Um certo dia corria pela rua abaixo um velho, um rapaz e um burro. As pessoas nas bermas da rua escarneciam do velho e do rapaz porque não montavam o burro, preferiam andar a pé e não aproveitavam o meio de transporte que tinham à mão. Perante o escárnio do povo o velho resolveu montar o burro, as críticas foram certeiras contra o velho que não tinha dó de um rapaz tão novo que obrigava a andar a pé. Aos olhos do povo este velho era mesmo bárbaro porque não se compadecia do pobre rapaz.
As impiedosas críticas fizeram o velho descer da montada e colocar em cima do burro o rapaz. As críticas das pessoas não se fizeram esperar. Um pobre velho, que vergado ao peso da idade vê-se obrigado a caminhar a pé e o miúdo com perna nova monta o burro sem educação nenhuma com gozo sarcástico contra um pobre velho. Um absurdo nunca visto.
Diante dos comentários o velho e o rapaz resolveram montar os dois o burro. As pessoas agora comentavam, coitado do pobre animal que carrega dois malandrecos que não querem andar a pé. Isto é um abuso sobre um pobre animal que merece também alguma consideração, pois, nunca deviam colocar-se os dois ao mesmo tempo sobre animal indefeso.
Nada a fazer, o melhor seria descer do burro e andarem os dois a pé. Mas parece que não terminaram os comentários e de seguida diziam. Burros são estes dois que têm diante si um meio de transporte e andam a pé. Como será possível que não percebam que o burro que caminha com eles é um animal jovem e robusto com corpo suficiente para transportar bastante carga. Há gente mesmo muito burra que não sabe aproveitar as coisas boas da vida.
Cada um que tire a devida lição da parábola.
O mal de tudo sermos deveras muito pequenos. Um dia conversei com um amigo do Brasil, padre e pároco de uma paróquia com duzentas mil pessoas. Um tanto ou quanto compenetrado (ou abalado) contei-lhe alguns episódios da minha terra. A sua reacção foi mais que rápida, expressou um simples sorriso e desatou o seguinte: coisa de «mundo rico» que não tem mais com que se preocupar. Não tive alternativa, fiz silêncio, porque fiquei sem palavras.
A nossa pequenez é deveras surpreendente e mais manifesta que vivemos envoltos num ambiente onde só conta o caso corriqueiro de aldeia medíocre que se diverte com a mesquinhez da vida dos outros esquecendo que a sua noutro canto está a ser vasculhada e badalada aos quatro ventos.
Não somos «mundo rico», mas os mais pobres dos pobres porque gradualmente perdemos a dignidade e o sentido do que é essencial para vida. Não basta estar farto de dinheiro e de outros bens materiais para ser rico, é preciso antes conciliar essa riqueza com racionalidade e cultura elevada. Que Deus nos valha a todos!
José Luís Rodrigues
1 comentário:
Esta história tão antiga tem muito que se lhe diga. Re-escrita nos tempos modernos, o rapaz iria em cima do burro pelo desdém que se tem em relação à 3ª idade e não por compadecimento do idoso às pernas jovens. Eu que "adoro" a raça asinina e nutro por ela muita admiração, re-escreveria o história com o burrito às cavalitas do rapaz e do homem...
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