Nota: Mais um contributo interessante e importante do Padre Mário Tavares. Para que conste na crónica do tempo que vivemos e para o futuro, publicamos aqui na íntegra esta sua «carta aberta» às várias entidades abaixo nomeadas... Uma belíssima reflexão e chamada de atenção a quem de direito sobre todas as opções que estão a ser tomadas que põem causa não a regra da natureza que faz o sol nascer todos os dias, mas que não nasce, tristemente, para todos... Bom, inquietações de um cidadão interessado que nos provoca a todos.
Ao
Senhor Presidente da República Portuguesa,
Ao
Senhor Primeiro Ministro,
A
todos os Senhores Ministros e membros do Governo,
Aos
Governos das Regiões Autónomas e Autarquias,
Aos
Partidos Políticos
A
Todo o Povo Português
Excelentíssimos
Senhores
Como
cidadão eleitor, súbdito português e da globalização, perante o quadro político
social de que sou membro e vítima, de modo algum consigo ficar calado.
Apresento
este texto anexo, num profundo desejo de incomodar os gestores políticos e de
inquietar as consciências de todos, para que se faça luz em toda esta mescla de
obrigações, oportunismos, vítimas e privilegiados.
O
sol nasce todos os dias. Mas os oportunismos, instalados por baixo, deixam o
mundo à sombra e ao frio. Desfazer as nuvens produzidas pelas conveniências
privadas, por poderes instalados e pelas injustiças é um trabalho que precisa
de acontecer.
O povo não pode continuar subordinado,
passivo, explorado e posto em fila, à espera da sua vez. E o governo terá que
acertar e exercer as suas corretas funções.
Isto
não é patrocínio nem de confusões nem de conflitos. Mas é uma pretensão para
que haja conteúdo e transparência na construção de uma cidadania justa,
saudável, partilhada e distribuída por todos, contemplando cada um.
O
texto está assim organizado:
A Construção da Grande Cidade Planetária do
Desenvolvimento
1º O insucesso do capitalismo desenfreado,
2º A resposta desonesta dos
grandes do capital
3º O Nosso Portugal
·
E como é feita a
recolha de todos estes valores
4º Que significa Governar Portugal
·
Este Governo da Nação
5º O crime do dinheiro
concentrado, como senhor absoluto
·
O assalto à riqueza,
Património da Humanidade
·
Inversão ao valor
da função de mercado e a comercialização da Vida
5º A Dignidade Humana e a
Cidadania dos Povos
6º Conclusão
Com o maior respeito e consideração
Câmara de Lobos, 16 de Maio de 2012
Mário
Tavares Figueira
BI nº 002
112 037 Contribuinte nº 105 743 410
Mariotavares@netmadeira.com
A
Construção da Grande Cidade Planetária do Desenvolvimento
1º
O insucesso do capitalismo desenfreado
Os senhores
do capital, em razão dos muitos dinheiros acumulados nas suas mãos, resolveram construir a grande cidade planetária do
desenvolvimento. A sua edificação foi parcelada e dispersa por todo o Globo
Terrestre, de um modo concatenado, em razão dum sonho de domínio
organizadamente globalizante.
Foram
construídos os grandes monumentos bancários e da gestão, as grandes catedrais
do comércio e do turismo, a multiplicidade de vias, portos e aeroportos e seus
meios de circulação e transportes e a multidão de estruturas empresariais de
apoio.
Ao
nível da informação, do diálogo, da condução, da gestão e do controlo utilizam
a internet e todo o seu mundo. E, neste mundo coordenador e condutor, surgem
imensas personalidades e órgãos de
gestão e controlo virtuais, os quais delineiam horizontes. Muita riqueza
circulante é um mundo de jogos sem rosto, mas em contínua actuação. Não há
a quem pedir contas. Contudo não faltam as operações activas. Estamos perante um mundo de riqueza
especulativa a ser conduzido por um poder virtual, mas com muitas entidades
privadas por dentro.
