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quarta-feira, 17 de abril de 2013

Papa Francisco contra a teimosia de quem quer voltar atrás

A resignação do Papa Bento XVI, foi um acto sobejamente enaltecido por toda a gente. Veio revelar que a «Barca de Pedro» estava um pouco sem rumo, à deriva e os ventos eram tão fortes que o Papa alemão reconheceu que não tinha forças suficientes para continuar ao leme da barca. Foi-se e abandonou o comando da barca, para que outro com mais «vigor» viesse tomar os comandos da viagem.
Bom, aqui estamos com o Papa Francisco ao leme. Um papa vindo do «fim do mundo», que rebenta com os esquemas protocolares, dessacraliza o Papado, rompe com a apertada segurança, que fala da pobreza, do Espírito Santo e de mudanças na Igreja Católica. Vejamos o que disse na homilia da missa de ontem (16 de Abril de 2013): «Pensem no Papa João XXIII. Ele parecia um bom pároco e foi obediente ao Espírito Santo e fez isto. Mas 50 anos mais tarde, fizemos tudo o que o Espírito Santo nos ordenou no Concílio? Na continuidade do crescimento da Igreja que foi o Concílio? Não». Claro que não. É tempo de acabar com as festanças religiosas para marcar a agenda e fazer passar a imagem para fora de que tudo está bem. Há gente, mesmo que sejam sempre os mesmos a encher autocarros, a bater palmas, a abanar bandeirinhas, vestir camisolas e bonés muito bem ornamentados com os apetrechos religiosos para a ocasião.
A meu ver faz bem o Papa Francisco em desejar colocar o acento no Concílio Vaticano II, porque grande parte daquilo que foi discutido nesta reunião magna da Igreja nos anos 60 ainda falta ser levado à prática. Então diz o Papa «vindo do fim do mundo»: «Celebramos este aniversário [referindo-se à comemoração do 50º aniversário do Concílio Vaticano II] erguemos monumentos, mas não nos damos ao trabalho. Não queremos mudar», afirmou ainda o Papa.
De seguida, Francisco foi mesmo mais longe e criticou aqueles que procuram regressar ao período antes do Concílio: «E há mais: há vozes que procuram voltar atrás. Chama-se a isto teimosia, chama-se querer domesticar o Espírito Santo, chama-se a isto insensatez e lentidão de coração». Mais clareza é difícil de encontrar e coloca na ordem os que andam por aí a restaurar a parafernália eclesiástica há muito tempo arrumada nos armários das sacristias ou nos museus para serem isso sim tomados como peças de um tempo que há muito que passou. As respostas aos problemas de hoje com remendos do passado, é a pior das asneiras e resulta na patetice e no ridículo.
Estamos num tempo de ouro para grandes transformações na Igreja Católica, que resumo em dois aspectos. Primeiro, porque, segundo o pensamento filosófico de hoje o contexto do mundo é este que foi descrito de forma excelente por Gilles Lipovetsky no DN – Lisboa a 4/4/2010). Face à seguinte pergunta responde: «É por tudo isto que vivemos numa sociedade desorientada?»
«- Absolutamente. A cultura-mundo acelera a desorientação. Desde o século XIX, que os grandes pensadores ocidentais assinalam este fenómeno, de que a modernidade se desorienta. Nietzche fala na morte de Deus, o mesmo é dizer que se perdeu um dos pilares sólidos da Humanidade. Hoje, essa questão é mais complexa, por que não é apenas a questão de Deus que nos desorienta, mas sim tudo. Por exemplo: o que comer? Antes, era tudo muito simples. Comíamos os pratos tradicionais. Hoje, não. Podemos ir a um restaurante japonês, podemos comer fast-food, podemos comer tudo. Nas grandes cidades existem restaurantes de todo o mundo». Disse o autor de a «Era do Vazio».
O segundo aspecto prende-se com tudo o que tem assolado a Igreja Católica nos últimos tempos, principalmente, os escândalos relacionados com a pedofilia e com todas as falcatruas nas finanças do Banco do Vaticano. Se isto não levar à mudança não se sabe o que levará. Mas, parece que se vê muito bem claro que o espírito do tempo exige mudança e sente como nunca que a Igreja Católica precisa de lavar a cara.
Este é um tempo de ouro, que se não for aproveitado para a mudança não sei então onde estarão outros tempos tão propícios. A abertura para qualquer mudança internamente na Igreja Católica é quase unânime, tirando as facções conservadoras e integracionistas que se viram neutralizadas com a eleição do Papa Francisco, mas que a qualquer momento se vão manifestar contra o Papa e contra a onda que anseia com a necessidade urgente de reformas na Igreja Católica. Se quisermos referir o mundo em geral, então, aí será raro encontrar qualquer oposição às reformas.
Neste sentido, esperamos ardentemente que o Papa Francisco dê largas ao Espírito Santo que age quando quer, onde quer e em quem quer. Mais ainda desejamos que o pensamento da «Ecclesia reformata semper reformanda secundum verbum dei» (Igreja sempre reformada segunda a Palavra de Deus)cuja formulação foi feita no coração da Reforma do Século XVI e retomado depois no espírito do Concílio Vaticano II no anos 60, seja também hoje uma ideia que toma de assombra toda a Igreja Católica, para que o vendo do Espírito Santo renove tudo o que fez da Igreja Católica um albergue do vazio que provocou o distanciamento dos homens e das mulheres do seio da Igreja, especialmente, os mais jovens.

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