Católogo das culpas actuais enumeradas por Pacheco Pereira no seu «Abrupto». E se alguém puder e quiser pode continuar... Falta a seguir inventar um catálogo sobre o perdão, que me parece ser o mais nobre dos sentimentos face à dor da culpa. Perdão e culpa formam uma bela sinfonia. Não será preciso mais para o bem estar do mundo de hoje e de sempre.
Tocador de quissange, pintura de Neves e Sousa (1921-1995)
Ser pobre é uma culpa.
(Significa não ser competitivo, ser preguiçoso,
depender dos subsídios, explorando as novas gerações e hipotecando o seu
futuro.)
Ser funcionário público é uma
culpa.
(Viver a expensas dos contribuintes.)
Ser desempregado é uma culpa.
(Não ser competitivo no mercado de trabalho, não se
ser “empreendedor”.)
Ser desempregado de longa duração é uma
culpa.
(Sinal de preguiça e não-“ajustamento”. Condição
sensível à “pieguice”.)
Ser desempregado com mais de quarenta anos é uma
culpa.
(Não se ter “adaptado” a tempo. Condição sensível à
“pieguice”.)
Ser desempregado com vinte anos é uma
culpa.
(Não ter escolhido uma formação com
“empregabilidade”.)
Ter estudado História é uma culpa.
(Escolher ser não-empregável.)
Ter estudado Filosofia é uma
culpa.
(Escolher ser não-empregável.)
Ter estudado Literatura é uma
culpa.
(Escolher ser não-empregável.)
Ter estudado Sociologia é uma
culpa.
(Escolher ser não-empregável.)
Ser de “humanidades” é uma culpa.
(Escolher ser não-empregável.)
Viver mais do que sessenta e cinco anos é uma
culpa.
(Ameaça à segurança social por via das
reformas.)
Exercer os seus direitos legais à reforma é uma
culpa.
(Significa pensar que se tem direitos quando não se tem
nenhum. As carreiras contributivas para a segurança social são mais úteis para
controlar o défice.)
Ter nascido entre 1940 e 1950 é uma
culpa.
(Fazer parte da geração maldita dos anos sessenta que
tem todas as ideias erradas.)
Ter nascido entre 1950 e 1960 é uma
culpa.
(Fazer parte da geração maldita dos anos setenta, a
segunda em perigosidade depois da dos anos sessenta.)
Ter nascido entre 1960 e 1970 é uma
culpa.
(É a geração do “cavaquismo”, como se sabe, um resquício de um PSD “social-democrata” anacrónico.)
(É a geração do “cavaquismo”, como se sabe, um resquício de um PSD “social-democrata” anacrónico.)
Ter nascido entre 1970 e 1980 é uma
culpa.
(Idem.)
(Idem.)
Estar vivo e adulto em 2012 é uma
culpa.
(Viveu-se “acima das suas posses”.)
(Viveu-se “acima das suas posses”.)
Estar vivo no 25 de Abril de 1974 é uma
culpa.
(Veja-se este comunicado da JSD: “”o sucesso da marca do 25 de Abril e da conquista
da democracia será tanto maior quanto menos depender dos agentes da mudança de
1974..”)
Não pensar que o 25 de Abril é uma “marca”, é uma
culpa.
(Sinal de “corporativismo” a favor de uma marca
duvidosa.)
Ter direitos sociais é uma culpa.
(O que é bom é ser-se contra os direitos, em
particular quando a família é rica.)
Não ter uma família rica é uma
culpa.
(Significa que os pais e os avós já não foram
competitivos, genética errada.)
Ser sindicalizado é uma culpa.
(Fazer parte das forças do bloqueio antiquadas que
resistem ao “ajustamento”.)
Viver fora de moda é uma culpa.
(Significa não querer ser competitivo.)
Duvidar do modo como somos governados é uma
culpa.
(Ser-se “socratista” ou “velho do
Restelo”.)
(Podia continuar sempre.)
(Imagem tirada do blogue «A Matéria do Tempo»)
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