1. Nunca se falou tanto de Deus como hoje. Porém, muito
menos se fala da fé e, sobretudo, da fé na sua dimensão social. Por isso, este
falatório geral sobre Deus pouco ou nada tem que ver com a prática da vida.
Porque Deus converte-se cada vez numa espécie de psicologismo de «autoajuda»
para resolver problemas pessoais e dramas existenciais. Tudo isto interessa aos
donos disto tudo e a todos os que pretendem fazer valer políticas integristas e
fascistas. Basta reparar como anda uma série de governantes por esse mundo fora
a receber bençãos e alguns em transes espiritualistas às mãos de pastores que
se fartam de falar de Deus para ganharem dinheiro, manipularem consciências, extorquirem
os bens e a dignidade dos pobres.
2. Não interessa o cristianismo a sério, que assente
a fé na dimensão social, que recorrendo às fontes bíblicas, reclama pela
prática da justiça, o amor ao próximo e a honestidade. Cristãos deste calibre
são odiados. Não interessa nada uma fé militante que reclame pelo fim do mundo
imperialista, pela abolição das organizações sociais baseadas nos privilégios,
nas desigualdades sociais, na meritocracia e nas hierarquizações que endeusam
uns sobre as cabeças dos outros. Os sistemas que assentam sobre estes pilares
fascizantes gostam de Deus como realidade intimista, que aplica o curativo
momentaneamente, mas que não impulsiona para a luta pelo bem comum, pelo fim
das desigualdades e por uma justiça justa, verdadeira. Todas as igrejas que
alimentam isto desconhecem Deus e não estão mesmo nada dentro dos verdadeiros parâmetros
bíblicos.
3. Perante esta onda de Deus para cima e de Deus
para baixo, não faltam mecanismos de manipulação religiosa para quietar as
pessoas nos seus lugares íntimos sem abertura nenhuma ao próximo, à natureza e a
terem nenhuma consciência sobre a ecologia do bem comum. Para esta desgraça não
faltam meios e venenos nos novos movimentos carismáticos dentro e fora da
Igreja Católica e nas seitas religiosas, onde abundam festanças, bençãos de
cura, conversas intimistas, livros de uma plêiade enorme de autores enfeudados
no privatismo religioso. Porém, a pregação sobre a dimensão social da fé
profética que leva à luta da vida inteira e para todos, isso pouco ou nada existe e não importa que
exista aos senhores deste mundo. Um Deus de dentro e para dentro é o que se
quer.
4. Neste domínio não
admira que o estudo sobre a Bíblia e a leitura atenta sobre a mensagem da
libertação dos pobres que a Palavra de Deus preanuncia exista nada e se procure
fazer tudo para que nunca exista. Levar as pessoas a pensar, particularmente,
os pobres não interessa aos dominadores. Daí que se perceba que estejam a ser
eleitos por esse mundo fora líderes fascistas, integralistas devotos do «soberanismo»
(como diz o Papa Francisco). Esta avalanche preocupante devia nos pôr em
sentido e levar-nos a perguntar pelo que andamos a fazer com o Cristianismo e o
quanto temos sido coniventes com ideias desumanizantes que não fazem bem a
ninguém. Deviam soar as campainhas quando há tanta violação contra as liberdades
e as garantias da justiça. A libertação dos sistemas injustos que o nosso mundo
ainda faz perdurar, é a prioridade de Deus e da fé. Há uma grave
responsabilidade em todos nós que devemos fazer valer com uma fé em Deus libertador
de todas formas de manipulação e opressão.
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