Historicamente
estamos informados de que o desenvolvimento do comércio, da indústria e a
acumulação das riquezas adquiridas foram acontecendo, através dos séculos,
subordinadas a gestões independentes e autónomas. Contudo a sua instalação sempre foi a Comunidade Humana e todo o seu
espaço geográfico, um bem sem título, fruto apenas de uma tolerância geral.
Das riquezas da Terra recolhem a
matéria-prima e a transformam; das populações
recolhem o trabalho de que necessitam. Depois, das pessoas
economicamente capazes, fazem delas os
seus clientes.
O capitalismo, a partir do século XIX, ganhou muita presença nas
lideranças governativas e, depressa, tornou-se adulto, crescendo muito em
parceria de poder com os governos. Hoje
já se faz patrão das nações.
Também não ficaram esquecidas as tendências
naturais das pessoas. A atração pelos grandes centros urbanos e a absorção de
muitos e muitos milhões de trabalhadores para tarefeiros na construção do grande
projeto concentraram a maior fatia da Humanidade à volta das cidades. E as
multidões, encantadas pela grandeza, comodidade, beleza e fartura, de boa
vontade se fizeram clientes, aplicando nas compras todos os dinheiros que
ganharam nas tarefas em que foram absorvidos. Depois foram até convidados para
se endividarem em investimentos e consumos.
Talvez
se pensasse que o projecto se manteria autónomo, sustentado pela circulação dos
viveiros humanos à sua volta. Mas não aconteceu. Os lucros não se multiplicaram
na proporção dos cálculos previstos.
E a
aventureira arquitectura de utilizar os dinheiros aplicados mas ainda não
retornados, um activo em função passiva por atraso, como um novo capital para
novas iniciativas e novas fontes de riqueza, faliu. Esta aventura, o mesmo
dinheiro aplicado em duas ou mais operações, muito publicitada e utilizada
pelos bancos como um dinheiro de fartura e barato, está arrastando consigo muitas
pequenas e médias empresas e atirando para o desemprego milhões de trabalhadores.
Foi
uma machadada profunda na família humana. As
pessoas são vivas. Em cada dia precisam de assistência na alimentação, saúde,
educação e que o seu meio humano não se degrade. E tudo foi adiado. Foi um parar a vida à espera do equilíbrio
bancário.
2º
A resposta desonesta dos grandes do capital
Apesar
do desastre, um verdadeiro tsunami a nível económico, não se desfez nestes
«senhores» a energia da continuidade. E força-se um novo passo para superá-lo.
A crise tem mesmo esse significado.
Eis
os seus princípios básicos:
·
Toda a parte sã
do sistema capitalista é considerada modelar e intocável, incluindo os offshores
e os elevadíssimos ordenados e bónus para diretores e adjuntos. Esta é a cúpula
da nova sociedade super dirigida por «bolsos gordos», não por sócio
intelectuais, comprometidos com as comunidades humanas.
·
Todas as entidades
que, embora falidas, depois de recuperadas poderão tornar-se úteis, ganham
proteção. Assim bancos, como o nosso nos custos e prejuízos, o BPN, e todos os outros
sem liquidez, são revitalizados;
·
Ainda
personalidades, que surgem inexplicavelmente muito enriquecidas, não poderão
ficar à parte, em razão dos valores de que dispõem.
Uma
explicação para este oportunismo de recurso: Os tsunamis, pela sua natureza de
ondas avassaladoras, destroem as pegadas que foram o percurso de recolha da
riqueza. Também a muita burocracia à volta da legislação faz desaparecer
trilhos informativos. Por isso, nestas circunstâncias, fazer justiça e esperar
pelas suas decisões é inoportuno, infuncional e desmobilizador. A justiça não
sabe ser «atleta» nas correrias de avanço económico-financeiro.
