Quando
morre uma figura com alguma proeminência na sociedade, toda a sociedade se
junta para enaltecer a pessoa, a sua ação e os seus dotes pessoais. Embora isso
não raras vezes não corresponda à verdade e tantas vezes esteja carregado de
santa e hipocrisia. O medo da morte é assim. Não vá alguma coisa tecê-las,
vamos dizer bem porque ninguém leva a mal e quanto ao mal vamos esquecer porque
já não está entre nós para se defender e não vamos ficar bem diante daqueles
que o admiravam e seguiam. Não podia ser de outra forma com D. José Policarpo,
bispo emérito da Diocese de Lisboa, ponto.
Conheci
o D. José Policarpo ainda bispo auxiliar de D. António Ribeiro, ambos fumadores
compulsivos, o que me fazia uma certa impressão, não estava habituado a ver
nestas lides eclesiásticas pessoas que fumassem tanto como eles.
À
parte o incenso mundano do tabaco, admirei-lhe a qualidade da sua cultura e a
forma simples e clara como colocava os problemas. Em 1992 fui para Lisboa completar
os estudos teológicos, encontrei-o como Reitor do Seminário dos Olivais e
professor na Faculdade de Teologia na Universidade Católica Portuguesa. Era um
Reitor aparentemente distante e um professor mediano. Fazia-me impressão que ao
se cruzar com as pessoas esboçasse nada, nem um sorriso nem um olhar nem uma
saudação, um simples «bom dia», «boa tarde» ou «boa noite» recebia pura ignorância.
Justificam isto com elevadas explicações teológicas. Obviamente, que me calava,
mas ficava-me uma impressão profunda.
Como
professor, servia-se da sua tese que já tinha feito há muito tempo sobre os «Sinais
dos Tempos», expressão do Vaticano II. Nada de especial. A tese estava parada
no tempo. Nem mais uma citação nem mais uma referência bibliográfica nova sobre
o pulsar do pensamento que o passar do tempo vai desvelando.
O
D. José Policarpo é um homem de qualidades superiores, mas quem sabe se por
causa da carreira eclesiástica podíamos ter um melhor professor e um teólogo de
calibre universal? – E, por conseguinte, quem sabe se por causa de terem
alimentado a ideia de que D. José Policarpo era brilhante em tudo não foi nem pastor
nem teólogo nem professor a 100%. O ser brilhante que dá para tudo, pode
redundar em nada. Oxalá que esteja equivocado.
Agora que já está no
mundo de Deus, podemos salientar que de acordo com o nosso pobre modo de ver,
se tivesse feito uma opção por um caminho só, hoje sim podíamos estar a falar
de uma obra admirável de um teólogo português ou de um Pastor inesquecível da Igreja
Católica. Mas a ânsia de quererem fazer dele tudo e mais alguma coisa, fica-nos
a sensação de pouco na lembrança sobre a figura de D. José Policarpo e aprendo que quem aceita tudo só porque os outros dizem pode acabar com pouco. Que descanse em paz na serena luz da eternidade.
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