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segunda-feira, 12 de abril de 2010

Um não redondo à idolatria

S. Tomás de Aquino tomou do filósofo Plotino (205-270) uma expressão que se tornou emblemática de toda a sua teologia: “De Deus, não sabemos o que Ele é, mas só o que Ele não é”. Em si mesmo, é-nos completamente desconhecido. O que dizemos de positivo a respeito do Mistério, excesso de toda a perfeição, deve ser corrigido por negações que cortem qualquer possibilidade de idolatria, imagens dos nossos desejos ou medos.
Acredito em Jesus Cristo, mas é precisamente Ele que me remete para o insondável Mistério de Deus que não cabe em nenhum conceito, que a linguagem metafórica apenas pode sugerir e que não pode ser anexado por ninguém, por nenhum povo, por nenhuma religião.
Mesmo em relação a Jesus Cristo, só podemos acreditar interpretando. O terminal da adesão da fé cristã não são os artigos do Credo, mas a realidade insondável do divino para onde apontam. De Deus tanto mais sabemos quanto mais nos convencermos de que está sempre para além de tudo o que sabemos.
No entanto, por mais que o silêncio honre a Deus, o ser humano crente não consegue renunciar à ousadia de pensar, não só para testemunhar as suas convicções, num determinado contexto cultural, mas porque, não podendo crer sem interpretar, o próprio acto de fé é vivido como cogitação (co-agitação). Não podemos renunciar a pensar, a procurar saber como é que é verdade aquilo que acreditamos ser verdade. Sem isso, podemos proclamar, sinceramente, o Credo, mas ficar de cabeça vazia. É uma tarefa sem fim. A fé não é um calmante, é um excitante, um santo desassossego. Crer não é ver. É desejo de ver, é caminho de todas as energias espirituais do ser humano. É por isso que a linguagem dos místicos não envelhece como a dos conceitos catequéticos e teológicos, muitas vezes mortos à nascença.
Os pastores da Igreja não se devem alegrar nem assustar com as afirmações ou negações da fé anunciadas pelas estatísticas e pelos meios de comunicação. A sua preocupação deve centrar-se na qualidade das experiências cristãs, na linguagem que as exprime e na inteligência da fé no interior da cultura de cada época e de cada mundo.
In «Fé e cabeça vazia»,
Crónica de Frei Bento Domingues, o.p., no jornal Público

2 comentários:

M Teresa Góis disse...

"a Fé é um excitante". É nesta medida que se devia viver a Fé, sentir a Religião, dentro de cada um.Direi mais, que a Fé não acomoda, antes nos incomoda. A contrapartida é o sentimento da Alegria, a segurança do Amor que nem sempre entendemos...Mas também não é preciso, pela Fé sabemos que existe, protege, actua em nós.Infelizmente nem todos sabem dizer não à idolatria e, antes, promovem a idolatria massificada!E, se não bastasse, depois ainda reclamam...

Autor do blog disse...

A idolatria é um mal terrível, cara amiga. A sua partilha é interessante. Temos que lutar sempre contra todo o género de idolatria. A idolatria seja ela qual for leva a uma forma de religião «ópio do povo», como denunciou K. Marx. Bem haja.