3º
O Nosso Portugal
Portugal,
vítima do tsunami económico, uma tempestade que, neste último século, tem posto
à prova e em perigo muitas nações, tornou-se território a recuperar. A troika entrou
com a receita, que foi logo aceite e posta em execução. Expressa-se assim:
·
Arranjar liquidez
para que os bancos funcionem conforme as regras da retoma;
·
Pagar todas as
dívidas produzidas pela má gestão e desmandos das governações anteriores;
·
Cobrir, na medida
do possível, através dos bens privados dos empresários, os prejuízos bancários
provocados pelas falências das pequenas e médias empresas, vítimas dos
empréstimos dos dinheiros abundantes e baratos publicitados pelos bancos.
Curioso. Para estas situações a mesma «justiça
não atleta» é boa e é usada para apanhar todos aqueles que, dobrados pelas
dificuldades, não têm hipótese de fazer frente e reclamar o seu património
familiar. E o suicídio tem andado muito presente numa série de casos.
E como é feita a recolha de todos estes
valores?
A
recolha é feita indo sugar todas as
“gorduras” ao Estado e ao Povo Português, o povo simples que
trabalha, que fez a História Nacional, que vive nas cidades e disperso pelas
Autarquias, dando-lhes nome, vida, dignidade e protegendo o seu património. Ao
mesmo tempo encarecem todos os serviços e aumentam as contribuições:
·
Privatizam-se as
fontes e os recursos que garantem o sustento da nacionalidade, as chamadas
empresas públicas: energia, águas, transporte, comunicação, etc.. A EDP já
está. Explicando: Portugal, no seu território, fica cada vez mais em aluguer. O
sustentáculo da Nação passa para privados, instalados em offshores, mas
circulando na nossa terra e à nossa custa;
·
Forçam-se os
trabalhadores a serem mais produtivos, com ordenados mais baixos e aumenta-se o
desemprego;
·
Reduzem-se os
subsídios em favor dos carenciados o mais possível;
·
Reduzem-se as
despesas na educação, na saúde, na segurança social o mais possível. Tudo deve
passar para produto de marca branca;
·
Encarecem-se os
impostos diretos e indiretos;
·
Tornam-se todos
os serviços mais dispendiosos: luz, gás, transportes, etc.
Numa
palavra: estamos todos a ser conduzidos
para um Estado e um Povo modelares em «esqueleticismo».
4º
Que significa Governar Portugal?
O Artigo
1º da Constituição da República Portuguesa diz assim: “Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa
humana e na vontade popular e empenhada na construção de uma sociedade livre,
justa e solidária.”
Este
Artigo expressa: a identidade de Portugal, as bases da sua conduta e o projecto
na sua concretização.
Identidade: República soberana, com autoridade suprema no seu
território.
Bases
de conduta:
Dignidade da pessoa humana. Significa o valor supremo na cadeia da vida e o
fermento da cidadania. A pessoa é um ser unipessoal, individual, autónomo e
responsável. Por isso exige que o seu meio humano e social lhe garanta espaço e
condições de realização. A pessoa nasce
por direito. Não é um pedinte nem um intruso. E sua vida é um projeto.
Vontade popular. Nas eleições pretende-se que cada eleitor escolha
aqueles que mais se coadunam com o seu projeto de vida e que os eleitos sejam a
expressão mais generalizada das inquietações para o futuro nacional.
Mas
as eleições têm funcionado mal. Têm sido como quem vai à pesca: procura-se o
cardume e utilizam-se os engodos. As pessoas ficam nas redes como o peixe. As
liberdades eleitorais têm-se transformado em liberdades emaranhadas em jogos de
oportunismos.
Projeto: construir:
Uma sociedade livre. Isto significa uma sociedade com rumo, autonomia,
produto da consciência concreta do povo, um povo que deve viver acordado e em
contínua elaboração do seu futuro.
A
impressão que existe é que, em Portugal, tem funcionado de modo bem visível uma
caça livre à sociedade, não numa linha de conflitos, mas sim numa linha de
influências e oportunismos, um escavar por dentro à semelhança do caruncho nas
madeiras. Não se favorece o bom ambiente
para proteger as estruturas de autodefesa. Até os governos consideram-nas
inimigas e optam pelas oficiais, sempre subservientes.
