Uma figura ímpar do século passado da Madeira. Um homem interessante que soube ler a vontade do seu povo e que por ele sofre a miséria das prisões da «velha senhora», isto é, os calaboiços inumanos da ditadura de Salazar.
A propósito da sua morte a 18 de Junho de 1989, o Jornal da Madeira, em 20 de Junho de 1989 escreveu o seguinte: «O padre Dr. César Teixeira da Fonte é natural do Estreito da Calheta, onde nasceu no dia 29 de Setembro de 1902, tendo falecido em Lisboa no dia 19 de Junho de 1989.
Foi ordenado presbítero no dia 24 de Setembro de 1927 e celebrou a sua Primeira Missa, no Estreito da Calheta, no dia seguinte.
Em 30 de Setembro de 1927 foi nomeado Coadjutor de Câmara de Lobos e, em princípios de Dezembro de 1927, tomou conta da Paróquia do Porto Santo.
Em 1 de Outubro de 1928 foi nomeado pároco da freguesia da Calheta, tendo depois, em 9 de Março de 1930, sido nomeado pároco da freguesia do Faial. Em 1 de Julho de 1934 acumulou a função de Pároco de São Roque do Faial.
Em 1936, não ficou indiferente a um problema que veio afectar a vida dos seus paroquianos e das populações rurais da Madeira. Foi a chamada questão dos lacticínios, levantada pela promulgação do Decreto de 4-6-1936 que fundava a Junta de Lacticínios da Madeira que monopolizou a indústria lacticínia, dentro duma organização que o povo considerava lesiva dos seus direitos. Perante tal situação, a população rural manifestou o seu descontentamento, tendo merecido o apoio do padre César. Com consequência disso viria a ser preso, a 11 de Setembro de 1936, conjuntamente com muitos dos seus paroquianos. Depois de longos meses no Lazareto seguiu para Caxias.
Em meados de Janeiro de 1938 viria a ser restituído à liberdade e regressou à freguesia do Faial, onde continuou a paroquiar.
No fim desse ano partiu para Lisboa, onde, a partir de 5 de Dezembro de 1938, passou a exercer o seu múnus sacerdotal na paróquia de São Sebastião, matriculando-se também no Curso de Direito, que concluiu a 21 de Julho de 1943.
O Padre Dr. César, em Lisboa ficou adstrito ao serviço da Igreja de São Sebastião da Pedreira.
A par das suas funções eclesiásticas, a partir da sua formatura em Direito, exerceu simultaneamente a advocacia, procurando fazer dela um apostolado, interessando-se muito pelas causas dos pobres e por assuntos jurídicos relacionados com a vida eclesiástica de muitas paróquias do Patriarcado. Pela sua acção intrépida, inteligente e zelosa e, ao mesmo tempo, pela sua delicadeza que o tornava estimado, fez muitos amigos e admiradores que não o esquecem».
Um padre livre no pensar e sem dúvidas nenhumas quanto às opções a fazer. Não pondera o que pensará o poder político e religioso. Diante das necessidades do seu povo coloca-se ao lado dos injustiçados e com eles vai até às últimas consequências. Dizem os seus familiares que por causa do sofrimento e da injustiça que passou nunca mais pronunciou o nome Salazar, porque lhe sujava boca.
O seu regresso ao Funchal e concretamente à Freguesia do Faial, é curiosa e mais curioso o seu regresso repentino a Lisboa em 1938. Após poucos meses, não dava mais ficar no lugar onde o poder político e religioso, amancebado, congeminava perseguir o «comunista» diabólico e perigoso que sublevava o povo.
Esta injustiça é intolerável e devia calar fundo no coração de todos nós para que não se repitam estes atentados à liberdade de consciência e para que a livre expressão do pensamento, o direito de opção e a firmeza das convicções sejam o alimento essencial da Democracia.
Não podemos esqueçar esta figura da Igreja e nem permitir que a Igreja se aliene e silencie estes homens nobres que souberam assumir riscos sem olhar a consequências, no que diz às opções que assumiram em favor do povo.
Muito mal será que sejam só alguns partidos políticos a se apoderarem destas figuras, porque quem devia lembrar, simplesmente, se remete ao silêncio, por medo ou por pecado de omissão. Aqui fica a minha sincera homenagem.
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