Por Eduardo Hoonaert *
A morte de Michael Jackson deixa na cabeça de muitos um monte de questionamentos. Alguns dizem que ele procurou branquear a pele por não aceitar sua condição de negro; outros dizem que ele era pedófilo; outros ainda criticam sua falta absoluta de senso administrativo ao deixar milhões de dólares em dívidas e ainda há quem pretenda que ele seja a expressão evidente da futilidade midiática.
Não nos enganemos: Michael não é um ingênuo doente e complexado. Ele tem a lucidez de por a nu o mundo como é: cruel, preconceituoso, prepotente, ignorante, mesquinho, sem piedade, sem sensibilidade pelo mais fraco. Numa se suas músicas, intitulada ‘Black and White’ (negro e branco), ele se mostra enjoado com a linha divisória que a sociedade marca entre as cores da pele. Aí ele canta: ‘Se você é meu irmão, não importa que seja negro ou branco’ (It don’t matter if you’re black or white). Mas logo acrescenta: ‘Isso não é fácil’. Querendo ultrapassar, num louco gesto de manipulação dermatológica, a barreira entre Black and White, ele ao mesmo tempo dá um soco na cara da sociedade e prejudica irremediavelmente sua saúde. No final da vida se afunda na tristeza. Sua vida demonstra a distância entre a indignação e a impotência dos gestos, por geniais que sejam. Michael sofreu as dores do mundo e seu sofrimento é nosso sofrimento.
De outro lado, sua passagem entre nós lembra que somos maiores do que somos, que podemos transcender a figura humana da mesquinhez e abraçar o mundo inteiro, partir com Dom Quixote à procura da justiça perdida e da misericórdia que não se encontra em canto nenhum, não fazer o que se espera de nós e fazer o que de nós não se espera. Gozar da vida em liberdade, sem pretender segurar nada. Escapar da confusão entre usar e possuir que faz com que não consigamos o que queremos, combater moinhos de vento não como quem faz algo estúpido, mas como quem demonstra que o mundo é um gira-gira e roda-roda de palavras que não levam a nada. A figura dramática e contraditória de Michael desperta em nós o que temos de melhor: a capacidade de sonhar com um mundo diferente. Só que esse mundo não tem de ser necessariamente um ‘neverland’ (terra do nunca) ou um ‘dreamland’ (terra do sonho: nome da propriedade de Elvis Presley), mas sim um ‘reino de Deus’, na labuta diária, segundo o sonho insuperado de Jesus de Nazaré.
* Historiador
Nota da Redação do blog: Com a devida vénia ao autor deste texto maravilhoso. Que façam bom proveito todos os que tiverem a graça de o lerem. Não está na íntegra, cortei alguns parágrafos e publico os que considero mais significativos. Quem desejar o texto todo pode ir ao seguinte endereço: http://www.adital.com.br/.
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