Justa. É um conceito de distribuição de igualdade de oportunidades.
Neste
aspeto, Portugal tem sido um desastre. A vala entre os mais ricos e os mais
pobres é das mais profundas e em progressão. O postal mais representativo é a
realidade do nosso povo, cada vez mais de idosos. E convidam-se para emigrar as
pessoas produtoras de riqueza e de futuro, os trabalhadores jovens e não só,
gente intelectualmente e tecnicamente bem preparada, mas, desempregada. Se
trabalhassem de borla!... E o nascimento de crianças escasseia cada vez mais.
É
amargo ver Portugal, débil e de bordão, caminhar subordinado a uma disciplina
de austeridade. Até se fala em “trincar a língua”. Mas ninguém explica como é que isto serve de ensaio para um futuro de
esperança.
Solidária. É o exercício de dar as mãos, o incorporar a
sociedade nas riquezas do território e do seu dinamismo. É o desenvolver as
habilitações do entendimento, entreajuda e ambiente de partilha, porque o pão é
de todos e para todos, devendo ser distribuído por cada um.
Encanta-nos
o comportamento solidário do povo no matar a fome e amparar do frio os que vão
sendo empurrados para a berma. Mas a verdadeira solidariedade é fazer com que
todos estejam de pé, com sustento garantido, fruto do seu suor ou da sua reforma, um corpo social em plena
saúde, função e, de fronte erguida, caminhando em frente.
Este Governo da Nação
O nosso
governo é o grupo que recebeu do povo esta responsabilidade. É o timoneiro. Não
conduz um comboio ou barco em direção ao mercado. Mas conduz um povo no seu
território, utilizando e desenvolvendo o seu património económico na
concretização do seu projeto
O
governo está todo preenchido. Não tem falta nem de instalações, nem de quadros,
nem de vencimentos. Mas está muito ocupado em disfarces e envenenamentos de
função.
Infelizmente
não estamos a ser governados pelos eleitos. Estamos sim a ser conduzidos pela Troika, que se colocou acima e faz do
governo o seu serviçal controlador do povo. Nós, os eleitores, sentimo-nos
postos de joelhos perante o cofre que reclama a satisfação do seu apetite: encher-se.
Isto
inquieta e faz pensar que os membros do governo estão a fazer simplesmente um
tirocínio de promoção. Após o período de governar serão avaliados pelo valor
das empresas que passaram do bem público para mãos de privados e receberão um
bom “valor profissional de mercado”, talvez a gestão de algumas dessas mesmas
empresas.
5º
O crime do dinheiro concentrado, como senhor absoluto
O dinheiro
concentrado em poucas mãos de privados, os quais se consideram os donos
absolutos do mesmo, acrescidos do direito de circular em busca das novas fontes
de riqueza e de impor ordens às nações, transporta
em si profundas ofensas ao Direito Natural (direitos ambientais do Planeta) e à
Dignidade Humana:
·
É um assalto à
riqueza, Património da Humanidade;
·
É uma inversão ao
valor da função de mercado e uma comercialização da Vida;
·
E é uma
autoridade sem título, como acima foi exposto.
Assalto à riqueza, Património da Humanidade
Sabemos
que o viver dos povos, desde há muitos milénios, foi sempre um “vale de
lágrimas” em opressões, perseguições e guerras nos conflitos entre si. Ao mesmo
tempo, na subjugação interna das comunidades, cuja organização assentava sempre
na escravatura humana, funcionavam rígidas disciplinas com muitas flagelações,
mutilações e mortes. E os poderosos, controlando o povo pela trela curta e
vigiada, sempre dispuseram de toda a riqueza.
