Bertrand Russel
escreveu: «a teoria da verdade deve ser tal que admita o seu contrário, a falsidade». Por conseguinte, poderemos afirmar que
depois de se retirar todas as inverdades, o que resta poderá ser verdade. Eu
convivo com isto, embora algumas vezes, pareça que vou vacilar.
Havia um princípio antigo nas casernas dos exércitos
que nunca se devia duvidar das verdades ditas pelas autoridades, eles é que
sabem e estão sempre bem informados. Quem está para baixo não sabia de nada.
Deve ter vindo então a regra da submissão geral dos
povos, obedecer sempre às nossas autoridades superiores, porque eles estão sobejamente informados, e no caso das chefias religiosas, estão mais perto
do céu e por isso a sua voz é escutada mais depressa por Deus. Não sei se tem funcionado
em todas as situações. Não quero saber se tem havido falhas de comunicação
quanto a isso.
Vem este intróito a propósito da celeuma que anda no ar por causa do tratamento que o mundo masculinizado dá à condição e ao papel das mulheres na vida familiar e social. Certo é que a subordinação das mulheres em relação aos homens continua.
No 26 de Agosto, é celebrado o Dia Internacional da Igualdade Feminina. Tendo em conta este pretexto sou levado a pensar que há muito para pedir perdão às mulheres.
Perdão
por anos e anos de machismo pretensamente auto suficiente, porque na hora da
verdade, são elas que salvam os homens.
Perdão
pela manutenção de uma linguagem contra as mulheres profundamente ofensiva e
humilhante. E quando assim é, eu não considero que isso esteja sob a contemplação
da liberdade de expressão, por isso, devemos deixar andar.
Perdão
por ainda existirem muitas mulheres que se calam e vivem subjugadas
pacificamente diante das ditaduras dos (seus) homens. E que consideram irrelevante e
inglória esta luta pela igualdade.
Perdão
pelo não reconhecimento de que determinado vocabulário é anacrónico e, como
alguns dizem, ser lesivo dos Direitos Humanos Universais. Fazer tudo para
contornar isso e enfeitar com palavreado ao abrigo de metáforas abusivas, é
ofensivo contra as mulheres.
Perdão
pela comparação absurda entre os versículos bíblicos com os versos dos Lusíadas
de Luiz Vaz de Camões. A Bíblia, é um livro vivo que reúne vida passada para
iluminar a vida presente. Não pode ser comparada com um poema épico determinado
por um momento histórico irrepetível, que deve ser apreendido tal como é e
aconteceu. A Bíblia tem outra função, nunca pode ser letra morta, mas realidade
viva, que se faz carne em cada tempo e em cada contexto histórico. Se assim não
for não pode converter-se em alimento espiritual e litúrgico para a vida
concreta de cada tempo.
Perdão
por se fazer da Bíblia um livro estático, inalterável perante a existência que
se altera todos os dias. As religiões têm este pecado terrível para confessar.
Perdão
pelo menosprezo e desprezo pelas mulheres dentro de instituições que deviam ser
exemplares quanto à prática da igualdade de oportunidades para homens e
mulheres em igualdade de circunstâncias.
Perdão
por causa da (nossa) hierarquia da Igreja Católica ser tão benévola e promotora
dos «feminismos masculinos», mas tão dura com as características idiossincráticas
das mulheres.
Perdão
por uma instituição, como a nossa Igreja Católica, que bebeu do Evangelho sete
Sacramentos, mas só seis deles é que podem ser concedidos às mulheres, o
Sacramento da Ordem, que é só para homens machos.
Perdão
por se fundamentar esta discriminação e outras que por aí ainda andam, na
Bíblia Sagrada e, particularmente, no Evangelho de Cristo, onde Ele se revela o
Mestre por excelência na prática da inclusão.
Perdão
por continuarmos teimosamente com um Evangelho coisa do passado, pois só faz sentido
crer, na «Palavra de Deus», quando ela é viva e eficaz na realidade concreta de
todos os tempos.
Perdão
por estarem reduzidas as mulheres na nossa Igreja Católica a simples serviçais
de homens que se dizem «chamados» por Deus, que se gabam de serem seus
representantes, quando Dele irradia a igualdade, a fraternidade, a misericórdia e o perdão incondicional.
Perdão
pela «loucura» de uma hierarquia misógina, que não olha a meios nem mede as
palavras para manter uma rede de benefícios e privilégios à conta do insulto do
vocabulário que considera ser letra morta, só porque dá jeito. Péssimo
contributo a autores fundamentais da Bíblia e à doutrina que devia ser sempre dinâmica,
viva e eficaz como ensinamento, referência ética e valor incontornável na busca
do sentido da existência.
Perdão
por este estado de coisas graves nos tempos que correm, onde o populismo, o «talibanismo» se impõem sob o domínio das armas para serem utilizadas contra as
mulheres e as crianças, o elo mais fraco nas sociedades patriarcalistas, onde o
machismo zarolho em que vivemos encontra caminho livre para vingar.
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