Semana Santa 2017
- Esta semana com a minha querida amiga Teresa Góis. Um texto muito seu, íntimo, mas forte e vivido no que diz respeito à sua interioridade, esse lugar sem lugar onde Deus está... Obrigado cara amiga pelo seu testemunho e pela sua disponibilidade para esta partilha tão rica.
Tocaste-me sem eu saber.
Um colo quente, acolhedor me levou a Ti
com 53 dias de vida e eu não me lembro de nada. Do Jordão para os rituais
criados pelo homem, ungiram-me, deram-me sal e deitaram água sobre a cabeça. Se
chorei não sei; já não tenho a quem fazer a pergunta pois as minhas irmãs eram
demasiado pequenas para se lembrarem e, à volta, outras coisas as entretinham.
Se chorei foi o meu primeiro grito público
de reclamação.
Depois fui pela vida sempre orientada, sem
grandes questões porque era a idade de tudo aceitar e ser feliz.
Cresci. Escolhi e esqueci porque outras
responsabilidades e novidades me abordavam.
Puseste sempre no meu caminho quem muito
bem Te apeteceu sem primeiro me consultares. Agradeço a quantidade de pessoas
e, as que conservei e conservo, são de qualidade.
Estou junto ao mar. Na minha frente a
linha recta do horizonte onde não escreves pois só usas as linhas tortas na tua
grafia. Também por isso me sinto escolhida.
Junto ao mar vejo-Te no enrolar da onda
azul que morre em salpicos brancos, vejo-Te no planar da gaivota como se fosses
um drone do Pai. Vejo-Te ainda na face de desespero da multidão que clama num
idioma que não conheço, adultos e crianças, enlameados, famintos, sem dignidade
e sem esperança... Onde andas?
Quantas vezes Te ignoro e quantas vezes Te
agradeço no sol pintado de fresco na manhã luminosa, no quadro da minha janela!
Quantas vezes grito que ignoras
sofrimentos, angústias, ausências … Contudo sei que estás presente, na Tua face
materna feita de Amor e em que a tolerância é matéria-prima.
Sabes o barro que sou, cheio de mazelas,
descascado, incolor, mas se o sabes, sabes também o que resta.
Penso que és um Deus justo e divertido que
olha para a criatividade humana que usa o Teu nome para acontecimentos
milagreiros com indulgência quase plenária.
Aceita-me como sou!
És um Deus invasivo sim, mas não um Deus
invasor.
Maria Teresa Santos Tavares Góis
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