Andei por aí a observar algumas homilias proferidas
ontem e na maioria reparei que a oração se centrava na tónica da insistência.
Para quem insiste na reza, quanto mais, melhor, está safo, porque há um deus a
encher um depósito do muito palavreado que lá chega e quando atinge a medida,
concede o que lhe pedem. Não embarco nesta ideia.
Não considero Deus um vendedor tipo de um basar
chinês. Um comerciante ou negociante de milagres, curas e soluções para os
problemas que nos compete encontrar.
Por isso, salientei a ideia de que a mensagem de
Jesus era um valente puxão de orelhas a todos nós, que facilmente, fazemos de Deus
um negociador. Uma entidade despenseira de milagres e de soluções para os
problemas da existência, que nos compete resolver com simplicidade, humildade,
justiça e verdade.
A mensagem é clara e pretende passar a ideia de que
Deus é a Verdade Plena, a Suma Bondade, a Beleza incomparável e a Misericórdia Infinita.
Por isso, não precisa de que a oração seja um desenrolar de coisas em cima de coisas,
palavras e mais palavras. Bastam bons propósitos e sérios sentimentos, porque disse
Jesus, «quem pede recebe; quem procura encontra e a quem bate à porta,
abrir-se-á».
Depois da oração do Pai Nosso vieram duas parábolas
bem elucidativas, que pretendem dar uma ideia acerca de Deus como Pai, que não
precisa de insistência nenhuma. A primeira, conta que um amigo recebe em casa
outro amigo que vinha de viagem, estava cansado e com fome. O anfitrião não
tinha nenhuma comida em cada para lhe dar. Pensou bater à porta do vizinho, que
também era seu amigo, para lhe desenrascar um pão. Mas, visto serem altas horas
da noite, não se levantou logo para satisfazer o pedido, barafustou e só depois
de muita insistência veio furibundo à porta dar-lhe o pão, despachando o amigo
com indisposição desmedida. O próprio Jesus interpreta o texto de forma
magistral dizendo que ele não se levantou por ser amigo, mas por causa da insistência.
Só faltou Jesus dizer, com Deus Pai que vos falo e apresento não é nada assim.
Mais adiante, temos então o puxão de orelhas
propriamente dito. A segunda parábola são duas perguntas: «Se um de vós for pai
e um filho lhe pedir peixe, em vez de peixe dar-lhe-á uma serpente? E se lhe
pedir um ovo, dar-lhe-á um escorpião»? E logo de seguida adianta: «Se vós, que
sois maus, sabeis dar coisas boas aos vossos filhos, quanto mais o Pai do Céu
dará o Espírito Santo àqueles que Lho pedem!» - Melhor é impossível!
Tudo tão claro e tão óbvio, que faz pena ouvir e lerem-se
autênticas barbaridades de bispos e padres que sem escrúpulos nenhuns distorcem
o sentido das palavras.
É pena que não se aproveite para esclarecer e fazer
crescer as assembleias litúrgicas, mas se contribua ainda mais para amedrontar
as pessoas diante de uma imagem de um deus irascível, desmedidamente exigente e
depositante de futilidades que se considera oração. Pois, só uma riqueza em nós
bastará: «o Espírito Santo», que pode estar em forma de dons em cada pessoa: a
sabedoria, o entendimento, o conselho, a fortaleza, a ciência, a espiritualidade
e o amor de Deus. Mais palavras para quê…
1 comentário:
Que extraordinária reflexão. No fundo só importa os dons do espírito Santo. Um abraço Pe. José Luís.
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