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terça-feira, 7 de abril de 2015

O morreu o jornalista da pena cirúrgica

O nosso estimado amigo Tolentino Nóbrega fez «a curva da estrada, deixou de ser visto» (Fernando Pessoa). Deixou esta passada noite o mundo dos vivos. Entrou no lugar da eternidade. Estou seguro que, agora, está livre de todo o sofrimento e vive a «vida verdadeira» (São Paulo).
O pior para todos nós, é que perdemos o jornalista cirúrgico, do trabalho aturado, minucioso no que diz respeito às contas das diversas medidas do Governo Regional da Madeira. Foi por ele, no trabalho excelente nas páginas do público que fomos lendo e vendo os desmandos de muitos orçamentos regionais que nos conduziram à dupla austeridade. Muitas vezes se lamentava da preguiça de muitos políticos que não se davam ao trabalho de lerem os números que as suas notícias apresentavam, para darem mais consistência e acutilância ao que diziam na Assembleia regional. Vai fazer-me falta os seus diálogos e a sua inteligência para reparar com sabedoria aspetos que só o jornalista experimentado era capaz de reparar. São infindos os detalhes que a sua capacidade observadora foi descortinando para nós.
Para mim e para todos os que tiveram a gentileza de adquirir o livro, deixou-nos este presente, o Prefácio ao meu livro «O que a fé não deve ser». Dada a relevância do momento, que nos restem as palavras para expressar o sentimento de perda que nos assiste. A toda a família enlutada manifesto os meus sentidos pêsames e faço votos que a coragem e a esperança sejam muito fortes nos seus corações.
Prefácio
Na comemoração dos 50 anos do Concílio Vaticano II, o papa Bento XVI convidou toda a Igreja a celebrar o Ano da Fé. Foi um apelo à mobilização de todos ao aprofundamento nas riquezas proporcionadas pelo Concílio para a vivência da fé na actualidade, fruto de seu empenho para responder às inquietações e aos desafios dos novos tempos e tornar a Igreja e sua doutrina compreensíveis e significativas para o presente e para o futuro.
Ao ser eleito Papa, a 13 de Março de 2013,o cardeal Jorge Mario Bergoglio - ­­que significaficamente escolheu o nome de Francisco num sinal da linha que deseja para a Igreja sob o seu pontificado, “uma Igreja pobre e para os pobres” - elogiou o trabalho realizado pelo seu antecessor , do qual disse sentir “uma grande gratidão e afecto”. Lembrou que foi Bento XVI “quem revigorou a Igreja com sua fé, seus conhecimentos e sua humildade”, acrescentando que “todos nós vamos tentar responder com fé para levar Jesus Cristo à humanidade e para trazer a humanidade a regressar a Cristo, à Igreja”.
Durante o seu ministério como arcebispo de Buenos Aires e primaz da Argentina, Bergoglio foi muitas vezes a voz da Igreja nesse país, em defesa da vida e da família, em questões sociais, e, neste último período, levou a cabo um intenso trabalho de nova evangelização e para implementar as directrizes para o Ano da Fé. Homem muito espiritual e próximo, muito querido no seu país, Bergoglio pediu aos argentinos que "não se acostumassem com a pobreza" e que "saíssem às ruas" em defesa da família. Em Setembro do ano passado, repreendeu os sacerdotes que se negam a baptizar os filhos de mães solteiras, chamando-os de "os hipócritas de hoje que clericalizaram a Igreja. Os que afastam o povo de Deus da salvação".
Hoje, na segunda década do século XXI em que a tecnologia e o economicismo neo-liberal aparecem como a solução para todos os problemas, faz ainda sentido falar-se de fé, a força de acreditar na humanidade, face à crescente frustração das pessoas com muitas promessas da modernidade que não se realizaram. A redenção que assim se ofereceria a todos continua limitada a uma pequena parcela da população mundial, enquanto, por outro lado persistem as ocorrências de intolerância, despotismo, discriminação e exclusão social, com enormes contingentes de trabalhadores a padecerem terrível exploração e miséria, embora sejam os produtores das mais avançadas tecnologias. São perceptíveis as manifestações de vazio existencial e de carência de transcendência.
O Vaticano II empreendeu grande esforço para tornar a fé compreensível para o indivíduo da modernidade e tornar a Igreja e suas estruturas mais aptas a dialogar com este mundo em transformação e ajudar as pessoas a combaterem as desigualdades. Apesar de ímpetos de modernidade negarem em grande parte a religião, a fé, a transcendência e, sobretudo, certas expressões religiosas que para o mundo hodierno serem  incompreensíveis ou injustificáveis, a busca de sentido para a vida leva-nos a ultrapassar a barreira da  ilusão do consumismo, do poder, do prazer, da fama e do materialismo. Mesmo para o crescente número dos que se declaram sem religião ou vivem a fé a seu modo, ou para muitos cristãos que perderam ou acham que perderam a fé, por terem uma concepção equivocada dela ou a vivenciarem de maneira imatura.
Na solenidade da Epifania do Senhor, a 6 de Janeio de 2013, Bento XVI declarava: “A fé atrai-nos para dentro de um estado em que somos arrebatados pela inquietação de Deus e faz de nós peregrinos que estão interiormente a caminho para o verdadeiro Rei do mundo e para a sua promessa de justiça, de verdade e de amor. Nesta peregrinação, o Bispo deve ir à frente, deve ser aquele que indica aos homens a estrada para a fé, a esperança e o amor”.
Caminheiro e guia dessa “estrada para a fé, a esperança e o amor”, o padre José Luís Rodrigues reúne neste livro um valioso conjunto de profundas reflexões sobre a fé, como legado do Vaticano II, face à inquietação dos nossos dias. Partilhados no seu blogue “O Banquete da Palavra” (www.jlrodrigues.blogspot.com), estes textos mostram que a fé não é uma ideologia ou guarda-chuva, um contrato ou um escape, uma muleta ou uma cegueira, é uma vivência interior que “desafia para a coragem e para a força com que enfrentamos os males desta vida, sem alienação, mas com esperança”, E conclui que “a fé é ou pode ser o coração de cada pessoa que se abre ao Mistério de Deus e da humanidade”. Que promove o Amor, a Paz e a Justiça, ou seja, a mensagem de Cristo.
Tolentino de Nóbrega
jornalista do PÚBLICO

2 comentários:

José Ângelo Gonçalves de Paulos disse...

Padre José Luís Rodrigues, Amigo e Irmão, esse Prefácio ao seu livro feito pelo Tolentino Nóbrega é perene. Nunca a traça do tempo e espaço lhe apaga a Memória. Ele está no nosso coração. A sua presença nos nossos convívios será indelével. Jamais o esqueceremos. Falta-nos tomar um copo em seu memória-agradecimento pelo testemunho, coragem com que todos os dias nos presenteava com os seus históricos artigos no "Público". Que DEUS o de JESUS o recompense.

José Luís Rodrigues disse...

Essencial este seu comentário amigo Ângelo. Obrigado e um forte abraço.