Mesmo
depois da abolição da escravatura, depois da implantação das democracias e do
reconhecimento da Dignidade da Pessoa Humana, as riquezas desenvolvidas pela
inteligência e labor humanos existentes continuaram presas e possuídas por quem
as detinha. E o povo, o senhor do
Direito, o continuador da Vida, foi
mantido à distância.
Agora,
no jogo desta crise, as poucas riquezas que os trabalhadores conseguiram
conquistar através das lutas sindicais, são arrebatadas como “gorduras”. É o
retomar do passado. A Dignidade Humana e
a Cidadania estão sendo substituídas por uma ambição globalizante e
centralizadora, que tenta absorver e anular o valor monetário do trabalho, como
expressão e modo de vida dos povos.
A
revista “Visão”, de 7 de Julho de 2011, dizia que “1% da população mundial
detinha 57% da propriedade global”. Isto diz-nos que 99% da Humanidade vive
enclausurada na fatia de 43% da riqueza existente. Pela documentação disponível
é uma verdade científica. E a
inquietação cresce na medida em que o aperto se torna maior.
Segundo
a FAO, actualmente 75% dos alimentos mundiais são gerados por apenas 12 plantas
e 5 espécies de animais. A restante riqueza vai desaparecendo, porque, segundo
o capital, não dá lucro. O mundo dos Reinos Vegetal e Animal vai sendo reduzido
aos produtos lucrativos de mercado.
A
19 de Janeiro último a TVI, no noticiário das 24 horas, dizia que a Europa tem
79 milhões de pobres e desperdiça metade dos alimentos.
Como
aceitar que 1% da Humanidade, gente
do nosso tamanho e do nosso tempo, que não têm mais vida do que nós, (somos um
simples elo de ligação entre a geração dos nossos pais e a dos nossos
descendentes), se armem em proprietários
da realidade planetária, a Terra, o estojo da Vida, e o triture tanto?
A Vida tem milhões e milhões de anos e está
atrelada ao Tempo, que avança pressuroso e pujante em direção a um Futuro,
continuamente atraente e cheio de esperança. O Futuro sempre foi um espaço aberto de sonho, projeto e confiança.
Porém,
agora, o futuro apresenta-se cinzento e opaco, porque estes «senhores» sentaram a sua economia globalizante no
agora, a parte mais fresca do Tempo, e colocaram os seus olhos aferrados à
balança, por onde entendem que tudo tem de passar.
A
que título? Com que Direito? Como aceitar milhões
de anos de vida, de trabalho e de dignidade postos nas garras de um pequeno
grupo de pessoas que se consideram «os alguéns» do agora?!...
Parece que este neoliberalismo não é
mais que uma praga na Humanidade, à
semelhança do escaravelho dos palmares, que vai matando as palmeiras pela
cúpula. Também assim vai acontecendo às comunidades humanas. Em cada cidade crescem
grandes grupos de empobrecidos que, cada vez mais, se sentem empurrados para o
desfiladeiro da marginalização e exclusão social.
Inversão ao valor da função de mercado e
a comercialização da Vida
O
mercado tem por função fazer circular os produtos de consumo e de convivência
para que o desenvolvimento e a solidariedade social se façam. São as pessoas e
as pequenas e médias empresas a interligar-se. O dinheiro circula, vivifica e
mantem-se. É a vivência autárquica ou
regional de pé na geografia habitacional. O mercado é um serviço, não uma
entidade superior.
A
opção pelas grandes cidades sob o domínio dos grandes negócios, na ideia de
concentrar a riqueza e de ganhar poder de domínio, está transformando o tecido humano em formigueiros de súbditos,
despersonalizando e despromovendo as pessoas, destruindo tudo o que é cidadania
de cariz humano em favor da cidadania dos centros comerciais, onde o consumo
ganhou a primazia.
Socialmente está sendo anulada a
conhecida classe média, de espírito
criativo, proprietária e condutora das pequenas e médias empresas, exercendo as
grandes profissões de apoio e promoção das pessoas na educação, na saúde, na
ciência, na arte, cultura e música, e sendo responsável por imensos encargos
sociais.
