O estado de inveja acontece nas coisas mais corriqueiras da vida. As relações profissionais estão cheias desta realidade. As famílias alimen-tam-se deste sentimento como do pão para a boca. As religiões ou as igrejas também vivem esta miséria com a mesma frequência que pronunciam orações. E dos invejosos digo o mesmo que disse Ambrose Bierce, são uns cobardes. E cobarde para este autor era alguém que, numa situação perigosa, pensa com as pernas.
Os rancores que muitas vezes as pessoas expressam umas contra as outras estão associados à inveja. Se quisermos, os invejosos, são os nossos inimigos. Mas sobre os inimigos Oscar Wilde ensinou que a melhor resposta consiste em perdoar-lhes sempre, porque nada os aborrece tanto.
A inveja não pode ter qualquer base de inteligência porque a inteligência é um dado essencial do ser pessoa e do ser Homem. Porque é muito mais fácil a uma sociedade ou às autoridades lidarem com a inteligência, por mais perversa que ela seja, do que com a estupidez, que é muito mais difícil, pois tudo o que se diga aos estúpidos entra-lhes por um ouvido e sai pelo outro.
Não é fácil de modo nenhum conviver com as diversas situações onde a inveja comande as atitudes das pessoas, porque facilmente tudo se reduz a estupidez e a pior coisa do mundo é ter que aturar estúpidos invejosos.
Na nossa terra existem dois modos de ser gente que se acha no direito de dizer e fazer tudo o que lhes apetece, com o prejuízo que isso implica para os seus semelhantes, que eles não consideram adversários ou os outros que merecem apreço, mas inimigos só porque discordam e são diferentes na idiossincrasia que natureza lhes deu ou não comungam dos mesmos ideais partidários/sociais/religiosos/doutrinários... Trata-se estes dois modos de ser, da cambada de anónimos e alguns eleitos pelo povo, que assumem cargos de relevância ao serviço da causa pública.
Os primeiros sob a capa do anonimato, cobardemente, entendem, que perante esse poder, o boato, a calúnia e tudo o que seja inverdade sobre outrem e sobre as instituições, pode ser dito ou levado à prática, porque a capa negra do anonimato os protege. Esta imunidade advém do ser pusilânime e da falta de coragem. E com isto diz-se tudo o que der na real gana, sob a arma do anonimato, até que o respeito se torna palavra vã e com isso pouco importa que o bom-nome dos adversários se enterre na lama. Tudo o resto são favas contadas. É pena que muita gente faça desta conduta uma forma de vida em sociedade. Nenhuma trela se deve dar a esta gente.
Os segundos são ainda mais preocupantes. Ora do alto dos palanques ora ao discorrer da pena (hoje será melhor dizer do teclado), aclamam o que entendem poder dizer sobre todos, são eleitos, têm o voto do povo assegurado, para lhes garantir tal imunidade. Têm poder. Coisa que a maioria não sabe o que é… Essa condição «divina» dá-lhes autoridade para ofender, chamar nomes ascorosos e classificar indignamente.
Este grupo é o mais repugnante de todos por duas razões: primeiro, porque, simplesmente, deviam honrar o cargo que a eleição lhes conferiu, que deve ser tomado sempre como um serviço para todos, mesmo até para os que se considerou adversários num determinado momento. Segunda razão, tal mandato deve ser exercido com um sentido de missão pelo bem comum, com atenção muito especial por todos os que nessa pessoa tenham votado e também pelos outros que eventualmente tenham votado em sentido contrário. É assim a Democracia.
Então é vê-los diante das coisas da vida qual sabichões de tudo, acusando, analisando e propalando tiradas ao vento mesmo que não tenha base na verdade que viram, sentiram e pensaram… Bastou que alguns lhe «dissessem», «mostrassem» ou «entregassem». Mas, se reclamamos, que vem num contexto, num tempo e com uma razão concreta, isso nada importa, porque se deseja ficar bem, agradar e conseguir intentos pessoais.
Basta aos que nos «dizem» a mesma comunhão de ideias e a mesma cor partidária. Assim, mostram que são os únicos e que, por isso, podem com a sua divina autoridade proclamar as regras morais para os outros.
Estes senhores do sistema instalado, consideram os outros uns mentecaptos, mesmo que pensem, não têm direito a opinar, pensam diferente, por isso, não se faça tarde para chamar-lhes nomes, classificá-los de arrogantes, «donos da verdade», sabichões de coisa nenhuma, etc.Por fim, fica-nos o que ensinou Erasmo, que os parvos sempre acham admirável aquilo que menos entendem. Também sabemos que de parvos nada reza a história do mundo.
Publicado a 13 de Fevereiro de 2011, Diário de Notícias do Funchal, na secção dominical «Sinais dos Tempos».
3 comentários:
A inveja é a principal marca dos portugueses...Infelizmente. É ela que torna o país atávico, pequeno. E quem nos dirge também é pequeno...E nós? Culpados por nada fazer...
É verdade amiga M., pequenos muito pequenos quando este caminho se torna prioritário para levar a vida adiante. Grato pelo contributo.
Era bom que se fizesse um estudo psico-sociológico para se apurar quantas intervenções/decisões/acções são ditadas pela inveja, um sistema que envenena a nossa vida.
Parabéns por mais esta postagem.
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