1. Nada me move contra o «dia
internacional da mulher», como nada tenho contra os outros dias internacionais
disto e daquilo. Mas, tenho contra o que esses dias implicam de hipocrisia e
artificialidade. O dia da mulher é bem revelador disso. Calava-me se não fossem
tão dramáticos os números da violência contra as mulheres em todos os dias do
ano. Por isso, admiro-me que sejam as mulheres as primeiras a se prestarem a isso.
2. Quanto ao dia Internacional da
mulher, que teve uma origem muito interessante e foi necessário para que a
mulher visse os seus direitos serem respeitados no trabalho, na vida social e na
política. Mas, hoje está a converter-se em mais um dia carregado de hipocrisia
e artificialidade, cujo centro das atenções são as mulheres. E pelo que vejo
elas são as primeiras a tomarem a dianteira nisso. Gostam de receber jóias, flores, chocolates, participar
em jantares só com elas, onde haverá strippers masculinos e bebedeiras. É o dia
e a noite delas, começa a convencionar-se, pois até partilham «parabéns, é o
teu dia»; «feliz dia da mulher» e «vivam as mulheres», entre outros mimos meio
descabidos que o ambiente proporciona. E reforço a ideia, as mulheres são as
primeiras a se prestarem a isto.
3. A maior parte das mulheres não sabe
porque há um dia dedicado a elas. É como os outros dias mundiais, serve para
receber prendas, andar com flores na mão que os homens lhes deram e participar
numa jantarada, que em ano de eleições até dá jeito porque os partidos
políticos aproveitam para fazer um comício. E reforço a ideia, as mulheres são
as primeiras a se prestarem a isto.
4. A sociedade em geral é machista e
patriarcal, institui e valoriza práticas sociais que desqualificam ou menorizam
as mulheres. Estas práticas contribuem para que todos os dias do ano tenhamos
uma cultura da violência contra as mulheres, particularmente, a violência
doméstica e a violação, porque, por mais que se pinte de cor de rosa um dia do ano
dedicado à mulher sempre haverá homens que são levados a crer que têm o
«direito» de cometer diversos tipos de violência contra a mulher, inclusive a
violência sexual. E reforço a ideia, as mulheres são as primeiras a se
prestarem a isto.
5. Nada mudará enquanto se continuar a
fazer dos dias assinalados, dias de carnaval hipócrita, maquilhados com flores
e festanças. Neste sentido, os meios de comunicação social, as entidades públicas,
a escola e a própria família, vão legitimando a desigualdade entre géneros,
legitimando papéis que só pertence a uns e não aos outros e fazendo passar a
ideia de que os papéis das mulheres são sempre subalternizados, só porque são
da mulher. E reforço a ideia, as mulheres são as primeiras a se prestarem a
isto.
6. O dia da mulher devia ser um dia de
profunda reflexão, porque os dados da violência contra ela são absurdos e
exigem de todos a consciência de que é preciso mudar tais comportamentos. A
escola, as entidades públicas e a própria família precisam de acolher este
debate, ajudando homens e mulheres, jovens e mais velhos, a compreenderem que
não podemos continuar nesta guerra quotidiana onde o elo mais fraco é sempre a
mulher, porque facilmente se converte numa serviçal, um objecto sexual ou num
bumbo onde companheiros, namorados e maridos descarregam a sua agressividade. E
reforço a ideia, as mulheres são as primeiras a se prestarem a isto.
7. Tomara que as mulheres acordassem e fossem as primeiras a não se
prestarem a tanto acessório disparatado neste dia, para que não fossem também elas
a legitimarem as investidas machistas e a ditadura da masculinidade que ainda
impera na família, nas instituições e na sociedade em geral. A mulher deve ser
a primeira a dar-se ao respeito para ser respeita. Tal como aconteceu há 200
anos, onde as mulheres foram as protagonistas do movimento emancipador, movidas
por razões válidas foram elas que contribuíram prioritariamente para a criação
do Dia Internacional da Mulher. Não me parece que hoje as correntes se quebrem só
com jantaradas com strippers, flores e bebedeiras femininas. Nem muito menos
seja esse o ambiente mais adequado para gritar-se vivas às mulheres.
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