Excerto do discurso do Papa Francisco no encontro com o Comité de Coordenação do Celam no
Centro de Estudos do Sumaré…
Clareza e fundamentação q. b. no «ver, julgar e
agir». Obviamente que as referências circunstanciais são aplicadas à América
Latina, mas depois de lermos serve como uma luva para a Igreja na Europa, no
mundo, na Diocese, na Paróquia, no grupo ou movimento qualquer… A meu ver o
mais importante discurso do Papa Francisco até agora. Marcadamente voltado para
o interior da Igreja e com propostas de desafios à Igreja inteira para deixar a
redoma e sair para a rua. Aqui na nossa Diocese, tínhamos um projecto de
diálogo e de celebração da fé na capela do Corpo Santo, na Zona Velha da cidade
do Funchal. Foi travado por quem prefere o poder quero, posso e mando… Mesmo à
moda da «(ma)Madeira». Graças a Deus o Papa Francisco, veio dar a razão a quem
a tinha. Foi pena que esta iniciativa tenha morrido à nascença por falta de esforço
de compreensão. Bom, agora chega-nos uma belíssima reflexão de onde menos esperaríamos. Serve
então, para ler, rezar e confrontarmo-nos a todos com esta leitura tão
assertiva da realidade da Igreja, para que a mudança seja possível para o bem da fé na Pessoa de Jesus Cristo, que transforma o mundo e a vida para a felicidade, todo o bem e para justiça...
Diálogo com o mundo atual
Faz-nos bem lembrar estas palavras do Concílio
Vaticano II: As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos
homens do nosso tempo, sobretudo dos pobres e atribulados, são também alegrias
e esperanças, tristezas e angústias dos discípulos de Cristo. Aqui reside o
fundamento do diálogo com o mundo atual.
A resposta às questões existenciais do homem de hoje, especialmente das novas gerações, atendendo à sua linguagem, entranha uma mudança fecunda que devemos realizar com a ajuda do Evangelho, do Magistério e da Doutrina Social da Igreja. Os cenários e areópagos são os mais variados. Por exemplo, em uma mesma cidade, existem vários imaginários coletivos que configuram “diferentes cidades”. Se continuarmos apenas com os parâmetros da “cultura de sempre”, fundamentalmente uma cultura de base rural, o resultado acabará anulando a força do Espírito Santo. Deus está em toda a parte: há que saber descobri-lo para poder anunciá-lo no idioma dessa cultura; e cada realidade, cada idioma tem um ritmo diferente.
A resposta às questões existenciais do homem de hoje, especialmente das novas gerações, atendendo à sua linguagem, entranha uma mudança fecunda que devemos realizar com a ajuda do Evangelho, do Magistério e da Doutrina Social da Igreja. Os cenários e areópagos são os mais variados. Por exemplo, em uma mesma cidade, existem vários imaginários coletivos que configuram “diferentes cidades”. Se continuarmos apenas com os parâmetros da “cultura de sempre”, fundamentalmente uma cultura de base rural, o resultado acabará anulando a força do Espírito Santo. Deus está em toda a parte: há que saber descobri-lo para poder anunciá-lo no idioma dessa cultura; e cada realidade, cada idioma tem um ritmo diferente.
Algumas tentações contra o discipulado missionário
A opção pela
missionariedade do discípulo sofrerá tentações. É importante saber por onde
entra o espírito mau, para nos ajudar no discernimento. Não se trata de sair à
caça de demônios, mas simplesmente de lucidez e prudência evangélicas.
Limito-me a mencionar algumas atitudes que configuram uma Igreja “tentada”.
Trata-se de conhecer determinadas propostas atuais que podem mimetizar-se em a
dinâmica do discipulado missionário e deter, até fazê-lo fracassar, o processo
de
Conversão Pastoral.
1. A ideologização da mensagem evangélica. É uma tentação que se
verificou na Igreja desde o início: procurar uma hermenêutica de interpretação
evangélica fora da própria mensagem do Evangelho e fora da Igreja.
Um exemplo: a dado momento, Aparecida sofreu essa
tentação sob a forma de assepsia. Foi usado, e está bem, o método de “ver,
julgar, agir”. A tentação se encontraria em optar por um "ver"
totalmente asséptico, um “ver” neutro, o que não é viável. O ver está sempre
condicionado pelo olhar. Não há uma hermenêutica asséptica. Então a pergunta
era: Com que olhar vamos ver a realidade? Aparecida respondeu: Com o olhar de discípulo.
Assim se entendem os números 20 a 32. Existem outras maneiras de ideologização
da mensagem e, atualmente, aparecem na América Latina e no Caribe propostas
desta índole. Menciono apenas algumas:
a) O reducionismo
socializante. É a ideologização mais fácil de descobrir. Em alguns momentos,
foi muito forte. Trata-se de uma pretensão interpretativa com base em uma
hermenêutica de acordo com as ciências sociais. Engloba os campos mais
variados, desde o liberalismo de mercado até a categorização marxista.
b) A ideologização psicológica. Trata-se de uma hermenêutica elitista que, em última análise, reduz o “encontro com Jesus Cristo” e seu sucessivo desenvolvimento a uma dinâmica de autoconhecimento.
b) A ideologização psicológica. Trata-se de uma hermenêutica elitista que, em última análise, reduz o “encontro com Jesus Cristo” e seu sucessivo desenvolvimento a uma dinâmica de autoconhecimento.
