A
26 de Abril de 2001, a Conferência Episcopal Portuguesa escreveu um documento
com este título: «Crise de Sociedade – Crise de Civilização», era um
documento precioso do ponto de vista da denúncia certeira sobre aspectos
políticos dos últimos tempos e era uma reafirmação convicta sobre a doutrina
fundamental da vida humana em todos os seus aspectos.
Na
altura acordaram os bispos que estávamos indo mal com a lei da pílula do dia
seguinte, as uniões de facto, as salas de chuto, a generalizada violência e
insegurança, a marginalização social, a falta de confiança no sistema judicial,
a toxicodependência e a delinquência juvenil, a falta de apoios e protecção da
família, a confusão generalizada no sistema de saúde e na educação, os riscos
da globalização, a mediatização da vida, os novos poderes, o poder político
está fragmentado e enfraquecido, a perda de confiança nas instituições, a
margem cada vez maior para a ilegalidade e desorganização legal, etc. O que
terá mudado para dizermos que este rol de problemas já não consta da leitura que fazemos
da sociedade? - Não mudou nada, tudo está diferente para pior. Aumentou isso sim,
a multidão de gente vítimas de cada um destes aspectos. Mais ainda se acrescentarmos
as vítimas sem-abrigo e os esfomeados que deambulam por todo o lado à procura
de clemência e de alguma esmola. Mais ainda se acrescenta a insensibilidade política e a irresponsabilidade dos líderes políticos.
Choca-me
que a «nossa» Igreja Católica, também não se sinta responsável por esta
tragédia. Choca que diante da reportagem do Diário de Notícias do Funchal sobre
a multidão dos sem-abrigo que calcorreiam as ruas da nossa cidade, uma instituição
da Igreja Católica, vocacionada para a Caridade e a ajuda aos mais pobres, escarrapache
que os sem-abrigo não são da sua alcança, não está esta organização vocacionada para os sem-abrigo.
É o que dá transformar as instituições de caridade e de solidariedade
verdadeiras empresas. Mas, dado que nos falta a paciência para instituições que
fazem dos pobres matéria-prima, não perco mais tempo nem muito menos lhes presto
atenção nem lhes faço mais publicidade.
Tantos
sem abrigado dizemos em relação a estes dos números oficiais, manipulados pelas
instituições. E os outros tantos, que não estão contabilizados, os que se
escondem com vergonha, os que estão fora das ruas da cidade? E os que andam já
cansados de bater à porta das instituições, a Segurança Social, o Instituto de
Habitação, as Câmara Municipais, entre outros, que ao que dizem têm casas
fechadas nos bairros que estão à sua responsabilidade? – São imensas famílias
que andam de Anás a Caifás, mergulhadas na imensa burocracia ouvindo as piores
respostas baseadas na tecnicidade e ao abrigo da frieza das leis…
Não
contam as pessoas para nada, os seus anseios, as suas necessidades prementes. Assim se acomoda uma sociedade com a multidão de esfomeados e com a multidão dos sem-abrigo,
os sem casa, os sem voz e sem vez no lugar da dignidade em cada canto do mundo e
em cada rua das nossas cidades. Não podemos dormir descansados com esta
fatalidade. Nem muito menos permitir que a pobreza, a fome, os sem-abrigo se
transformem em paisagem. Meu Deus, se não fossemos uma terra de turismo, o que
não seria. É preciso acordar…
A
nós que somos Igreja cabe-nos denunciar e anunciar em todos os tempos e
contextos históricos esta radicalidade da esperança como sinal do Reino do amor
e da paz que Cristo nos deixou. E não devemos esquecer que foi nos ambientes
mais adversos à Igreja que ela foi mais útil e mais rica na vivência
espiritual. Mas, entre nós o pecado da omissão tem muitos adeptos, infelizmente. Até quando, vai durar aquilo que faz consistir esta denúncia: «Cristãos mornos são aqueles que querem construir uma igreja à sua
medida, mas esta não é a igreja de deus.» Francisco, Papa No Correio da Manhã e
citado no Dnotícias de hoje (22 de Abril de 2013).
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