Com a devida vénia, faço minha esta reflexão...
Fomos invadidos
por uma torrente de notícias sobre umas (supostas) declarações do Papa
Francisco. Os títulos gritaram em uníssono: "Papa diz que mais vale ser um
ateu do que um cristão hipócrita / cristão com vida
dupla".
Desconfiando do
que noticiavam os nossos amigos jornalistas - como aliás recomendo a toda a
gente - fui ler a homilia da Missa hoje de manhã no Vaticano, na qual o Papa
teria proferido essa afirmação.
Em primeiro
lugar a palavra 'hipócrita' ou 'hipocrisia' não consta. É um insulto bastante
repetido por parte dos que não acreditam em Deus ou dos que até acreditam mas
não lhes apetece ir à Missa: "Esses que vão à Missa são todos uns
hipócritas, andam ali a bater com a mão no peito e depois vêm cá para fora e
são os piores!" Isto mostra que, mesmo os que não acreditam, associam o ir
à Missa a uma maior responsabilidade moral que não atribuem a outras
actividades: "Pois, vais ao cinema e depois nem sequer pões a mesa!"
Simplesmente não tem o mesmo impacto.
A relação entre
ir à Missa e ter uma vida perfeita existe na mentalidade das pessoas, mesmo na
nossa sociedade, que de cristã já não tem muito. E perante comportamentos menos
bons, erros, cobardias, egoísmos, enfim todas as diferentes 'caras' que pode
ter o pecado, por parte dos tais que vão à Missa, está o caldo entornado:
"Hipócritas!"
O erro nesta
crítica está no pressuposto que quem vai à Missa já é perfeito, o que não é de
todo verdade. Alguém que vai à Missa tem o direito a ser visto como alguém que
está a tentar ser perfeito, embora possa ainda estar muito longe de o ser. Ao
mesmo tempo, essa pessoa tem o dever de realmente tentar ser perfeita (ser
santa) mesmo que sabendo que poderá cair e terá de voltar a levantar-se, se
necessário for recorrendo à Confissão.
O que não pode
fazer é ter comportamentos escandalosos, como se não se soubesse filha de Deus,
templo do Espírito Santo, sal da Terra e luz do Mundo. Foi isto que o Papa
criticou na sua homilia de hoje: os escândalos criados pelos cristãos junto dos
outros, que os podem afastar ainda mais de Deus.
Em segundo
lugar, a palavra 'ateu' aparece apenas uma vez na homilia, e a frase é esta:
«Quantas vezes já ouvimos na rua ou em outros locais alguém dizer: "Para
ser católico como aquele é melhor ser ateu!" É isto o escândalo, que
destrói, que manda abaixo.»
Expliquem-me,
meus senhores, onde é que o Papa disse aquilo que vocês dizem que o Papa disse.
Na única vez que fala do 'ateu' o Papa está a citar uma frase, bastante comum,
não a afirmá-la. As verdadeiras 'fake news' são os 'media'. Não
precisamos de mais.
João
Silveira, in ZENZA PAGARE
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