Grupo 4 do questionário do Lineamenta para o Sínodo extraordinário sobre a família. Aqui fica o meu contributo para este grupo de perguntas.
QUESTIONÁRIO (IV)
Grupo
4.
Sobre a pastoral para enfrentar algumas situações matrimoniais difíceis
a)
A convivência ad experimentum é
uma realidade pastoral relevante na Igreja particular? Em que percentagem se poderia
calculá-la numericamente?
- Esta pergunta, penso, que terá que ver
com o facto de muitos casais coabitarem antes da celebração de qualquer vínculo matrimonial. Este elemento hoje está profundamente banalizado. A convivência
sexual começa cada vez mais cedo e as várias etapas da relação entre casais,
tem esse aspecto como prioritário a partir do momento em que começam o namoro. Não
tenho dados concretos para aferir qualquer percentagem, mas suponho que será
muito elevada a convivência ad experimentum, porque aquilo que a percepção nos
vai ditando confirma que os casos são elevados. O número de Baptismos de filhos
de casais sem estarem comprometidos com o vínculo matrimonial já é em maioria.
b)
Existem uniões livres de facto, sem o reconhecimento religioso nem civil?
Dispõem-se de dados estatísticos confiáveis?
- Penso que não há estatísticas fiáveis.
A facilidade com que se juntam e se separam é cada vez maior. Mais ainda se
considerarmos que existem muitos casais de jovens que de forma às vezes
camuflada já coabitam. Não temos estatísticas credíveis.
c)
Os separados e os divorciados recasados constituem uma realidade pastoral
relevante na Igreja particular? Em que percentagem se poderia calculá-los
numericamente? Como se enfrenta esta realidade, através de programas pastorais
adequados?
- Também não tenho dados concretos que
me possam aferir um número para esta situação dos separados e divorciados
recasados. Serão muitos, também calculo e mais ainda o número está cada vez
mais imparável.
Este grupo deve ser integrado na Igreja.
Deve ser vista cada situação concreta, as circunstâncias em que se viram
forçados à separação ou ao divórcio, não existindo razões que não sejam
sobremaneira graves contra a vida, a dignidade e o respeito por Deus e pelos
outros, devem, ser chamados à comunhão e à participação na vida da Igreja.
Hoje, cada vez mais cresce o número de pessoas que não aceitam nem muito menos
compreendem que uma pessoa pelo facto de ter falhado uma vez seja eternamente
banida da vida litúrgica da Igreja ou seja considerado um anátema. É preciso
dar a possibilidade a todos de comungarem na Eucaristia, ainda mais se
considerarmos o que Jesus diz: «Eu quero misericórdia, e não sacrifício. Porque
eu não vim chamar os justos, mas os pecadores, ao arrependimento» (Mt 9, 9-13).
Mais ainda: «o Filho do Homem veio procurar e salvar o que estava perdido» (Lc
1, 10).
Não faz sentido nenhum, que cada pessoa
independentemente da sua condição e da sua situação humana esteja privada da
comunhão eucarística e até que lhe seja vedada a possibilidade de se abeirar
dos sacramentos e de participar neles de alguma forma se a consciência o assistir
com a dignidade e o respeito. O restante fica reservado ao amor e à
misericórdia de Deus.
d)
Em todos estes casos: como vivem os batizados a sua irregularidade? Estão
conscientes da mesma? Simplesmente manifestam indiferença? Sentem-se
marginalizados e vivem com sofrimento a impossibilidade de receber os
sacramentos?
- Uma grande parte dos baptizados pouco
se importa com a sua irregularidade, o que por si só já é grave. Alguns não
estarão nada conscientes, são indiferentes. Porém, o maior problema coloca-se
aos casais que sempre foram crentes e participaram na vida da Igreja. Quando
estão na situação de separados, divorciados e recasados assumem um sofrimento
muito grande e sentem-se diferentes dos outros fiéis.
