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quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

A justiça e a caridade

Citação:
«Como diz o escritor Víctor Hugo: "Faz-se caridade, quando não podemos impor a justiça". Porque não é caridade o que se precisa. A justiça vai às causas. A caridade aos efeitos. Eu não digo que não se deve ajudar com um prato de sopa ou um abrigo, as pessoas que estão nas ruas. Há urgências. Eu faço isso, mas a minha consciência não fica tranquila, porque penso que devemos lutar contra as causas estruturais que mantêm essas pessoas na injustiça. O mais triste é que as pessoas já se começam a habituar à injustiça. E eu digo-lhes: Acordem! Tenham vergonha! Indignemo-nos todos contra a injustiça!»

Bispo francês Jacques Gaillot
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A luta dos povos árabes, com a qual nos solidarizamos totalmente, tem a ver com esta frase de J. Gaillot, bispo francês, demitido da Diocese de Evreux a 13 de Janeiro de 1995, por causa da sua acção em favor dos pobres e por assumir posições corajosas de acordo com aquilo que a ortodoxia católica defende, mas que a real-política não permite que se vá adiante com tais mudanças. Daí os castigos.
Mas, o que interessa para o caso desta refelxão... Quem sabe se estas revoltadas dos povos, não é o resultado de anos e anos de caridade? – A injustiça estruturada é fruto do açambarcamento que alguns fazem dos bens que são destinados a todos. Este roubo legal, mais tarde ou mais cedo, resulta na ira da maioria que se cansou de ser espezinhada pelo aguilhão da ganância que nunca se farta… Porém, os povos fartaram-se de serem injustiçados e, por isso, estão nas ruas a lutar pela sua dignidade. Um aviso, para todos os países, incluindo o nosso e a nossa região, onde impera a injustiça estruturada e a caridade muitas vezes é mais um elemento para apaziguar consciências. Serve muitas vezes como instrumento para não atacar o que deve ser atacado. Serve para calar os que gritam por justiça e alimentar ainda mais a pobreza.
Até quando este estado de coisas? – Esperemos que os nossos governantes se inquietem profundamente com esta revolta dos povos árabes e que vejam nisso um reflexo do que poderá cair-lhes em cima se não tiverem coragem de encetar novos rumos, que levem à prática da justiça. É esta a lição que devemos tirar daquilo que está acontecer às portas da Europa. No fundo, que chegue o dia em que todas as acções estão em conjugação absoluta com a justiça que ataca as raízes dos desequilíbrios sociais e não com a caridade que alimenta as consequências. É isto que está realmente em causa. Como proclamou o poeta António Aleixo: «Vós que lá do vosso Império / prometeis um mundo novo, / calai-vos, que pode o povo / qu'rer um Mundo novo a sério». E não é que às vezes quer mesmo!...
JLR

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Soneto sobre a vida dos portugueses

Os poetas cantam a natureza, a alma e a vida. Por isso, e para não ser excepção, e porque era um homem do seu tempo, .... José Régio também fez umas rimas sobre a vida dos portugueses... em 1969! E a propósito dos apertos financeiros que o governo aplica aos portugueses, vem sempre oportunamente a reflexão ao nosso encontro para tomarmos alento face ao que outros pensaram já no seu tempo.
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Surge Janeiro frio e pardacento,
Descem da serra os lobos ao povoado;
Assentam-se os fantoches em São Bento
E o Decreto da fome é publicado.
..
Edita-se a novela do Orçamento;
Cresce a miséria ao povo amordaçado;
Mas os biltres do novo parlamento
Usufruem seis contos de ordenado.
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E enquanto à fome o povo se estiola,
Certo santo pupilo de Loyola,
Mistura de judeu e de vilão,
...
Também faz o pequeno "sacrifício"
De trinta contos - só! - por seu ofício
Receber, a bem dele... e da nação.
JOSÉ RÉGIO, Soneto escrito em 1969, no dia de uma reunião de antigos alunos.(Fonte desconhecida)