Haim Baharier
nasceu em Paris, de pais judeus polacos, que passaram ambos pelo horror de
Auschwitz. Vive em Milão, Itália.
Foi aluno de
Emmanuel Levinas, um dos maiores filósofos do século XX, e de Léon Ashkenazi, o
pai do renascimento do pensamento judaico na França
Comerciante
matemático e psicanalista, mas também de consultor precioso e negócios, há
anos que pratica uma exegese bíblica, na qual a cabala e o comentário talmúdico
se entrelaçam.
Em conversa com
Antonio Gnoli, do jornal La Repubblica, em 20 de janeiro de
2017, faz uma leitura nova das histórias do Dilúvio universal, da Arca de
Noé e da Torre de Babel.
«Por um lado, há
a humanidade que será afogada no Dilúvio universal e, de outro, está Noé, que
se salvará numa arca. O que essa Arca representa? Arca, em hebraico teva,
também significa «palavra». No texto, relatam-se as medidas da Arca: altura,
comprimento, largura. Os valores numéricos (em hebraico, as letras também
servem como números) correspondem à palavra «linguagem». Noé, que se salva, é o
antepassado de Abraão, que, por meio da linguagem e da palavra, inaugura a
identidade judaica. Nesse sentido, a história do Dilúvio e da salvação
representam as origens arcaicas dessa identidade.
É como um ato de
fundação, e, como tal, requer o nascimento de uma nova linguagem. A velha
linguagem serviu para contornar a punibilidade das leis, para encobrir a
verdade, e não para a revelar. Hoje, conhecemos perfeitamente o que é a
manipulação da linguagem, o uso das palavras que nos afastam da verdade.
Então, o
naufrágio de que a Bíblia fala tem algo em comum com o nosso naufrágio?
O grande
naufrágio do nosso mundo tem muito que ver com o Dilúvio. A história do Dilúvio
é comum a muitíssimas civilizações e religiões. No entanto, a narrativa bíblica
se diferencia das outras na medida em que insiste em como nos salvamos da
catástrofe.
Depois do
Dilúvio, temos a história da Torre de Babel. O que significa essa sequência?
Reforça a
história anterior. O texto bíblico fala de uma cidade em construção, cujos
construtores parecem prisioneiros de uma linguagem composta por palavras únicas
comuns. Nessa cidade, que não reconhece as virtudes da diversidade, não há
línguas diferentes. Há uma língua vertical, monolítica e ameaçadora, que impede
o desenvolvimento horizontal das línguas plurais. A Torre de Babel, em última
análise, mostra o nascimento da linguagem absolutista. Nessa linguagem, já
estão presentes implicitamente todos os totalitarismos e os fascismos da
história.
A Torre de Babel
é o fim da ilusão do “como seria bom se todos falássemos a mesma língua”.
Isso não é nada bom, isso anula o tempo da reflexão, da aprendizagem, da
dúvida, da contradição. A incompreensão generalizada no nosso mundo conectado
na rede é a versão atual da Torre de Babel. Estamos novamente mergulhados na
ignorância da diferença entre linguagem e língua.
Publicado por Fraternitas
Movimento
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