Antes de qualquer reflexão, vejamos um cartão e uma surpresa: «Um jovem universitário viajava no mesmo banco de transporte com um venerável ancião que ia a rezar o seu rosário. O jovem atreveu-se a dizer-lhe: “Por que é que, em vez de rezar o rosário, não se dedica a aprender e instruir-se um pouco mais? Eu posso enviar-lhe um livro para que se instrua”.
O ancião disse-lhe: “Agradecer-lhe-ia que me enviasse o livro para esta
direcção, e entregou-lhe o seu cartão. No cartão, lia-se: Luís Pasteur,
instituto de Ciências de Paris. O universitário ficou envergonhado. Tinha
pretendido dar conselhos ao mais famoso sábio do seu tempo, o inventor das
vacinas, estimado em todo o mundo e devoto do rosário”.
A fé não é para nos instalar e acomodar no que fazemos e no que somos. Somos
fruto do ambiente e a história pessoal de cada um tem muito que ver com as
influências que o ambiente onde nasceu proporciona. Ora, vejamos a história que
nos conta António Alçada Baptista, no seu livro, «A Cor dos Dias». Diz assim o
autor: «Uma mulher na Guiné, ao ir buscar lenha, deixou o seu bebé no chão, à
entrada da floresta, e o pequenino desapareceu. Passados, quatro anos, um
caçador viu um rapazinho no meio de um bando de macacos. Organizou-se uma
batida e o menino foi apanhado. Mas aí é que foi o pior. A criança ficou
entregue aos cuidados da instituição que aquele senhor dirigia. Não conseguiram
adaptá-lo minimamente aos costumes humanos. Para comer, tinham que lhe atar uma
corda à perna e levá-lo à floresta. Não conseguiram que ele falasse e, passados
dois anos, morreu».
Esta história ilustra bem a afirmação de como cada um de nós é fruto do
ambiente e das circunstâncias onde nasceu e cresceu. São, no fundo, os outros
que nos fazem. As influências externas a nós são muito importantes para a
constituição da nossa idiossincrasia. Nada somos sem o mundo à nossa volta. Não
é possível imaginar uma vida sem os outros, sem amor aos outros e muito menos
sem o amor que os outros tenham por nós. Ao contrário desta realidade, é a
solidão e o abandono, que ditarão o drama mais cruel que uma pessoa pode
enfrentar. A vida não é sem a relação com os outros. E consequentemente a fé
também não se concebe sem esta abertura aos outros.
Se a nossa existência não é sem a dimensão social, o que seria sem
aquilo que Deus nos deu, isto é, a nossa inteligência, as nossas qualidades e
capacidades? – Somos o ambiente mais tudo aquilo que a criação nos presenteou.
Tudo deve convergir para a formação de uma identidade própria, individual que
deve ser valorizada e plenamente integrada no modo de ser de cada pessoa.
O antigo Bispo do Porto, D. António Ferreira Gomes dizia: «Somos como o
canhão, recuamos para que o projétil vá ainda mais longe». Esta necessidade de
parar e de fazer silêncio, é muito importante para pensar a vida e tudo o que
ela implica para a o bem do mundo. Muitas vezes o ficar quieto e o estar calado
não significam, de modo nenhum, subserviência ou passividade, comodismo e
instalação perante as coisas que passam, mas significa procura lúcida de um bem
próprio para melhor servir a vida e o mundo, até à descoberta do caminho da fé
para se engrandecer perante a realidade toda que Deus nos desvela diante das
errâncias da nossa história.
A paixão pela vida, pelo que sou e pelo que posso dar, obriga-me a olhar
a própria história com amor e compaixão para depois me relançar outra vez sobre
o que sou. Olhar a própria história, é a possibilidade de reconciliar-se
consigo mesmo, harmonizar o espaço, organizar-se, criar espaço para poder
funcionar e relançar-se outra vez sobre as coisas da vida.
É preciso valorizar e acolher com amor aquilo que somos e temos dentro
de nós. Não há outra história da salvação de Deus à margem da nossa história
pessoal. A história da salvação é a história da humanidade. Estar contra esta
forma de pensar a acção de Deus é violar o projecto de salvação de Deus para o
mundo e para a humanidade toda.
Agora peço-vos um pequeno exercício de adaptação. Reparemos na frase de Martin Buber: «Deus não me pedirá contas de não ter sido Francisco de Assis ou mesmo Jesus Cristo. Deus vai pedir-me contas de eu não ter sido completa e intensamente Martin Buber» (peço a cada leitor que faça o exercício de colocar no lugar do nome do pensador o seu próprio nome). A fé em Deus não é uma poltrona onde nos acomodamos no quentinho da insensibilidade nem muito menos a instalação nas seguranças todas da inconsciência, antes deve ser a descoberta da força e coragem para enfrentar todos os desafios deste mundo.
Agora peço-vos um pequeno exercício de adaptação. Reparemos na frase de Martin Buber: «Deus não me pedirá contas de não ter sido Francisco de Assis ou mesmo Jesus Cristo. Deus vai pedir-me contas de eu não ter sido completa e intensamente Martin Buber» (peço a cada leitor que faça o exercício de colocar no lugar do nome do pensador o seu próprio nome). A fé em Deus não é uma poltrona onde nos acomodamos no quentinho da insensibilidade nem muito menos a instalação nas seguranças todas da inconsciência, antes deve ser a descoberta da força e coragem para enfrentar todos os desafios deste mundo.
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