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terça-feira, 26 de março de 2013

A mudança para melhor descobrir Deus

Semana Santa - para reacender a esperança
Permitam que partilhe convosco as seguintes «pérolas», tiradas do Jornal Público de Domingo que nesta edição dominical, vinha recheado de reflexão religiosa. O que considerei essencial na leitura apurada que fiz da entrevista belíssima ao padre Tolentino Mendonça, nosso conterrâneo e na Crónica habitual de Frei Bento Domingues. Aqui vai:

Padre Tolentino Mendonça, in Publico de 24 Março de 2013
«Porque a diversidade dos caminhos é uma riqueza para dizer quem é Deus. O divino é uma cantata não é uma melodia».

«Antes de tudo, no seu discurso os pobres são literalmente os pobres e depois são todas as pobrezas. Porque todos somos seres feridos, temos pobrezas, carências – a procura de Deus é também uma inquietação, uma sede, uma fome, a fome de sentido, de razões de viver. Tudo isso mostra a pobreza da condição humana com a qual Igreja tem de dialogar».

«Até que ponto ele vai ter coragem para reformar a Cúria e enfrentar estes escândalos que a Igreja enfrenta, como a pedofilia ou a corrupção? Como é que se reforma uma realidade tão complexa e tão vasta como a Igreja? Não é por decreto, certamente. Mas a grande reforma acontece pela emergência de um novo modelo, de uma nova gramática, de um novo paradigma. E penso que é aí, na criação de um novo exemplo, que ele vai investir tudo».

«Que mudanças julga serem prioritárias neste momento?
Eu diria cinco mudanças. A primeira é uma mudança de comunicação. A Igreja Católica precisa de um projecto de comunicação, que não é da ordem do marketing, mas uma capacidade de tornar legível e perceptível o que ela é e de apostar muito mais numa comunicação directa. Mesmo o cristão médio, com formação, tem dificuldade em ler uma encíclica do Papa. Há um défice de autocompreensão no interior da Igreja. Às vezes parece que a Igreja não precisa de se fazer entender, mas precisa. Este esforço é muito um esforço de tradução.
Não é só um esforço de mediação, é um problema que vem de dentro.
Sim, é algo que tem a ver com a cultura interna e também um problema de fora. Depois há um problema de estruturação, que nos leva ao segundo desafio, que é o da comunhão, encontrar um modelo de cooperação mais comunional entre Roma e as dioceses, valorizar mais o papel das conferências episcopais. O terceiro desafio parece-me ser o da relação da Igreja com o mundo, a Igreja ser capaz novamente de fazer aquele exercício que a Gaudium et Spes fazia no Concílio Vaticano II [documento do Concílio sobre as relações entre a Igreja e o mundo]: perguntar ao mundo o que espera da Igreja e colocar-se numa posição de diálogo de proximidade com o mundo, procurando compreender. O que tem sido o projecto do Átrio dos Gentios tem de contaminar a evangelização e o modo como a Igreja se situa no mundo, que tem de ser muito mais uma escuta mútua. A Igreja tem de entrar num tempo de audição do mundo para poder dimensionar a proposta que faz. O quarto grande desafio é a igreja ser capaz de dialogar com as culturas juvenis emergentes. Os jovens são talvez aqueles que protagonizam mais radicalmente a emergência de uma nova época. São nativos digitais. Têm outra cultura e outra maneira de pensar o humano e a Igreja para se renovar precisa de acompanhar as novas culturas juvenis. O outro grande desafio é o da esperança. O respaldo destas palavras do Papa, quando diz não tenham medo da bondade, é extraordinário. A grande missão da Igreja é devolver ao oceano gelado do nosso coração uma palavra de esperança e ser capaz de ser serva da esperança. Estes desafios ligam-se a tudo o resto, porque há um tempo para acorrer às dificuldades concretas, mas a Igreja não precisa só de correcção, precisa também de inspiração».

Frei Bento Domingues, Público, 24 Março de 2013:

«Deus é absoluto, mas nenhuma religião pode pretender ser absoluta. Todas têm fronteiras».
Equívoco:
«É importante desfazer um equívoco grave, para não se cair numa interpretação que nega o próprio sentido das narrativas e das cristologias do Novo Testamento. Supõe-se que esses textos foram escritos para afirmar privilégios e fundar um povo, uma Igreja de privilegiados: Cristo é único e é só nosso; se o quiserem encontrar têm de passar por nós!
O que é particular à pessoa de Jesus, a sua absoluta característica, não tem nada a ver com esse equívoco: Jesus, na sua prática histórica, remete para um Deus que não é propriedade privada nem Dele nem de ninguém. É o Deus do livre amor por todos os seres humanos, sem restrição. O Deus de Jesus também não pode ser privatizado nem sequer pelos cristãos. Por outro lado, Jesus, na sua prática histórica, surge polarizado por todos os seres humanos, sejam ou não povo de Israel. É a partir da periferia que caminha para o centro. Tudo e em tudo, dentro e fora das religiões, só tem sentido se for para o bem de toda a humanidade.
O itinerário de Jesus, testemunhado pelas narrativas evangélicas, é o de alguém que está, continuamente, voltado para o Deus de todos. Em Jesus não há rivalidade entre a dedicação a Deus e a entrega à libertação humana. É um Deus humanado».
Ainda mais uma palavra de Frei Bento no mesmo texto sobre a Paixão e Morte de Jesus que vamos celebrar nesta semana:
«No século XX não foi possível superar, inteiramente, um cristianismo dolorista. A alternativa seria um cristianismo burguês ou hedonista. Perante judeus e gregos, S. Paulo não se cansou de repetir: Pois não quis saber outra coisa entre vós a não ser Jesus Cristo, e Jesus Cristo crucificado (1Cor 2, 2). Não haverá perguntas a fazer a esta declaração? Creio que sim. Jesus não morreu nem de acidente, nem de doença nem de velho. Foi condenado à pena capital, à morte na cruz, que não desejava. A celebração da Semana Santa, as narrativas da Paixão tentam explicar por que é que o crime aconteceu. Se Jesus não amava o sofrimento, se detestava a cruz, por que é que Ele não fugiu, não renegou? A sua fidelidade à emancipação humana era maior que a sua dor.
O mais importante está, todavia, no que aconteceu na própria cruz. No momento em que é excluído da vida, Ele oferece futuro aos que lhe dão a morte. Ele morre com o mundo vivo no seu coração. A aliança de Jesus é com todos os que são contra a morte».

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