Não pretendo com esta carta arvorar-me em sábio ou pretender manifestar qualquer autoridade sobre vós, somos todos sacerdotes, iguais em dignidade e irmãos como cristãos e com a condição sacramental do sacerdócio ministerial.
Sirvo-me deste espaço nobre para falar-vos já que são muito escassos e até estamos muito longe de haver momentos na nossa Igreja que nos congregasse todos, para falarmos, debatermos e partilharmos ideias uns com os outros. Os ideais de partilha que anunciamos e pregamos são tábua rasa na nossa Igreja Católica. É pena, são hábitos que ainda não temos. Bom, contas de outro rosário.
Serve a presente carta para tornar público que a nossa Igreja Católica, nem que seja uma singela ponta, sangra de vergonha pelo momento triste que estamos a passar na nossa terra. É caso para dizer como dizia há dias o Bispo D. Januário Torgal: «Tenho vergonha do meu país», adaptando: «Tenho vergonha da minha região». Não pela nossa terra em si, a beleza deslumbrante que apresenta, o nosso povo amigo e generoso (provavelmente, nós padres somos as pessoas que mais sabem e experimentam desta amizade e generosidade).
A vergonha advém por causa dos «senhores do tempo» que fizeram asneiras que levam ao descrédito este tempo e o tempo futuro. Todos nós, de alguma forma, recebemos subsídios dos «senhores do tempo», acreditamos que sempre foram para o bem do povo nunca para benefício pessoal e corre a fama (e ainda bem que corre), que as obras levadas adiante pelos membros da Igreja raramente sofrem derrapagens. Ainda bem que podemos contar com esta generosidade e boa fama.Na nossa terra estes deveres que a Constituição e a lei do nosso país prevêem foram tomados como «favores», então, eles amarraram, silenciaram, amedrontaram, numa palavra domesticaram os «senhores do templo». E não é que, tristemente, esta abjecta política resultou em cheio… O «favor» recebeu apaticamente outro «favor».
Bom, olhando para tudo podemos concluir que se fez o melhor para a nossa terra e os louvores a quem levou adiante tal tarefa de dar o melhor ao nosso povo devem ser dados. Porém, não podemos esquecer que toda a moeda tem duas faces e esta também tem. Por isso, chegados a este descalabro de dívidas mais ou menos claras ou escondidas, havemos de pensar que estamos num momento crucial na nossa terra. Não pretendo nesta carta revelar onde está o bem e onde está o mal, não nos compete fazer isso, mas para que, nós «senhores do templo» não sejamos no futuro acusados de coniventes com os «senhores do tempo» deste tempo, coniventes por uma irresponsabilidade tão prejudicial para o povo que amamos e para as gerações vindouras. Temos hoje o dever de alertar as pessoas para que se esclareçam, não se deixem ludibriar mais pela mentira e para que não sejam mais instrumentos de interesses puramente mundanos que beneficiam meia dúzia, deixando a maioria hipotecada, atolada em dívidas e com o futuro nas mãos da vontade alheia.
A campanha aí está. Elas tornaram-se um circo de pedincha de votos, um desbobinar de promessas que depois não são cumpridas e se são vão sempre em sentido contrário, contra o povo. O nosso povo está cansado de ser enganado, cansado deste circo. Mas, nós temos que mostrar responsabilidade, lucidez e cumprir o nosso papel de acordo com o Evangelho de Jesus e não manietados com lógicas interesseiras deste mundo. Os subsídios não devem aprisionar nenhum padre às saias do altar, mas sempre libertos, serem profetas, de pé diante da humanidade e só e unicamente de joelhos diante de Deus (Paulo VI- Papa).Amigos e irmãos, sejamos responsáveis, façamos tudo quanto estiver ao nosso alcance para que o povo que servimos se esclareça e depois decida em verdade e consciência.
Termino voltando ao pensamento do Bispo já citado nesta carta que, recordando o passado diz ter vergonha da Igreja quando esta se calou e se ajoelhou diante de Salazar. Lembra que homens da Igreja foram educados no medo e não na liberdade e no à vontade de dizer o que pensam. É disto que se trata, para que no futuro não sejamos acusados de medricas e de não termos feito o que o Evangelho do nosso Mestre nos manda fazer. Esta é uma carta-alerta, para que a nossa Igreja Católica assuma com verdade e coragem o bem do povo que diz servir. Um dever de consciência e uma verdade que emana do Evangelho da Verdade à qual estamos ligados por obrigação. Sejamos fortes na esperança. Deixo-vos um abraço fraterno.
José Luís Rodrigues, padre
Texto de opinião publicado este domingo, 25 de Setembro de 2011 no Diário de Notícias do Funchal na rubrica Sinais dos Tempos...
1 comentário:
Se me permite a ousadia, é também um alerta para todos os que aqui vivem.
Abraço fraterno.
Isabel Abreu
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