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segunda-feira, 12 de fevereiro de 2018

Carta aos irmãos/as em segunda ou mais tentativas para refazer a vida em casal

Caros irmãos/as recasados:
1. Antes de irmos ao essencial desta missiva, ressalvo que a palavra «recasado/as» é das palavras mais infelizes que se poderia encontrar para designar qualquer tentativa para refazer o caminho do amor e da felicidade. Sabe Deus e eles do peso da cruz que tiveram que carregar por causa de experiências passadas no caminho da vida em casal.  A vida hoje tem uma variedade de contornos que nem sempre estão ao alcance da vontade das pessoas. Novas oportunidades devem ser encaradas com alegria, porque é preferível ver pessoas realizadas, felizes do que oprimidas pelo peso da tradição, das normas e outros ditames sociais ou religiosos.  

2. Venho ao encontro de vós por esta via, porque alguns casais vieram ter comigo este fim de semana, inquietos e preocupados com o infeliz e triste «aconselhamento» do bispo/cardeal de Lisboa, sobre «o convite abstinência sexual dos casais recasados» de forma a que estes possam aceder aos sacramentos. Obviamente, contaminados com a ideia de que por ser o Cardeal, ele é o chefe da Igreja Portuguesa e que por isso o que diz tem implicação com toda a Igreja em Portugal. Já expliquei que não é assim… Porém, a respeito dos que vieram comigo pedir satisfação, garanto-vos que chegavam preocupados e tristes, mas foram-se embora libertos e a sorrir.

3. Vamos então ao que nos trás aqui. Alguns pensarão que este esclarecimento é inútil, porque em 10 casais católicos, um apenas é que segue aquilo que a Igreja diz sobre a vida matrimonial. Porém, se nos 10 existe um, esse merece a nossa consideração e respeito, igualmente como todos os outros.

4. No entanto, os casais mais maduros, mesmo que não sigam (e muito bem) nada daquilo que «aconselham» alguns padres sobre as suas vidas íntimas, ficaram confusos com aquilo que disse o Cardeal. Daí, como se adivinhava, vieram interpelar os (seus) párocos neste fim de semana sobre o assunto. Quiseram estar esclarecidos, porque como quase todos os portugueses pensaram que isto é a Igreja, porque ele (o bispo de Lisboa) é o patriarca (cardeal) e Presidente da Conferência Episcopal.

5. Primeiro, é necessário dizer-vos que estão errados quanto a esta ideia e, segundo, dizer-vos com clareza que aquilo que diz respeito à vossa intimidade, nem o Papa nem os cardeais nem os bispos nem os padres, absolutamente ninguém, tem nada a ver com isso… Sejam felizes e amem-se com toda a liberdade e responsabilidade. Porque, não praticar isso é verdadeiro pecado.    

6. Outro momento que deve ficar bem claro é que todos nós temos dias bons e outros menos bons. Umas vezes acertamos outras não. Os bispos também são assim como qualquer um de nós, pois, como dizia ao Expresso Frei Bento Domingues, «Os bispos são um ministério, um serviço à comunidade. Às vezes o serviço é bom, outras vezes o serviço não é tão bom». Neste sentido, vale ainda aqui retomar o pensamento de Santo Agostinho, sempre lembrado quando se trata da comunitária figura do Bispo: «Atemoriza-me o que sou para vós; consola-me o que sou convosco. Pois para vós sou Bispo; convosco sou cristão. Aquilo é um dever; isto, uma graça. O primeiro é um perigo; o segundo, salvação». Como gostam tanto os bispos de Santo Agostinho, deviam recorrer a este pensamento todos os dias.

7. Espero ter contribuído para que a paz se restabeleça nos vossos corações. Não abdiquem do vosso amor e sejam fiéis ao que Deus semeou nos vossos corações e façam frutificar essa graça.

1 comentário:

francisco disse...

E no entanto, "Concedei, Senhor, que estes dons sagrados nos purifiquem e renovem, para que, obedecendo sempre à vossa vontade, alcancemos a recompensa eterna." foi a oração deste Domingo, e como pede o Papa Francisco devemos ser coerentes.
O alimento e a meta é a vida eterna, obedecendo à vontade de Deus e purificados do pecado pela Sua Graça. Deus na Sua misericórdia deu-nos uma escada para subirmos até Ele e ajudarmos os outros a subir não é apenas para uma suposta felicidade neste mundo. Estamos a procurar a felicidade no local errado.

Se fosse apenas assim "Sejam felizes e amem-se com toda a liberdade e responsabilidade. Porque, não praticar isso é verdadeiro pecado" era fácil, não se compreende porque é necessária a Igreja e os sacramentos.

A situação destes nossos irmãos/as não é apenas de normas, tradição e questões sociais ou religiosas, a situação em que estão infelizmente vai contra a indissolubilidade do matrimónio que é fundada na Sagrada Escritura e não podem aceder à Eucaristia porque o seu estado e condições de vida contradizem objectivamente aquela união de amor entre Cristo e a Igreja, significada e actuada na Eucaristia, para além de que o adultério os coloca em pecado mortal.

Dizer sim aos nossos irmãos/as é fácil mas não precisamos de um médico que apenas nos diz sim a tudo mas sim de um que saiba fazer um verdadeiro diagnóstico e que os ajude a seguir o caminho da cura, ainda que seja um processo difícil.

Qual é a situação destes irmãos/as em relação à vida eterna e à vontade de Deus?
O que é necessário para no sacramento da reconciliação receber a absolvição e o que significa e opera comungar a Eucaristia?

Santo Agostinho citado pelo Papa São João Paulo II refuta a ideia destes pontos:
Ao ensinar a existência de actos intrinsecamente maus, a Igreja cinge-se à doutrina da Sagrada Escritura. O apóstolo Paulo afirma categoricamente: «Não vos enganeis: Nem imorais, nem idólatras, nem adúlteros, nem efeminados, nem sodomitas, nem ladrões, nem avarentos, nem maldizentes, nem os que se dão à embriaguez, nem salteadores possuirão o Reino de Deus» (1 Cor 6, 9-10).
Se os actos são intrinsecamente maus, uma intenção boa ou circunstâncias particulares podem atenuar a sua malícia, mas não suprimi-la: são actos «irremediavelmente» maus, que por si e em si mesmos não são ordenáveis a Deus e ao bem da pessoa: «Quanto aos actos que, por si mesmos, são pecados (cum iam opera ipsa peccata sunt) — escreve S. Agostinho — como o furto, a fornicação, a blasfémia ou outros actos semelhantes, quem ousaria afirmar que, realizando-os por boas razões (causis bonis), já não seriam pecados ou, conclusão ainda mais absurda, que seriam pecados justificados?».