Publicidade

Convite a quem nos visita

terça-feira, 4 de junho de 2013

Quando a humanidade se torna predadora de si mesmo

 «A Vida é Bela», é um filme de Roberto Benigni. É belo, divertido e comovente. Lembrei-me deste filme por causa do panorama avassalador de terrorismo, traduzido em assaltos por todo o lado, destruição de bens pessoais entre outras desgraças que vão dando razões mais que suficientes para a insegurança e medo à nossa volta. Se começarem a rebentar bombas, lá se vai o resto do turismo. Esperemos que o juízo não desapareça por completo.
Voltando ao filme. O pano de fundo do enredo é a Toscana, Guido (Roberto Benigni) vive em Arezzo, sonha ter uma livraria e está apaixonado pela professora da escola local, Dora (Nicoletta Braschi). É neste ambiente que Guido, Dora e o amigo poeta Ferrucio (Sergio Bustric) vivem a chegada do fascismo e o anti-semitismo. O casal tem um filho, Giouse (Giorgio Cantarini). Todos pressentem o perigo iminente. Em solteira Dora tinha tido um noivo que pertencia ao exército fascista e que nunca perdoou a Guido o facto de ter casado com ela.
A subida ao poder de Mussolini, a condição de judeu de Guido e o encerramento da sua livraria proporcionaram a ocasião para a vingança. Guido e o seu filho são enviados para um campo de concentração. Dora, incapaz de se separar deles segue-os e partilha o mesmo destino. Chegados ao campo, Guido empenha-se em fazer crer ao seu filho - totalmente inocente face ao que se passa à sua volta - de que na realidade estão numa espécie de feira popular, onde tudo é um jogo.
Estamos perante um filme que é um hino à liberdade e à entrega total pelo bem dos outros. Tudo se passa como se fosse um jogo com regras e divertimentos aparentes como se a realidade fosse uma aparência constante. Mas quando o amor prevalece sobre tudo, qualquer preço para salvar a vida dos semelhantes é sempre pouco.  
O riso, não se contém perante a obsessiva imaginação deste pai e pode funcionar como antídoto para combater o horror.
A beleza da vida está em ser capaz de encarar as adversidades como um jogo. Um jogo que reforça o sonho, a liberdade e a esperança. Aí radica a fé como força interior que move o amor pelos outros como razão última da vida apesar do sofrimento e da morte. É óbvio que faz sentido proteger desesperadamente contra tudo e contra todos a sobrevivência daqueles que nos são próximos e os outros. A imaginação pode ser um caminho eficaz, porque ajuda a sobreviver a tudo e pode, sobretudo, combater o medo.
Os horrores do homem contra o homem são sempre a revolta do homem contra si mesmo. A incapacidade para reconhecer as suas limitações produz um ser todo-poderoso sem princípios e sem valores. - Não será isto mesmo que está hoje a fazer de forma subtil o empobrecimento das pessoas, a condenação ao desemprego, a desgraça da ociosidade e a tragédia da austeridade profundamente injusta?
Qualquer totalitarismo reduz o homem a um predador de si mesmo. A ilusão de um homem todo-poderoso que não obedece à lei moral ou à consciência de si mesmo diante dos outros, que se acha ilimitado diante da sua vontade, que não reconhece padrões de bem-comum, que proclama a inutilidade de Deus e, com ela, a fronteira entre o bem e o mal torna-se cada vez mais ténue. Assim sendo, ao tentar superar a sua condição de pecador, falível e finito, o Homem torna-se naquilo que o nazismo, o comunismo (e agora o capitalismo e o neoliberalismo) fizeram dele: uma besta. A nossa insegurança resulta disto mesmo.

Sem comentários: