Quarta Feira de Cinzas, o que é e o que representa, dito pelo Padre António Vieira:
«Notai. Esta nossa chamada
vida não é mais que um círculo que fazemos de pó a pó: do pó que fomos ao pó
que havemos de ser. Uns fazem o círculo maior, outros, menor, outros, mais
pequeno, outros, mínimo. Mas, ou o caminho seja largo, ou breve, ou brevíssimo,
como é círculo de pó a pó, sempre e em qualquer parte da vida somos pó. Quem
vai circularmente de um ponto para o mesmo ponto, quanto mais se aparta dele
tanto mais se chega para ele; e quem quanto mais se aparta mais se chega, não
se aparta. O pó que foi nosso princípio, esse mesmo, e não outro, é o nosso
fim, e porque caminhamos circularmente deste pó para este pó, quanto mais
parece que nos apartamos dele, tanto mais nos chegamos para ele; o passo que
nos aparta, esse mesmo nos chega; o dia que faz a vida, esse mesmo a desfaz. E
como esta roda que anda e desanda juntamente sempre nos vai moendo, sempre
somos pó».
«Abri aquelas sepulturas,
diz Agostinho, e vede qual é ali o senhor e qual o servo; qual é ali o pobre e
qual o rico? Discerne, si potes:
distingui-me ali, se podeis, o valente do fraco, o formoso do feio, o rei
coroado de ouro do escravo de Argel carregado de ferros? Distingui-los?
Conhecei-los? Não por certo. O grande e o pequeno, o rico e o pobre, o sábio e
o ignorante, o senhor e o escravo, o príncipe e o cavador, o alemão e o etíope,
todos ali são da mesma cor».
«Quando considero na vida
que se usa, acho que não vivemos como mortais, nem vivemos como imortais. Não
vivemos como mortais, porque tratamos das coisas desta vida como se esta vida
fora eterna. Não vivemos como imortais, porque nos esquecemos tanto da vida
eterna, como se não houvera tal vida».
«Aristóteles disse que entre todas as coisas terríveis, a mais terrível é a morte. Disse bem mas não entendeu o que disse. Não é terrível a morte pela vida que acaba, senão pela eternidade que começa. Não é terrível a porta por onde se sai; a terrível é a porta por onde se entra. Se olhais para cima, uma escada que chega até o céu; se olhais para baixo, um precipício que vai parar no inferno, e isto incerto».
«Aristóteles disse que entre todas as coisas terríveis, a mais terrível é a morte. Disse bem mas não entendeu o que disse. Não é terrível a morte pela vida que acaba, senão pela eternidade que começa. Não é terrível a porta por onde se sai; a terrível é a porta por onde se entra. Se olhais para cima, uma escada que chega até o céu; se olhais para baixo, um precipício que vai parar no inferno, e isto incerto».
Padre António Vieira, in Sermão de Quarta feira de Cinzas.
Sem comentários:
Enviar um comentário