Comensal
divino:
500 anos
da Dedicação da Sé do Funchal (1517-2017)
1. A Sé Catedral do Funchal, entre
todas as igrejas da Madeira, é a principal. Desde 1910, foi classificada como
Monumento Nacional. Devem ser raros, muito raros, os madeirenses que não falem
da sua Sé com carinho e até muitos não admitem vir à cidade sem que não
reservem um tempinho para visitar a Sé. Os turistas também não sabem estar na
cidade sem colocarem o pé dentro da Sé. A Sé é o coração da cidade, ela impõe-se
aos cidadãos e a todos que no Funchal circulam. Ninguém precisa de buscá-la é
ela que se oferece, é ela que nos procura e nos convida a entrar em si, para
que entremos depois em nós.
2. A primeira vez a sério,
digamos assim, que entrei na nossa Sé, ela me «encontrou», tinha eu 11 ou 12
anos, por ocasião de uma visita de estudo pela mão da minha saudosa professora
de geografia do secundário. Um momento único que eu guardo com a maior das
saudades. Após a participação na missa, lá fomos em grupo saboreando as
palavras e enchendo os olhos pelas suas naves e parando aqui e ali nas diversas
capelas que a compõem. Eis o sinal de paragem demorada nas capelas do Amparo e do Santíssimo Sacramento, ou
ainda, a título de exemplo, os altares do Senhor Bom Jesus e de S. António,
como pedaços de uma revelação sublime que a professora sábia alimentava nas suas
pequeninas almas que a rodeavam.
3. O valor histórico, arquitectónico
e artístico, da nossa Sé, destaca-se no retábulo da capela mor, um pequeno sobrecéu
espectacular que nos toma a visão e que quase nos levita tomados pela soberba
talha dourada, onde sobressaem as pequenas esculturas de pequenas dimensões e
as pinturas a óleo sobre madeira. Este retábulo foi mandado fazer pelo Rei D.
Manuel em 1510-1515. Dizem as crónicas, que é o único retábulo existente na íntegra
e que permanece no seu local de origem do período manuelino.
4. A Sé Catedral do Funchal foi
mandada construir pelo Rei D. Manuel para dar lugar à Igreja de Nossa Senhora
do Calhau, primeira igreja paroquial da ilha, o seu arquitecto foi Pêro Anes,
mestre das obras reais. A estrutura da Sé é quase toda em estilo gótico, tem
uma planta em cruz, com três naves. Foi a Igreja grande como lhe chamavam os
fiéis desse tempo, estava situada junto do Largo do Duque. Foi dedicada em 1517
a nossa Senhora da Assunção, que dará origem à maior devoção da ilha da Madeira
com título de Nossa Senhora do Monte, que perdura até aos nossos dias com
grande expressão na Paróquia de Nossa Senhora do Monte. Outro dado interessante
é que sob os auspícios desta Igreja Catedral do Funchal, o Papa Leão X,
instituirá o bispado do Funchal, que na época se tornou a maior diocese do mundo,
porque englobava os territórios descobertos pelos portugueses, desde o Brasil
até ao Japão.
5. Outro elemento de grande valor
é o tecto da Sé do Funchal. Tecto de alfarge, um dos mais belos de Portugal,
feito em madeira de cedro da ilha e trabalhado ao gosto mudéjar com douramentos
e incrustações em marfim, bem como os retábulos do séc. XVI e os azulejos do
séc. XVIII. É também considerado pelos entendidos e a professora também o
referiu, que os seus autores se inspiraram no fundo das naus que rasgavam as
águas dos «mares nunca dantes navegados» ao tempo das descobertas. O tesouro da
Sé também sobressai em beleza e valor histórico. Podem ser apreciadas a maioria
das peças no Museu de Arte Sacra do Funchal. Entre a panóplia de pratas e
dourados, destaca-se a cruz processional em prata dourada oferecida pelo Rei D.
Manuel I e atribuída a Gil Vicente.
6. A Sé, como lhe chamam os
madeirenses, pelo seu valor e carinho, é toda branca de sol divino, que aparece
naquele lugar onde o céu sorri e a paz acontece no sonho das almas que cruzam o
seu pórtico. As brumas que as almas carregam, lá dentro viram a aurora raiar
como luz nas velas cintilantes sobre os seus altares e no alimento do pão da
missa, que nos seus 500 anos interligou o céu e a terra. A Sé é o lugar do
descanso das almas, é mistério antigo que renova a estrada e retempera das
canseiras do quotidiano todas as almas. É lugar da arte, é verdade, mas é acima
de tudo, o lugar da descoberta de Deus para o encontro da fraternidade humana.
7. A nossa Sé é como um
astro glorioso no coração dos madeirenses, que os tem guiado nas curvas, nas subidas
e descidas íngremes que constituem as encostas e os vales da nossa Diocese do
Funchal. A Sé que me descobriu, foi e é aquele primeiro lugar sagrado deste
mundo que me mostrou a estrada do céu, onde tantas vezes me abriguei os meus
olhos cansados, que no aconchego grandioso receberam a bênção de Jesus. Assim,
500 anos da nossa Sé são 500 anos da vida de Jesus entre nós, que com as
perplexidades da história, deu a comer o Pão vindo do céu e anunciou a Palavra segura
do amor do Evangelho, sem que faltasse, também nos vetustos 500 anos, a palavra
que denunciou toda a exploração do mundo, que teimava sanear pela exploração os
filhos da Sé. É, por isso, a Sé do Funchal é como uma «mãe». Todos os
madeirenses sabem muito bem o que isso é. Parabéns à Sé.
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