O que a fé não é (9)
A fé não é para dar resposta a todas as
perguntas
Ainda bem que se
descobre que a fé não pode servir para dar respostas a todas as perguntas.
Todas as perguntas são legítimas e a fé que não pergunta, está muito pobre do
transcendente, de Deus. Porque a procura inquieta é uma força da alma
impulsionada pela fé. Por isso ensinou São Paulo: «Não olhamos para as coisas
visíveis, mas para as invisíveis, porque as visíveis são passageiras, ao passo
que as invisíveis são eternas» (2Cor 4,18). Para
chegar a esta meta, precisamos de procurar sempre.
Sempre o
que importa mais é compreender a fé como uma realidade interior, misteriosa que
vem de Deus, não tanto para dar respostas, mas antes, para suscitar dúvidas,
perguntas e inquietações diante do presente e sobre o futuro. Esta condição é
aquela que acompanha mais permanentemente o ser humano.
Mas, nenhuma pergunta pode chegar a uma resposta absoluta, mas sempre
reservar-se ao Mistério e nessa condição contemplar o Mistério que envolve a
condição da vida toda, porque nunca se pode chegar àquilo que Dostoievski
escreveu no romance Os Irmãos Karamázov: «Se Deus não existe, tudo é
permitido». Mas, apesar disso, não faz mal dizer-se, «eu não tenho respostas, o
que tenho é fé». Não podemos encontrar nada mais característico na vida guiada
pela fé.
Para todas as
perguntas, emerge uma «única» resposta na boca de Jesus quando diz no Evangelho:
«Se alguém quiser vir comigo, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me».
Nada é mais inquietante do que este querer de Jesus. Nem sempre é fácil abdicar
do que temos, do que somos, do que pensamos e do que queremos, mas não há outro
caminho para que a vida seja útil para nós e para os outros. Quando tal
dificuldade não é ultrapassada emerge em força o egoísmo, que é a pior das
tragédias no coração de uma pessoa.
São João Damasceno
(675-749), monge, teólogo, doutor da Igreja, diz o seguinte: «Hoje é o abismo
da luz inacessível… As coisas humanas tornam-se as de Deus, e as coisas
divinas, as do homem». Sabe bem entendermos que Deus, hoje, se manifesta a cada
um de nós, para oferecer o que é «Seu» a «nós» e tudo o que é de «nós» passar a
ser «Seu». Nesta correlação confirmamos em absoluto a nossa divindade e
descobrimos a resposta às questões existenciais, de onde viemos? E para onde
vamos? - Resposta: «feitos à imagem e semelhança…» e peregrinos da sublime
transfiguração divina. É de Santo Ireneu que sabemos, em Jesus Cristo
divinizamo-nos e a Glória de Deus é o Homem vivo. Não há maior fortuna do que
esta.
Mais ainda, «vigiai,
pois, porque não sabeis o dia nem a hora» (Jesus no em São Mateus). E «Quem
procura a verdade procura Deus, ainda que não o saiba», oferece-nos Edith Stein.
Nestes pensamentos encontramos um apelo e uma convicção, ninguém está fora de
Deus. É desta universalidade divina que precisa o mundo de hoje. Somos
convidados a estar vigilantes, atentos perante os desafios da vida e na
mentira fazer valer a verdade, na injustiça a justiça, no ódio o amor, no
egoísmo a partilha, na inimizade a amizade, na violência a paz, na
incompreensão a compreensão e em tudo o que seja sisudez um sorriso, mesmo que
a hora seja a mais perturbadora de todas e o oceano de perguntas seja infinito.
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