Quantos anos estaremos
à espera para recompor todo o estrago de mais esta tragédia? – Imensos anos. Alguns
apontam trinta anos em cada parcela de floresta que é votada às cinzas… Como se
deduz alguns de nós já não verão o esplendor do verde que antes das chamas
tivemos a alegria de contemplar naquele maravilhoso espaço que era toda a zona
do Palheiro Ferreiro, Ribeira Brava, Calheta e outros sítios da nossa terra,
porque pelo que oiço isto está tudo a arder.
Acordamos com a alma no
meio das cinzas. Incrédulos perante a barbárie infligida à natureza. Incrédulos
perante a violência das chamas que não se compadecem só em consumir mata, mas
também as casas, secam as lágrimas, aumentam a tristeza, ardem todos os bens
que se desvelam no seu caminho. Tudo uma tragédia que se amontoa em cinzas, um
negro horrível que expressa o nosso luto, a nossa tristeza, a nossa impotência,
a nossa perdição, a nossa fragilidade, o nosso espanto…
Nesta hora, choro, sem
chorar o que perdi, o que todos nós perdemos de presente e de futuro. Não creio
em nenhum fogo que não seja resultado de incúria, de irresponsabilidade e de
insensibilidade perante o bem comum. Uma falta de vergonha que nos envergonha.
Porque destrói-se a nossa própria casa e a casa dos outros como se de lixo se
tratasse. Onde paira a responsabilidade que nos foi cedida pelos nossos
antepassados? Onde paira a responsabilidade pelo futuro? Que deixaremos para os
madeirenses vindouros? Um penhasco chamado Madeira sem paisagem verde como era
antes? Uma tenebrosa visão escarpada, árida, sem vida nenhuma?... Ai, tantas
questões que nos assalta nesta manhã tão descontente que me foi dado viver.
Lá no fundo das cinzas
faço a minha oração de amizade e solidariedade a todos os desalojados, os que
nesta noite se recostaram sobre a enxerga do medo, os que viram reduzido a cinzas
em segundos o trabalho, o suor e lágrimas de uma vida, os que ficaram feridos,
os que se entristeceram porque sabem o que custa a vida quando construímos, os
que se entristeceram porque amam a casa comum que é a nossa amada Madeira, os
que se inquietam com as questões ecológicas, os que sabem que isto nos trará
consequências horríveis, os que diante da calamidade choram e com ela ficaram
desamparados, sem nada.
Por fim, uma palavra
aos soldados da paz, os bombeiros, que devem ter passado uma noite terrível,
sob o calor voraz que consumia sem licença tudo ante os seus olhos fatigados e
tristes porque não conseguiam dominar o seu/nosso pior inimigo. Quando alguns os
desvalorizam, os olham de soslaio, os dispensam, nós somos estes, bombeiros,
porque sabemos da sua utilidade, sabemos da sua importância, do seu valor
nestes momentos de tragédia. Bem hajam!
Nesta hora, não será
hora de apontar dedos a ninguém, caçar as bruxas, mas qualquer momento deve ser
ocasião de chamar à responsabilidade quem não a assume quotidianamente e que nos
momentos da desgraça aparece para lamentar, dizer o indizível e simplesmente
estar, aparecer… Volto também à carga, para dizer que não creio em nenhum
incêndio que não seja posto, que não resulte de vinganças absurdas, que não
seja consequência de irresponsabilidade e incúria descarada… Por isso, acção, autoridades
competentes para o efeito, investigação total para que sejam chamados à
responsabilidade quem a tinha e não a assumiu como lhe competia.
Nós, sociedade o exigimos, porque mais uma vez irresponsavelmente destruímos o melhor de nós e comprometemos seriamente o futuro da nossa terra. E não venham dizer que o principal culpado é Deus, a natureza, o fogo… Não, por favor, contenção! E contudo, que a fénix renasça mais uma vez das cinzas para glória do futuro.
José Luís Rodrigues
Nós, sociedade o exigimos, porque mais uma vez irresponsavelmente destruímos o melhor de nós e comprometemos seriamente o futuro da nossa terra. E não venham dizer que o principal culpado é Deus, a natureza, o fogo… Não, por favor, contenção! E contudo, que a fénix renasça mais uma vez das cinzas para glória do futuro.
José Luís Rodrigues
1 comentário:
O grande «incêndio» foi a dantesca dívida que grassou infrene, sem controlo, hipotecando o futuro das gerações futuras, perante o olhar conivente e tolerante das entidades de supervisão a todos os níveis!
Honra seja feita a alguns «bravos do pelotão» que ousaram por o dedo nessa ferida cancerígena...
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