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sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Emmanuel Levinas e a noção de "Rosto"

Filosofia
Nota: Quanto nos pode revelar um rosto...
Emmanuel Levinas nasceu em 1906 na Lituânia, no seio de uma família judaica, tendo-se naturalizado francês. É pois conhecido como um filósofo francês, cuja cultura adotou e representou, tendo falecido em Paris, em 1995.
Foi muito influenciado pela cultura russa, tendo assistido à revolução de outubro de 1917, pelo pensamento de Edmund Husserl, sobre quem escreveu a sua tese de doutoramento, e pela religiosidade judaica, herdada do berço materno e mantida durante toda a vida. Foi feito prisioneiro pelos alemães na II Guerra Mundial, e após a sua libertação viria a lecionar na Escola Normal Israelita Oriental de Paris, e em várias universidades francesas, entre as quais a Sorbonne. Durante esse período terá escrito a maior parte das suas obras, entre as quais, provavelmente, a mais significativa, Totalidade e Infinito (1961).
Apesar da marcada influência da cultura e religiosidade judaica o pensamento de Lévinas tem inúmeras articulações com o cristianismo. E talvez a mais saliente se condense na noção de rosto, por ele inaugurada, qual eixo e matriz do seu pensamento.
Aqui Rosto humano não é entendido no seu sentido plástico, estético ou psicológico, mas é rosto enquanto marcado pelos traços do sofrimento e da indigência: “Rosto do estrangeiro, da viúva e do órfão, rosto que não posso reconhecer senão pelo dom e pela negativa; sou livre para dar e negar. (…) As coisas não são como pensa Heidegger, o fundamento do lugar, a quinta-essência de todas as relações que constituem a nossa presença no mundo (…) O facto decisivo é a relação do eu com o outro; aqui as coisas não se manifestam como aquilo que é construído, mas aquilo que e dado”, escreve ele em Totalidade e Infinito.
O rosto introduz-nos ao sofrimento do outro: a fome, a pobreza, o frio, a humilhação e a violência sofrida constituem a retórica do rosto, a introdução do rosto no universo dos valores. Neste caso não os valores triunfantes, auto-justificativos ou narcísicos, mas os valores que se revelam no lado oprimido da vida. Estamos pois perante um pensamento que encontra no outro o seu centro de gravidade, e de uma forma bem próxima da que encontramos nas Bem-Aventuranças. Ou mais genericamente na Boa Nova anunciada por Jesus Cristo.
Mais um pensador que não sendo confessionalmente católico, não deixa de nos inspirar através das suas profundas intuições, e do seu pensamento que atravessou grande parte do século vinte.
José Acácio Castro
Universidade Católica Portuguesa
In Voz Portucalense, 10.11.2010

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