Um dia destes fui ao encontro de uma
senhora com mais de trinta anos a viver uma união de facto, participou sempre
na Eucaristia sem comungar. Lamentava-se e chorava compulsivamente, porque
sentia uma mágoa interior enorme por não poder comungar. Diante da sua vontade
entreguei ao amor de Deus e realizei o sacramento da penitência e obviamente
que lhe concedi a Sagrada Comunhão. Ao receber o Santíssimo Sacramento louvando
a Deus, as lágrimas de tristeza converteram-se em lágrimas grossas de alegria.
Um momento grande de reconciliação, de libertação. A presença de Deus foi muito
forte para esta senhora e para mim.
e)
Quais são os pedidos que as pessoas separadas e divorciadas dirigem à Igreja, a
propósito dos sacramentos da Eucaristia e da Reconciliação? Entre as pessoas
que se encontram em tais situações, quantas pedem estes sacramentos?
- Algumas pessoas que abeiram-se da
Eucaristia, outros comungam, porque não estão cientes do impedimento e outros
estão, mas fazem-no independentemente disso. Com a Reconciliação também se
passa o mesmo, embora muitos procurem outras formas de reconciliação que não a
tradicional. Também não tenho elementos concretos em número que possa aferir
uma percentagem para esta situação.
f)
A simplificação da práxis canónica em ordem ao reconhecimento da declaração de
nulidade do vínculo matrimonial poderia oferecer uma contribuição positiva real
para a solução das problemáticas das pessoas interessadas? Se sim, de que
forma?
- Claro que sim. A práxis canónica para
a nulidade do vínculo matrimonial não devia implicar somas tão elevadas
monetariamente, a anulação devia ser mais simples menos burocrática e mais
célere. A meu ver este caminho seria uma manifestação enorme de caridade por
parte da Igreja, porque afinal correspondia ao desejo que se sente quanto à
libertação do imenso sofrimento que tantas pessoas experimentam quanto ao
insucesso do projecto matrimonial que abraçaram com tanto interesse e dedicação
em um determinado momento das suas vidas, mas que não deu certo, falhou. Outros
tantos que se sentem excomungados podiam voltar à participação na vida da
Igreja e encontrariam a reconciliação que tanto procuram.
g)
Existe uma pastoral para ir ao encontro destes casos? Como se realiza esta
atividade pastoral? Existem programas a este propósito, nos planos nacional e
diocesano? Como a misericórdia de Deus é anunciada a separados e divorciados
recasados e como se põe em prática a ajuda da Igreja para o seu caminho de fé?
- A pastoral especifica para estes
casos, é nula. Simplesmente não se realiza, porque não temos formas nem muito
menos pessoas predisposta a se exporem, porque há atitudes, censuras, o apontar
o dedo que já fizeram o trabalho da marginalização. Não há programas, não se
estuda nem muito menos se fala a este propósito, os planos não existem nem a
nível nacional nem ao nível das dioceses. Já se ouviu falar dos casais de Santa
Isabel, mas não passa de um pequeno grupo, porque simplesmente não há adesão e
não sei até que ponto a metodologia é atrativa. As pessoas estigmatizadas não
se expõem porque estão profundamente marcadas pelo sofrimento que tal condição
provoca.
A misericórdia de Deus
pode ser anunciada aos casais separados e divorciados recasados pelo
acolhimento e pela compreensão sem que se lhes apresente logo à partida o
moralismo e as leis que excomungam ou colocam cruelmente à margem. Este deve
ser o principal papel do ser Igreja, acolher sem desprezar e fazer todo o
possível para integrar sempre. A preocupação deve ser não permitir que as
pessoas se afastem ainda mais da Igreja ou então vão para as suas casas ainda
com mais revolta e animosidade contra os sacerdotes e contra os que participam
assiduamente na vida da Igreja. A este nível considero que meio trabalho ficará
realizado se o acolhimento sem rotular for a principal preocupação em relação a
quem é recebido.
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