Costuma verificar-se principalmente em cursos de espiritualidade, retiros
espirituais, etc. Acaba por resultar numa posição imanente autorreferencial.
Não tem sabor de transcendência, nem portanto de missionariedade.
c) A proposta gnóstica. Muito ligada à tentação anterior. Costuma ocorrer em grupos de elites com uma proposta de espiritualidade superior, bastante desencarnada, que acaba por desembocar em posições pastorais de “quaestiones disputatae”. Foi o primeiro desvio da comunidade primitiva e reaparece, ao longo da história da Igreja, em edições corrigidas e renovadas. Vulgarmente são denominados “católicos iluminados” (por serem atualmente herdeiros do Iluminismo). Uma gnose a partir da qual se interpreta o Evangelho e a vida pastoral. Com o início do pontificado, chegam cartas, propostas, inquietudes de fiéis e católicos, com desejos: de que se casem os padres, que se ordenem as freiras, que se dê a comunhão dos divorciados. Não vão ao problema de fundo real, mas a estas pequenas posturas ilustradas que nascem precisamente deste tipo de hermenêutica. [trecho improvisado do discurso]
d) A proposta pelagiana. Aparece fundamentalmente sob a forma de restauracionismo. Perante os males da Igreja, busca-se uma solução apenas na disciplina, na restauração de condutas e formas superadas que, mesmo culturalmente, não possuem capacidade significativa. Na América Latina, costuma verificar-se em pequenos grupos, em algumas novas Congregações Religiosas, em tendências para a “segurança” doutrinal ou disciplinar. Fundamentalmente é estática, embora possa prometer uma dinâmica para dentro: regride. Procura “recuperar” o passado perdido.
c) A proposta gnóstica. Muito ligada à tentação anterior. Costuma ocorrer em grupos de elites com uma proposta de espiritualidade superior, bastante desencarnada, que acaba por desembocar em posições pastorais de “quaestiones disputatae”. Foi o primeiro desvio da comunidade primitiva e reaparece, ao longo da história da Igreja, em edições corrigidas e renovadas. Vulgarmente são denominados “católicos iluminados” (por serem atualmente herdeiros do Iluminismo). Uma gnose a partir da qual se interpreta o Evangelho e a vida pastoral. Com o início do pontificado, chegam cartas, propostas, inquietudes de fiéis e católicos, com desejos: de que se casem os padres, que se ordenem as freiras, que se dê a comunhão dos divorciados. Não vão ao problema de fundo real, mas a estas pequenas posturas ilustradas que nascem precisamente deste tipo de hermenêutica. [trecho improvisado do discurso]
d) A proposta pelagiana. Aparece fundamentalmente sob a forma de restauracionismo. Perante os males da Igreja, busca-se uma solução apenas na disciplina, na restauração de condutas e formas superadas que, mesmo culturalmente, não possuem capacidade significativa. Na América Latina, costuma verificar-se em pequenos grupos, em algumas novas Congregações Religiosas, em tendências para a “segurança” doutrinal ou disciplinar. Fundamentalmente é estática, embora possa prometer uma dinâmica para dentro: regride. Procura “recuperar” o passado perdido.
2. O funcionalismo. A sua ação
na Igreja é paralisante. Mais do que com a rota, se entusiasma com o “roteiro”.
A concepção funcionalista não tolera o mistério, aposta na eficácia. Reduz a
realidade da Igreja à estrutura de uma ONG. O que vale é o resultado palpável e
as estatísticas. A partir disso, chega-se a todas as modalidades empresariais
de Igreja. Constitui uma espécie de “teologia da prosperidade” no organograma
da pastoral.
3. O clericalismo é também uma
tentação muito atual na América Latina. Curiosamente, na maioria dos casos,
trata-se de uma cumplicidade viciosa: o sacerdote clericaliza e o leigo lhe
pede por favor que o clericalize, porque, no fundo, lhe resulta mais cômodo. O
fenômeno do clericalismo explica, em grande parte, a falta de maturidade adulta
e de liberdade cristã em boa parte do laicato da América Latina: ou não cresce
(a maioria), ou se abriga sob coberturas de ideologizações como as indicadas,
ou ainda em pertenças parciais e limitadas. Em nossas terras, existe uma forma
de liberdade laical através de experiências de povo: o católico como povo. Aqui
vê-se uma maior autonomia, geralmente sadia, que se expressa fundamentalmente
na piedade popular. O capítulo de Aparecida sobre a piedade popular descreve,
em profundidade, essa dimensão. A proposta dos grupos bíblicos, das comunidades
eclesiais de base e dos Conselhos pastorais está na linha de superação do
clericalismo e de um crescimento da responsabilidade laical.
Poderíamos continuar descrevendo outras tentações
contra o discipulado missionário, mas acho que estas são as mais importantes e
com maior força neste momento da América Latina e do Caribe.
Amanhã publico a última
parte do discurso…
1 comentário:
Padre José Luís, Amigo e Irmão que grande serviço está o seu Blogue a prestar à Igreja e ao Mundo. Não conhecia este discurso do Papa Francisco é altamente revolucionário. Oxalá que fosse acolhido por todos nós os que estão dentro e fora da Igreja. Penso que Papa está reevangelizar o Mundo e a Igreja. Obrigado!
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