Os dinheiros que alimentavam como fundos de maneio as cidades, as empresas, a vida familiar e social
das pessoas, foram absorvidos e canalizados para os grandes shoppings das multinacionais.
Ao
mesmo tempo, com chorudos investimentos, o
mercado promoveu a comercialização na área da vida das pessoas. A
alimentação, a saúde, a educação, a casa e o ambiente são espaços de vida, cujos
benefícios não são lucros económicos, mas sim direitos e condições para as
pessoas disporem da saúde social e se realizarem como pessoas habilitadas, funcionais,
rentáveis e responsáveis. Tudo isso, porém, entrou na linha dos investimentos
do capital, na procura de lucros, juros móveis, que, não cobertos, entram em
penalizações arrepiantes. Nem a perda da saúde, nem a perda do trabalho ou um
desastre na estrada travam esta progressiva exploração.
Dói muito ver o povo de cara sombria,
respirar dúvidas, angústias, frustrações e até desesperos, porque vivem sem
dinheiro e sem trabalho, cercados de dívidas e com a vida e a família à sua
responsabilidade.
Estamos
perante um problema social gravíssimo e
é o criminoso quem lidera a situação. Será que pretende que o Planeta
funcione à semelhança da colmeia, onde uma multidão de abelhas, solteironas e
estéreis, trabalham intensamente ao serviço da rainha e, após umas semanas de
vida, morrem extenuadas?!
6º
A Dignidade Humana e a Cidadania dos Povos
Vivemos
no Planeta Terra, o planeta vivo, casa e horta da Humanidade.
A riqueza significa a inteligência
criativa das pessoas em mistura com o suor dos trabalhadores e em parceria com
os bónus naturais que o Planeta fornece. Pela sua natureza múltipla tornou-se no pão das pessoas, no
sustentáculo da Dignidade Humana e no promotor da Cidadania.
A riqueza nunca é individual. É sempre um elo entre as pessoas e a Natureza. E,
pela sua caraterística histórica, incorpora em si um veio de imensos valores,
património das inúmeras gerações que a antecederam.
O dinheiro tem muita analogia com o
sangue humano. É o sangue social das
pessoas como membros das comunidades, o qual se transformou no sustentáculo
da sua vida, mobilidade, desenvolvimento e promoção.
O
dinheiro é um bem comunitário com a liberdade fresca que a vida tem. Não
significa irresponsabilidade, mas recusa senhorio.
Cada
terra tem um valor económico concreto, fruto de todo o seu desenvolvimento, o
qual deve ser tido e mantido como património
local e fundo de maneio vivencial.
Nós,
enquanto pessoas, somos indivíduos autónomos. Por essa razão surge o respeito
pelo direito à propriedade pessoal ou familiar, o poder de acumular algo para
proteção do futuro e descendentes.
Após
a família surge o crescimento social. Primeiro as comunidades locais e
autárquicas, depois as comunidades regionais, nacionais e, por fim, a
Comunidade Humana no Planeta.
Esta
hierarquização no crescimento social é o enquadramento natural de todas as
realidades na sua articulação e expressividades vivas, situadas no espaço e no
tempo.
Temos
de ter a consciência muito bem desperta para que os fundos de maneio das famílias, das comunidades e autarquias, das
comunidades regionais ou nacionais não se transformem em reservas a favor de
governos, nem em bens que poderão ser armadilhados por grupos económicos, que
se arrogam o direito de se instalarem onde melhor lhes convém e fixarem os seus
apetites num pleno à-vontade liberal.
A
Vida e a Natureza têm estatuto próprio natural e com exigências de
comportamento obrigatório. O
desenvolvimento não pode ser feito por via da violação dos grandes princípios
que a Vida e a Natureza nos impõem.
7º
Conclusão
A
Declaração Universal dos Direitos da Pessoa Humana, no seu Artigo 2, recusa
qualquer privilégio, benefício ou prejuízo em favor ou contra a pessoa, em
razão da sua origem social, da sua fortuna ou nascimento.
