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segunda-feira, 26 de julho de 2010

A importância dos avós

Aos meus avós
Os meus já morreram. Não sinto infelicidade por isso. É a lei da vida.
Porque conheci os meus quatro avós, sinto uma felicidade muito grande por isso. O tempo que Deus concedeu para eu viver com eles foi suficiente para aprender e saborear o melhor do mundo.
O avô materno foi o primeiro a partir do mundo dos vivos. Vi a sua morte.
Nunca mais esquecerei aquele tombo fatal de costas, fulminado por um ataque cardíaco sem piedade.
Ainda eu criança anunciei a minha mãe essa ruptura impiedosa. Alto e bom som do lugar da morte proclamei para quem quis ouvir, o avô morreu. As crianças são assim, não sabem dos rodeios, só a verdade sempre. Não me lembro das consequências de tal anúncio.
Ficou dele a sua amizade a partir deste episódio. Os meus tios ofereceram-me um casal de coelhos. Passado pouco tempo um coelho morreu, talvez seja a primeira perda da minha vida.
Regressei ao lugar de origem dos coelhos, obviamente, que meus tios não quiseram repor a parelha, mas que culpa tinha eu que um deles tivesse morrido. Chorei amargamente durante horas, este avô, bondosamente, secou as lágrimas e ofereceu amavelmente o coelho que me faltava. Como lhe sou grato por este gesto. E se tal não tivesse acontecido como sarar a ferida de uma perda a uma criança? – Só ele nessa hora percebeu, sem o saber tecnicamente, do meu drama e quanto seria importante para mim ter dois coelhos e não apenas um. O coelho solitário deve ter sido eternamente grato pela minha luta.
A minha avó materna também me marcou profundamente.
Guardo dela a sua paciência, a sua bondade e tenacidade no sofrimento.
Coisas do antigamente, dirão, mas valores importantes para levar adiante a marcha da dureza da vida, que se abatia duramente sem acepção de pessoas. Esta avó cravou-se abundantemente de cravos amargos no ardiloso feito da criação. Esse testemunho ficou para sempre na memória deste neto.
Dos avós paternos ficaram ainda mais recordações. A sua tez enrugada enformam uma silhueta de beleza velha, mas esplendorosa de uma luz indescritível, quase inefável para quem saboreia uma coisa boa, mas não sabe dizer com palavras. E que importa isso. Para mim nada.
A avó sabia muito da vida. A ruralidade foi a sua escola, a universidade. E não era preciso mais para ser feliz. Não gostava do seu nome, Silvina, não temia a morte, frequentemente nos dizia, «não pedi para nascer, também não peço para morrer». Assim foi, sem pedir morreu serenamente sem nunca abdicar do seu copito de Genebra. Uma bebida que não era, a meu ver, nem licor nem aguardente, dizia que lhe fazia bem à barriga. Que mal tinha isso se lhe dava algum prazer tomar um copito do que gostava. Outro aspecto desta avó, prende-se com o prazer do leite de cabra. Pela manhã lá ia a avó ao curral apertar os tetos das cabras para sair esse néctar natural e quentinho para dentro do caneco. Finda essa azafama o caneco era posto à boca e ela bebia o leitinho todo até ao último pingo. Este viver regrado e sob o sabor da natureza deu-lhe durabilidade e muita saúde para viver neste mundo 80 e tantos anos.
O meu avô paterno foi o meu primeiro mestre. O maior pedagogo. O melhor professor.
Deste avô vi as suas multifacetadas habilidades. O cavador exímio. O capador (castrador) dos animais machos (cabritos e porcos), era solicitado pela freguesia inteira e fora dela. Outra habilidade curiosa deste avô era tirar dentes, quase se pode dizer que o dentista da zona, a ele acorria pessoas de todos os lados. Por isso, chamavam-lhe o «tira dentes». O enxertador de árvores como ninguém, nenhum enxerto às suas mãos recusava não «pegar» (rebentar, dar refilo). Falta ainda referir que era também barbeiro e cortador de cabelos.
Ora como se vê, estamos perante o homem dos sete ofícios. Enquanto a sua vista alcançou e as pernas ajudaram sempre esteve disponível para realizar os seus préstimos sem qualquer sombra de mercantilismo. Homem justo. Amigo de todos sem excepção. Solícito para que a qualquer hora do dia ou da noite acorrer aos pedidos que lhe era feitos.
Como é bom guardar em memória esta riqueza do nosso passado. É a nossa primeira escola. O berço onde se tomou o leito da vida como alicerce para o futuro que se está fazendo até aquela hora do encontro feliz da vida eterna. E são eles que desejo em primeiro lugar encontrar para o grande abraço de gratidão pelo amor que me deram enquanto foi possível aqui comungar do seu convívio. Obrigado avós.

3 comentários:

M Teresa Góis disse...

Feliz do neto que teve esta escola da vida, este despertar para o pequeno gesto do quotidiano, com mestria e sensibilidade, sempre renovado e sempre diferente. Feliz dos Avós que tiveram "um aluno" observador e aplicado, orgulhoso das suas raízes. É nesse torno das raízes que se gera a personalidade adulta. Uma infância feliz, cheia de pequenas coisas apesar das dificuldades, dão o calo do "desenrasca", da coragem, da frontalidade e o apego e respeito à Natureza.Na remota possibilidade de ser avô, não deixará de atender aos "netos postiços" que a vida lhe deparar.

Porque morrem as palavras? disse...

Fiquei feliz pelo que aqui li.Há já algum tempo que escrevi sobre os meus avós.
Aqui pude rever também que afinal não eram tão diferentes dos do Reverendissimo padre.
Deles tenho uma imagem muito positiva e devo-lhes muito do que sou.
Lamento que as crianças e jovens ddo nosso tempo estejam tão afastados dos avós.
Quanta sabedoria se tem perdido?!...

Unknown disse...

Olá Pe.gostaria de lhe dar os parabens pelo seu blog, realmente muito interessante a maneira como o senhor aborda os temas, gostei muito e achei interessante aquele que o senhor falava à respeito dp Cristiano Ronaldo.
Desde já obrigada por me seguir no meu blog:formandoeinformandocatolicos( A FÉ EXPLICADA ), DEUS o abençoe nessa caminhada que sabemos que é tão ardua, mas tão gratificante!! Salve Maria!