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terça-feira, 27 de julho de 2010

A crise da Igreja não é uma fatalidade irremediável

Hoje não há um mundo cristão. Não existem sociedades cristãs. Mas um mundo onde há cristãos e sociedades multifacetadas onde estão também os cristãos. Quando o Papa faz apelo à Europa para que reencontre as suas raízes cristãs, o Papa está a fazer apelo à ideia de uma situação sobre a qual em definitivo se voltou a página.
A organização da Igreja, o seu funcionamento, os seus hábitos e a sua maneira de se governar foram moldados numa época em que existia um Ocidente todo cristão. Tomar consciência de que este já não existe é, desde logo, difícil de admitir e tem como consequência a necessidade de repensar a organização, o funcionamento, os hábitos e as maneiras de governar.
Por isso, Como conceber uma Igreja diferente? - Pensar o governo da Igreja, mudar o seu funcionamento, mudar os hábitos, incluindo o governo, e inventar novos equilíbrios não são coisas fáceis de serem acolhidas por todos os cristãos. Muitos não admitem isso e sofrem com a diminuição da influência da Igreja.
Os que entram na Igreja já com idade mais avançada e, aqueles que, tendo sido baptizados, deixaram a Igreja para voltarem mais tarde ou ainda todos aqueles que a melhor coisa que sabem viver é a indiferença face a tudo o que diz respeito à Igreja Institucional, não sentem o vazio de alma, os crentes de origem e de prática são duramente afectados pela crise que a sua Igreja atravessa (aqui lembro um livro extraordinário de Leonardo Boff, sobre o que é a crise: «Crise, Oportunidade de Crescimento» Verus ed.).
No tempo da cristandade, os fiéis viviam um inconsciente colectivo muito forte. Herdaram das gerações anteriores a memória do que a Igreja foi no passado, do que era num país cristão, do lugar da fé numa cultura moldada por ela. Os fiéis limitavam-se a receber e pouco ou nada reflectiam.
Estes cristãos são, hoje, multidões, participam na animação da Igreja, sustentam a imprensa e as edições religiosas, contribuem para a saúde financeira da instituição, mas todos os estudos o provam: estão fortemente desestabilizados num mundo que se tornou não cristão e que, a seu ver, renega as suas origens. A Igreja, porém, custa-lhe entender que os cristãos de hoje não são iguais aos de ontem. Os cristãos são pessoas adultas, pensam pela sua própria cabeça, lêem livros, revistas, jornais e estão conectados via iternet. A sua formação é muito grande. Não se contentam com pouco. São autónomos, livres de escolher e de decidir. Não se contentam com meia dúzia de coisas banais e sem sentido. A Igreja precisa de dar uma volta muito grande. Precisa de discernir e ver bem a realidade que a envolve. A linguagem sobre a esperança tem que ser outra, a mensagem precisa de adaptação ao mundo actual. O respeito pelas pessoas tem que ser grande, para que a Igreja se apresente como uma instância respeitada e autorizada.
O silêncio pensado, estrategicamente vivido não serve a Igreja. Por isso, requer-se uma Igreja amiga, solidária, transparente, misericordiosa e atenta a todas as coisas da vida, sejam boas ou más, favoráveis ou desfavoráveis. Nada deve escapar à sua acção, mas sempre com um profundo respeito pelos homens e mulheres de cada tempo e de cada lugar.
Por outro lado, as reacções dos cristãos são diferentes, variam entre a interrogação e uma profunda perturbação. Primeiro, não compreendem determinadas posições da sua Igreja oficial. Ficam chocados ou revoltados por verem a sua fé reduzida, em exclusivo, a questões morais pelos não crentes (a Igreja é sempre muito mais falada pelas suas posições morais do que por outras questões não menos essenciais para a vida do mundo e das sociedades). Sentem-se ofendidos pela indiferença manifestada pelo mundo actual em relação ao facto religioso. Ficam escandalizados como a Igreja é tratada pelos meios de comunicação social (a Igreja é notícia apenas e quase só quando há misérias). Muitos têm dificuldades em fazer-se entender pelo mundo e pelas mulheres e homens concretos quando pretendem falar daquilo em que acreditam e quase chegam a pensar que existe um complô contra Deus, contra a fé e contra a sua Igreja (frequentemente encontro pais, sobretudo, as mães, angustiadas com as reacções dos seus filhos quando elas lhes falam de Deus e da Igreja).
Há um vazio geral muito preocupante. Por isso, urge reacender a esperança e deixar que o mivimento de São Paulo nos anime na criatividade do anúncio do Evangelho de forma sempre nova e aberta ao mundo de hoje. Não se pode temer o mundo nem muito menos o pensar e o modus vivendi das pessoas da vida actual.

2 comentários:

JORDAS disse...

As crises são épocas de oportunidade para a mudança.
a Igreja tem uma estrutura muito rigída para um mundo demasiado flexível, sempre em mudança.
A igreja precisa estar no mundo, não no púlpito, menos em Roma. A igreja são os homens que todos os dias perguntam se este é o caminho que leva ao Pai.
Reflectir e repensar a organização da Igreja é uma urgência.
Parabéns pelo seu texto visionário.

António Gomes disse...

A Igreja passa por um crise que deveria servir para crescimento e mudança. Lamento que os novos padres que estão a ser ordenados, como os do ultimo sábado, sejam manifestação de uma Igreja que quer voltar ao passado, aos rituais vazios. Fiquei admirado com vestes eclesiaticas, padres de batina porque como diziam assim davam-lhe uma posição social. Meu lamento... Como não perceber os reptos do Frei Bento Domingues e reflectir naquilo que o padre Rafael de Andrade disse ao Tribuna, ao referir-se que temos igrejas vazias e sem cristãos.
Na verdade os jovens e muitos baptizados não se vêem nesta Igreja e neste Bispo que continua a benzer templos de milhões e benção de carrilhão no valor de 70 mil euros, quando há tantas necessidades e respostas que a Igreja da Madeira na dá para dar um novo impulso á renovação que á muitos anos todos os cristãos esperam.
Vale ainda este espaço da net que nos faz reflectir graças a audácia evangélica do padre José Luis. Bem haja.