, paciência, perda de memória. Mas logo o coração se abre ao outro e eis que Deus está de volta. Ou seja, as ausências de Deus são as nossas ausências. É a mim que me cabe trazê-lo de volta. Deus é essa realidade imanente que deriva das nossas ações. É aqui e não lá que se quebra essa linha que, epistemologicamente, separa os que creem na transcendência, pois que ele vive ou não vive, aqui e agora, por exclusiva decisão e responsabilidade nossa. Mesmo se o devirmos em valores universais, seja a liberdade, o amor, a caridade, enfim, a transcendência, que, como abóboda, não se sustenta se não assentar em pilares de base, fuste e capital erguidos sobre as nossas ações. É legítimo dar-lhe um perfil antropomórfico, cada um de nós, com a ideia de Vítor Hugo de que, se o Universo é infinito, tinha de ter um eu, senão não seria infinito. Podemos até lhe darmos um rosto à medida dos nossos conhecimentos. Jesus é o ser amável que conheço para ser o rosto de Deus. Através de Jesus, posso me relacionar com Deus, mas devo aceitar que cada um estabelecerá esse diálogo como bem entender, desde que os valores universais superem a linha que me dilacera e que divide os designados, pela sua forma de relação com os valores, em crentes e ateus, e todos compreendam que esses valores universais partem da imanência de cada ato. Cada ser realiza-se em unidade com os outros, o que se pode traduzir na oração que une habitantes de todo o universo, Pai Nosso e assim na terra como no céu. Somos todos filhos do universo. 

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