A
Constituição da República Portuguesa, depois de afirmar, no Artigo 3º, que ”a soberania, una e indivisível, reside no
povo”, no seu Artigo 13.2, expõe a mesma doutrina: “ ninguém pode ser
privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento
de qualquer dever, em razão da sua ascendência…situação económica, condição social…”
Infelizmente estes direitos, liberdades
e garantias encontram-se sem trânsito perante as redes de outras atividades em
circulação. E o povo, súbdito, serviçal, continua sendo um manancial de riqueza
numa retratada e desonesta exploração.
As
reclamações que as pessoas fazem, por mais justas que sejam, na sua grande
maioria morrem sufocadas.
As
contribuições e impostos que pagamos poucas vezes beneficiam a defesa dos
direitos de cidadania. As legislações são preparadas com brechas, por onde se
escoam o bem público e os direitos base das comunidades.
Votar tem significado,
não poucas vezes, escolher o novo inimigo oficial. Isso tem ficado bem
expresso na percentagem dos não votantes nas eleições. Votar para quê? Para o
empobrecimento das pessoas e a degradação das comunidades?
Governar
não pode reduzir-se a trepadeiras sufocantes sobre a sociedade, apoiadas em
maiorias absolutas. A doença das maiorias absolutas nos governos apaga sempre
as reflexões mais profundas. E os problemas do povo ficam sempre adiados. Ao
contrário, exigem-se sacrifícios enormes aos mais débeis, para favorecer
privilegiados. Somos tão tolos que até consideramos “passos acertados” virem
entidades, que não nos pagam contribuições, explorarem as nossas tarefas
lucrativas.
Governar é um serviço obrigatório, não
um benefício. E a função da “coisa pública” tem que acertar na sua resposta.
Há
que dinamizar os direitos e as defesas do povo, não para dispensá-lo das suas
obrigações, mas para repor a sua dignidade. É preciso desfazer regras,
disciplinas, burocracias e jogos em funções de assembleias, que simplesmente
consertam e reforçam as redes que aprisionam as pessoas, mas que lhes cortam os
acessos aos benefícios.
Doí-nos pertencer a um pais de velhos,
sem trabalho e sem crianças, importando 70% dos produtos que consumimos e
exportando os trabalhadores. Será isto, por ventura, um postal que se
apresente? Basta de borrar o nosso Portugal.
Queremos
o nosso povo acordado, vivo, de mãos dadas no trabalho e confiante. Temos que acertar no sucesso.
Câmara
de Lobos, 16 de Maio de 2012
Mário
Tavares Figueira
BI nº 002 112 037 Contribuinte nº 105 743 410
mariotavares@netmadeira.com
2 comentários:
Cá está um importante documento. Duvido que as entidades endereçadas lhe dediquem atenção. Fica-nos para nós, os que o lemos, a instrução e a advertência. Confrange-me que pessoas tão válidas, interessadas, cultas, obreiras na Igreja madeirense estejam "retiradas", não seja aproveitado o tanto que sabem na formação de leigos e até de Sacerdotes (cada vez mais temos sacerdotes-de-linha-de-montagem). É uma opção que alguns terão de dar contas. Quanto ao P. Mário, que a lucidez e a saúde lhe seja conservada para que, de tempos em tempos, possamos ter uma opinião excelente sob os olhos.
Excelente contributo para meditação pelos poderes públicos instalados no sofá do comodismo, com a consciência acomodada aos pratos de lentilhas que vão surgindo para os apologistas da resignação e da capitulação.
Quem tem consciencia dos males que atravessamos, quem é lúcido, clarividente, não pode ficar calado. Calar é cometer o crime de «omissão de denúncia»!
O país não é mais do que o reflexo da corrupção e do oportunismo reinentes urbi et orbi. Uma Nova Ordem Económica está no horizonte: com sangue ou sem ele, a única dúvida que persiste!
Enviar um comentário