No Livro de Albert
Camus, A Peste, fica bem claro no final do romance que a peste só começa a
ceder terreno quando os habitantes da cidade de Orão começam a ter esperança. É
tão bonito descobrir este detalhe como «remédio» essencial para reverter uma
maleita tão terrível que consumia os habitantes da cidade, a peste bubónica. O
livro A Peste é uma alegoria sobre a
ocupação nazista na qual cada personagem simboliza um ator ou uma
instituição social (a Igreja Católica também está lá na figura do padre
Paneloux). No entanto, esta alegoria sobre o nazismo também é uma metonímia
sobre a condição humana.
Muito mais que seguro é que a peste, após dizimar uma porção de pessoas
e de semear a doença por todo o lado, a vida destes
cidadãos mudou radicalmente. A peste tinha vindo fazer uma boa ação, os casais
passaram a apaixonar-se e sentirem saudade, as pessoas passaram a dar valor à
vida, a cada dia das suas vidas. O mote em nós podia ser o Natal. Este momento
cheio de magia e alegria poderia marcar a nossas vidas, como chegada e como
partida.
Nós também temos as
nossas pestes que começam a semear doenças e sofrimento por todo o lado. Por
isso, gostava que o Natal não fosse um intervalo das pestes quotidianas que nos
assolam. Assim como um, intervalo das pestes e passado este tempo tudo volta
outra vez às «doenças» que alimentamos, porque não fazemos nada para combatê-las.
Gostava que servisse o
Natal para nos redimir da concorrência desleal, da inveja desregrada e
desmedida, do egoísmo cego que não olha ao sucesso e à felicidade dos outros, da
intolerância que se manifesta em xenofobia e repulsa pela diversidade e pelo
diferente, da insensibilidade ecológico que nos tem revelado tanta incivilidade quanto
às péssimas práticas no tratamento do lixo, da ganância que leva à humilhação
dos outros no trabalho, na família, nas escolas, no trânsito e em muitos
lugares onde a vida acontece.
Gostava que servisse o
Natal para a assunção dos erros de cada, para que depois a prática do pedir de
desculpas andasse na vida o ano inteiro. Poderia fazer bem a tanta gente, praticar
os elogios ou viver agradecidos às maravilhas da existência e aos outros.
A título de exemplo, lembro
a peste da violência doméstica que continua a humilhar, a deixar doentes psicologicamente
e fisicamente pessoas para o resto das suas vidas. O escândalo desta peste que
tem deixado para trás mulheres violadas, humilhadas, feridas e mortas, tem sido
das maiores pestes dos nossos dias.
A assim sendo gostava
que o Natal não fosse esse momento de chegada, tipo um intervalo apenas para
trocar prendas, divertir-se, beber, comer, conviver cantar e bailar, para
depois voltar tudo à anormalidade da peste. Tudo tão bem intencionado e incentivado para manter a massa (povo) adormecida, bêbeda para não reparar nas patifarias, nas violações das leis e na exploração que se vai fazendo por aí. É preciso não fazer deste tempo um ópio alucinante que nos distrai ou nos mata.
O Natal essencialmente
deve ser partida para as vivências do ano inteiro., onde não faltará a
sabedoria para a solidariedade sincera, a justiça corajosa e a prática de todos
os valores que nos fazem humanidade e, no nosso caso, cristãos, que andam a
rezar e a ouvir palavras de perdão, de amor e de reconciliação dentro das
igrejas.
Repito o Natal deve ser
chegada e partida. Uma, para remediar, purificar e arrepiar caminhos tortuosos,
outra, ponto de partida para a prática da conversão dessa magia que se
incentivou e saboreou com todos os elementos próprios desta quadra natalícia.
Não sendo assim, tudo continuará a ser mais do mesmo, melhor, sofreremos ano
fora as mesmas doenças e pestes, porque tudo não passou de fina e crua
hipocrisia.
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